UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE GABRIEL DE MACEDO DUARTE A LEGITIMIDADE DO FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL COMO LEADING CASE: uma alternativa aos clubes brasileiros em crise econômico-financeira São Paulo 2021 GABRIEL DE MACEDO DUARTE A LEGITIMIDADE DO FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL COMO LEADING CASE: uma alternativa aos clubes brasileiros em crise econômico-financeira Trabalho de Graduação Interdisciplinar apresentado como requisito para obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Orientador: Prof. Dr. Pedro Alves Lavacchini Ramunno São Paulo 2021 GABRIEL DE MACEDO DUARTE A LEGITIMIDADE DO FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL COMO LEADING CASE: uma alternativa aos clubes brasileiros em crise econômico-financeira Trabalho de Graduação Interdisciplinar apresentado como requisito para obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Aprovado em: ____ de ____________de _______. BANCA EXAMINADORA Examinador (a) Pedro Alves Lavacchini Ramunno Examinador (a) Armando Luiz Rovai Examinador (a) Fabiano Del Masso Dedico este trabalho à Lourdes, minha querida avó que tanto me ensinou. AGRADECIMENTOS Através deste trabalho concluo mais um ciclo da minha vida, agora, finalizando o curso de Direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Foram 05 anos de muitas conquistas, erros e acertos, aprendizados e descobertas, mas que, ao final, tudo fez sentido e valeu a pena. Inicialmente, gostaria de agradecer a todos os grandes amigos que o Mackenzie me deu ao longo desses anos, sem vocês o curso não seria o mesmo. Em especial ao pessoal da minha querida sala R, pela receptividade tão especial nesses últimos anos do curso. Obrigado, também, aos amigos que formei através da criação do Grupo de Estudos de Direito Desportivo Empresarial (GEDDE MACK), principalmente, aos meus companheiros de coordenação Bruno, Hussid, Johnny, Anna, Rui e Didico. Agradecimento especial para Beatriz Maganha, minha amiga de infância e colega de profissão, que foi muito importante ao longo de toda essa trajetória. Obrigado pelo apoio de sempre. Alguns agradecimentos para profissionais que foram essenciais à minha formação nesses últimos 05 anos também são necessários: Aos grandes amigos do Salusse Marangoni, por toda a confiança dada tão cedo, em especial, Alexandre Levinzon, Guilherme Guarinão e Victor de Sordi. Aos sócios do BVZ Advogados, Frederico Bastos, Daniel Zugman e Renato Vilela. A Roberta, Alexandre, Cris, Rodrigo e Nath, advogados do Bank of America, que tanto me ensinaram. A todos da Artesanal Investimentos pela oportunidade, em especial, Rafael e Taís, meus parceiros de jurídico. Agradeço aos amigos do esporte Eduardo Coutinho, Roberto Barracco e Thiago Nicácio, pela força de sempre, pelas portas abertas e pela confiança. Fica aqui meu agradecimento especial a todos os professores do curso, em especial ao meu grande parceiro, o qual eu tive o privilégio de ter como orientador desse TCC, o professor Pedro Ramunno, que também foi o grande responsável pelo incentivo e apoio na criação do nosso grupo de estudos GEDDE. Muito obrigado por todas as trocas e por toda a confiança depositada em mim. Sem mais delongas, agradeço o apoio imensurável dos meus queridos avós, Nelsão, Cidinha e Dedê e da família que ganhei ao longo dessa vida, Marcelo, Maria, Matheus e Isabela, os dois últimos que também são companheiros de profissão e tanto me ajudaram nesses últimos anos. Agradeço, também, ao meu tio Marcelo Duarte, jornalista esportivo e escritor que tanto me incentivou a escrever sobre o esporte. Por fim, agradeço imensamente e dedico esse trabalho aos meus pais, as maiores inspirações da minha vida. Minha mãe Fabiana, jornalista, meu grande exemplo de determinação, liderança, autossuficiência e empoderamento feminino. Meu pai Mauricio, veterinário, meu exemplo de persistência e inteligência. Mas o mais importante, agradeço a ambos por me ensinarem a importância do trabalho e sobre os valores da vida. Obrigado por acreditarem e investirem no meu potencial e batalharem diariamente para me proporcionar as melhores oportunidades. Amo vocês. “Start unknown, finish unforgettable.” Nike RESUMO A Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, é a responsável pela regulação do instituto da Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falências no ordenamento jurídico brasileiro. Destaca- se aqui a consagração do princípio da conservação da empresa, introduzida pelo diploma legal como um meio de oferecer soluções a crises que podem atingir os empresários. Tendo em vista a recente decisão em torno do pedido de antecipação dos efeitos do stay period pelo clube de futebol profissional Figueirense Futebol Clube, faz-se necessária a discussão e análise sobre a legitimidade de uma associação sem fins lucrativos que explora a prática de futebol profissional para figurar como requerente de um eventual pedido de recuperação judicial ou extrajudicial e trata-se de um marco dentro da história do futebol em nosso país. O futebol, no Brasil, ainda não é tratado da forma profissional que merece. Os clubes, instituições centenárias, são agentes econômicos muito importantes, que além da geração de atividade econômica, propiciam enormes ganhos sociais por meio do esporte e pela educação, por isso, o amadorismo deve ser deixado de lado em detrimento da gestão profissional. Somente assim, com mudanças radicais que podem ser alavancadas pela entrada em uma recuperação judicial ou extrajudicial, um ambiente propício para novos investimentos tem muito mais chances de ser formado, desenvolvendo o esporte futebol e indústria futebol em seu todo. Embora constituídos na forma de associações sem fins lucrativos, funcionam como se sociedades fossem, portanto, assim devem ser tratados. Ainda, são demonstrados exemplos de fora do país, mais precisamente da Espanha e Inglaterra, que só corroboram com a necessidade de existência dessa alternativa no Brasil. O objetivo do presente trabalho, portanto, é a demonstração da importância dessa decisão pioneira de reconhecimento de legitimidade do Figueirense Futebol Clube para figurar nos procedimentos da Lei nº 11.101, e, que, em caso de sucesso, o que isso pode representar para outros clubes em situações financeiras igualmente delicadas. Por fim, conclui-se que os clubes podem ser associações sem fins lucrativos, mas não são associações sem fins econômicos, portanto, devem ter todas as prerrogativas falimentares como se sociedades empresárias fossem. PALAVRAS-CHAVE: Captação de Recursos. Recuperação Judicial. Associações. Futebol Brasileiro. ABSTRACT The Brazilian Law No. 11,101 of February 9, 2005 is responsible for the regulation of the Judicial, Extrajudicial and Bankruptcy Reorganization institute in the Brazilian legal system. The consecration of the principle of conservation of the company, introduced by the legal diploma, stands out here as the purpose of offering solutions to crises that may affect entrepreneurs. Due to the recent decision on the request for anticipation of the effects of the stay period by the professional football club Figueirense Futebol Clube, it is necessary to discuss and analyze the legitimacy of a non-profit association that explores the practice of professional football to appear as the applicant for a possible request for judicial or extrajudicial recovery, it is a milestone within the history of football in our country. Football in Brazil is still not treated as professionally as it deserves. Clubs, centenary institutions, are very important economic agents, which, in addition to generating economic activity, provide enormous social gains through sport and education, therefore, amateurism must be set aside at the expense of professional management. Only then, with radical changes that can be leveraged by entering a judicial or extrajudicial recovery, an open environment to new investments is much more likely to be formed, developing the football as sport and football as industry. Although constituted in the form of non-profit Associations, they function as if they were enterprises, so they should be treated accordingly. Still, examples are shown from outside the country, more precisely from Spain and England, which only corroborate to the need for this alternative to exist in Brazil. The objective of the present work, therefore, is to demonstrate the importance of this pioneering decision to recognize the legitimacy of Figueirense Futebol Clube to figure in the procedures of Law No. 11.101, and that, in case of success, what this may represent for other clubs in equally delicate financial situations. Finally, it is concluded that clubs can be non-profit associations, but they are not non- economic associations, so they must have all bankruptcy prerogatives as if business companies were. KEYWORDS: Fundraising. Bankruptcy Law. Associations. Brazilian Football. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Detalhamento dos custos e despesas e comparativo com as receitas totais - 2019 29 Figura 2 - Composição de dívidas efetivas – Corinthians e Cruzeiro ..................................... 30 Figura 3 - Evolução e composição das receitas corrigidas – Corinthians e Cruzeiro ............. 30 Figura 4 - Receitas, Custos e Geração de Caixa – Corinthians e Cruzeiro ............................. 31 LISTA DE ABREVIATURAS Art. Artigo CC Código Civil CF Constituição Federal CPC Código de Processo Civil LRF Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falências LINDB Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro TJSC Tribunal de Justiça de Santa Catarina TJRJ Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro STF Supremo Tribunal de Justiça STJ Superior Tribunal de Justiça SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 12 2. METODOLOGIA ............................................................................................................... 19 3. ESTRUTURA DOS CLUBES DE FUTEBOL BRASILEIROS .................................... 20 3.1 ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS ..................................................................... 21 3.2 REALIDADE CONTÁBIL: CORINTHIANS E CRUZEIRO .......................................... 28 3.3 FINANCIAMENTO DOS CLUBES POR TERCEIROS .................................................. 32 4. CONTEXTO DO PEDIDO PRÉVIO DE RECUPERAÇÃO ........................................ 35 4.1 PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA .......................................................... 37 4.2 FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE E FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE LTDA. ..... 39 4.2.1 Contexto histórico até pedido ....................................................................................... 40 4.2.2 Estrutura do litisconsórcio: associação + sociedade limitada.................................... 42 4.3 DO CABIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DO STAY PERIOD ............... 44 4.4 LEI 11.101, DE 2005: REQUISITOS PARA PEDIDO ..................................................... 45 4.4.1 Legitimidade .................................................................................................................. 47 4.4.2 Precedentes importantes ............................................................................................... 51 4.5 IMPORTÂNCIA PARA O FUTURO DO FUTEBOL BRASILEIRO ............................. 54 5. CASES INTERNACIONAIS RECENTES – O RENASCIMENTO APÓS A RECUPERAÇÃO JUDICIAL ............................................................................................... 56 5.1 ESPANHA .......................................................................................................................... 56 5.2 WIGAN ATHLETIC: INGLATERRA .............................................................................. 57 6. CONCLUSÃO ..................................................................................................................... 59 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 60 12 1. INTRODUÇÃO O ano de 2020 foi responsável por grandes mudanças no mundo por conta da pandemia de Covid-19, que trouxe consequências políticas e econômicas que atingiram todos os setores, inclusive o futebol. Diante de tal cenário, com interrupção dos maiores campeonatos do mundo, a situação de diversos clubes, que já era precária, se tornou ainda pior, com atrasos de salários de seus atletas, atraso no pagamento de fornecedores, entre todos os outros problemas gerados pela falta de desempenho de atividade econômica e consequência falta de geração de receita. No Brasil, a crise causada pela paralisação das competições teve efeitos ainda piores, uma vez que a situação dos clubes brasileiros no geral é muito deficitária em função do histórico assistencialista do esporte que sempre foi uma das maiores financiadoras do futebol, seja por meio de aporte direto de capital ou pela verba de patrocínios, pelos estímulos tributários ou mesmo por uma legislação que, de certa forma, institucionalizava1 a prática esportiva. Em suma, esse processo de institucionalização do futebol começou no Estado Novo, com o Decreto nº 3.1992, de 14 de abril de 1941, em que se estabeleceu que o futebol fosse alvo de “rigorosa vigilância por parte do governo”. O que ocorreu foi uma centralização na administração, na estruturação e na fiscalização do futebol, com a iminente ideia de construção da identidade brasileira com o esporte. O futebol deveria representar a aproximação do Estado com a população, e assim foi feito. O que pode ser muito bem traduzido pelos dizeres de Nelson Rodrigues3, que o Brasil é considerado a “pátria de chuteiras”. Na década de 50, como forma de estreitar e ampliar o controle da sociedade por meio do futebol, inúmeros estádios que até hoje são utlizados por nossos clubes foram construídos pelos estados e municípios com cooperação da União. Tem-se como exemplo emblemático o Maracanã, que além do maior estádio do mundo, na época também foi responsável pelo recebimento da final de Copa do Mundo de 1950, entre Brasil e Uruguai. Coincidência? Nem um pouco. 1 CARVALHO, C. A., GONÇALVES, J. C. S., & ALCÂNTARA, B. C. S. (2005). Transformações no contexto do futebol brasileiro: O estado como agente de mudança. GESTÃO.Org - Revista Eletrônica de Gestão Organizacional, 3(1), 5-15. 2 BRASIL. Decreto nº 3.199, de 14 de abril de 1941. Estabelece as bases de organização dos desportos em todo o país. Rio de Janeiro, RJ, abril 1941. 3 Rodrigues, Nelson. A pátria de chuteiras. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013. 13 Na ditadura militar, usou a mesma estratégia: centralização de poder e desenvolvimento de políticas públicas para intensificar a intervenção do Estado na prática esportiva. Nesse período, entre as décadas de 60 e 80, os principais institutos legislativos editados pelo Governo Federal foram a Lei n° 6.251, de 19754, a Lei n° 6.354/19765 (Lei do Passe), e o Decreto-Lei n° 80.228/19776. O Decreto-Lei nº 80.228/77 posteriormente revogou a Lei n° 6.251/1975 e trouxe importantes mudanças no tratamento das Federações e Confederações, que foram fortalecidas com maiores competências e, consequentemente, maior centralização de poder sobre o futebol profissional nacional. Aqui é importante destacar a criação de alguns campeonatos nacionais, em especial a Taça Brasil, que posteriormente passou a se chamar Taça de Prata e depois Campeonato Brasileiro de Futebol. A Lei do Passe também foi importante marco para o futebol profissional, já que pela primeira vez as relações de trabalho entre o atleta profissional e o clube eram abordadas pelo ordenamento jurídico brasileiro. O atleta, a partir da assinatura do contrato com a entidade esportiva, estava totalmente vinculado a mesma e não podia livremente escolher pra onde iria, a menos que ocorresse o pagamento de seu passe. O que aconteceu aqui foi uma mudança na centralização do poder sobre o atleta, que agora pertencia totalmente ao clube empregador, ou seja, o passe do jogador não pertencia ao próprio jogador e sim ao clube. Em 1979, em linha com as mudanças estruturais trazidas pela Lei do Passe, o organismo central de controle, administração e fiscalização do futebol brasileiro passa da CBD7 para a recém-criada CBF, o que significou aumento de poder nas mãos de dirigentes dos entes que atuam fora das quatro linhas, ou seja, clubes, federações e confederações. A luta para libertação da ditadura militar e abertura democrática do Brasil nos anos 80 que resultou na Constituição Federal de 1988 trouxe inúmeras mudanças na estrutura do futebol, o que significou maior autonomia na gestão das entidades esportivas, em linha com o momento de reviravolta democrática que o país estava passando, principalmente, pelo artigo 217 da Constituição Federal de 19888, que foi responsável pelo começo da descentralização de poder nas mãos do Estado. Ainda não era o ideal, mas uma nova estruturação mais democrática e descentralizada era viável. 4BRASIL. Lei nº 6.251, de 8 de outubro de 1975. Institui normas gerais sobre desportos, e dá outras providências. Brasília, DF, outubro 1975. 5BRASIL. Lei nº 6.354, de 2 de setembro de 1976. Dispõe sobre as relações de trabalho do atleta profissional e dá outras providências. Brasília, DF, setembro 1976. 6BRASIL. Decreto nº 80.228, de 25 de agosto de 1977. Regulamenta a Lei nº 6.251, de 8 de outubro de 1975, que institui normas gerais sobre desportos e dá outras providências. Brasília, DF, setembro 1976. 7Confederação Brasileira de Desportos. 8BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 14 Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: I - a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento; II - a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento; III - o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não profissional; IV - a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional. § 1º O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei. § 2º A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final. § 3º O poder público incentivará o lazer, como forma de promoção social. Como precursor dessa mudança, foi fundado em 1987 o Clube dos Treze, formado pelos treze maiores clubes do país, independentes da CBF. A agremiação tinha como objetivo a mudança do entendimento do que era o futebol, do que ele representava e, acima de tudo, e a parte mais importante, o entendimento do futebol como atividade econômica e a consequente valorização o produto “futebol”, que já possuía um mercado extremamente rentável e pouco explorado9. Em suma, o Clube dos Treze foi uma iniciativa contra a centralização de poder da CBF, que, como única legítima para controle do futebol por conta da prerrogativa da FIFA, estava mais preocupada com o status que ocupava do que, necessariamente, com os campeonatos que controlava. Por incrível coincidência, a iniciativa da Super Liga Europeia, campeonato de futebol idealizado por 12 clubes europeus detidos como fundadores, lançado no final de abril de 2021, de certa forma tem semelhanças com o contexto do Clube dos Treze10. A união dos clubes, além da tentativa de ruptura com o sistema FIFA-CBF ou, no caso europeu, FIFA- UEFA, visa à defesa do interesse dos clubes, que tanto em 1987 e agora em 2021, não estavam de acordo com a estruturação de campeonatos, participação nas decisões esportivas e financeiras, além de descontentamento com a divisão de verbas. Como o Clube dos Treze persistiu ativo até 2011, é verdadeira essa constatação sobre a divisão de verbas. Assim como amplamente divulgado pela mídia sobre a Super Liga Europeia, com ameaças de desfiliação de clubes e jogadores de campeonatos sob a supervisão FIFA, no 9HELAL, Ronaldo. Passes e Impasses: Futebol e cultura de massa no Brasil. Petropólis: Vozes, 1997. p. 41. 10Já vi esse filme: Clube dos 13: a história da “Superliga brasileira” que mudou nosso futebol e foi implodida pela TV. Disponível em: . Acesso em: 27 abril. 2021. 15 rompimento de 1987 as ameaças eram idênticas, ainda segundo Ronaldo Helal11, faria com que todos os jogadores dos clubes ganhassem passe livre automaticamente. Diante desse cenário, com evidente crise financeira passada pela CBF naquele momento, o aval pelos clubes para a organização do torneio de forma autônoma foi conseguido. Ainda, devido a estratégias de marketing eficientes para levantamento de meios financeiros para custeio da competição, em 1987 foi organizada a chamada Copa União, competição que contou com média de público alta nos estádios, calendário fechado e jogos com alto nível técnico, o que nunca tinha ocorrido antes. Mesmo com tamanho sucesso, o campeonato não foi continuado nos anos seguintes, mesmo com o Clube dos Treze ativo. Esse fato pode ser entendido como herança do dilema brasileiro no futebol, já que predominava e ainda predomina uma linha tênue entre os sinais do moderno (profissional e impessoal) e do tradicional (amador e pessoal). Por esse motivo, o modelo criado em 1987 sucumbiu ao poder dos agentes controladores do esporte, que ainda se relacionavam por meio de favores, patrimonialismo e amadorismo, conforme Ronaldo Helal explica12. Em continuação à história normativa, outro marco legislativo que veio em linha com as mudanças profundas da virada democrática do final dos anos 80 foi a Lei Zico13, que como trazida por Alvaro Melo Filho, criou ambiente favorável para a iniciativa privada e concretizou a “desintoxicação autoritária” da lesgislação esportiva, assim como reduziu as interferências estatais no esporte, afastando práticas e burocracias que travavam o desenvolvimento do mercado futebolístico, criando um produto extremamente explorável. Para o nobre professor Álvaro Melo Filho, que foi o responsável pela redação do art. 217 da CF e pela Lei Zico ora citada, “removeu-se com a “Lei Zico” todo o entulho autoritário desportivo, munindo-se de instrumentos legais que visavam a facilitar a operacionalidade e funcionalidade do ordenamento jurídico-desportivo, onde a proibição cedeu lugar à indução” 14. Por isso, agora nessa nova fase do futebol, a relação com agentes econômicos passou a ser de suma importância. Pierre Bourdieu, sociólogo francês precursor da teoria dos campos15, 11HELAL, Ronaldo. Op. Cit. p. 88. 12HIRATA, Edson. El Club de los 13: una representación incompleta de lamodernización del fútbol brasileño (1980-2012). EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Ano 18 - Nº 181 - Junho de 2013. 13BRASIL. Lei nº 8.672, de 6 de julho de 1993. Institui normas gerais sobre desportes e dá outras providências. Brasília, DF. Julho 1993. 14FILHO, Alvaro Melo. Futebol brasileiro e seu arcabouço jurídico - Migalhas. Disponível em: . Acesso em: 28 abril. 2021. 15BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012, p. 9. 16 aborda ponto importante nesse sentido em seu discurso introdutório ao Congresso Internacional do HISPA, em março de 197816: Portanto, tudo permite supor que a probabilidade de praticar os diferentes esportes depende, em graus diversos para cada esporte, do capital econômico e, de forma secundária, do capital cultural e do tempo livre; isto por intermédio da afinidade que se estabelece entre as disposições éticas e estéticas associadas a uma posição determinada no espaço social e os lucros que em função destas disposições parecem prometidos para os diferentes esportes. Nesse ponto, cabe citar o estudo feito por Juliano Souza, Bárbara Almeida e Wanderley Marchi Júnior17 onde é exposto que o futebol, pela sua essência massiva e pelo nível de desenvolvimento que chegou frente a outros esportes, deve ser objeto de estudo autônomo, que da mesma forma, deve receber tratamento legislativo diferenciado: Não obstante esse uso referenciado e, por assim dizer, mais ortodoxo do esquema de Bourdieu voltado para o domínio de investigação do fenômeno esportivo, é possível também retomar o futebol como um campo relativamente autônomo com relação ao espaço social estruturado em torno dos esportes. É a esse segundo uso teórico, inclusive, que nos remetemos na continuidade do artigo por entender, em primeiro lugar, que o futebol na condição de um esporte de apelo massivo, distribuído entre as diferentes classes sociais e que ocupa um lugar de destaque na hierarquia de oferta e consumo dos bens esportivos e culturais na sociedade moderna, demanda de um tratamento teórico à parte e como campo relativamente à parte. Além disso, no mesmo trabalho, em linha com o exposto acima, por conta dessa condição única que foi atingida pelo futebol, seu processo de modernização também deve ser tratado diferente. Em qualquer local no mundo, diferente de todos os esportes, o futebol segue um padrão que permeia suas relações sociais, quase que como um idioma único falado por todos os habitantes do planeta. Portanto, essa condição constitui uma atuação de mercado diversificada e, de certa forma, idêntica, seja em qualquer cultura ou ordenamento jurídico, fato que não pode ser comparado com qualquer outro fenômeno econômico e social: Já no tocante à modernização do futebol, o modelo bourdieusiano ao demonstrar que a modernidade é marcada pelo surgimento de campos relativamente autônomos com leis de funcionamento invariantes e, portanto, que as ideias e práticas modernas estão vinculadas ao mercado, permite supor que, em essência, as relações sociais 16BOURDIEU, Pierre. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero. 1983. p 136-153. 17SOUZA, Juliano; ALMEIDA, Bárbara; MARCHI JÚNIOR, Wanderley. Por uma reconstrução teórica do futebol a partir do referencial sociológico de Pierre Bourdieu. Rev. Bras. Educ. Fís. Esporte, (São Paulo) 2014 Abr-Jun; 28(2):221-32 17 construídas no futebol brasileiro e sul-americano não são tão diferentes daquelas que permeiam o futebol europeu, africano ou asiático18. O esporte futebol passa a ser entendido como espetáculo de consumo, que será pautado e desenvolvido à medida que consegue gerar retorno a seus financiadores. O futebol passa a ser um produto de massa, que é pautado pela sua oferta e demanda, ou seja, obedecem às leis de mercado assim como qualquer atividade econômica. O esporte passa a compor uma atividade industrial que deve se estruturar da mesma forma, com eficiência, produtividade e mitigação de riscos. Para isso, estruturas modernas de gestão passaram a ser demandadas, o que com toda certeza é um problema para todo esse sistema até hoje, já que conforme será explicado mais adiante, o histórico do futebol e os resquícios de toda evolução desde meados de 1940 não trazem efeitos positivos à atividade, pelo contrário. Em 1998, com o Ministério Extraordinário dos Esportes sob o comando de Edson Arantes do Nascimento, Rei Pelé, a Lei nº 9.61519, de 24 de março de 1998, entrou em vigor com novas diretrizes e atualizações importantes para o desporto nacional, sobretudo para o futebol. Entre as mudanças mais significantes, foi revogada a Lei Zico, houve a definitiva profissionalização dos clubes de futebol, designação de competência de fiscalização do Ministério Público e para os atletas profissionais, o fim do Passe20. Nesse último o legislador foi obrigado a seguir as práticas legislativas esportivas modernas, como nesse caso, o Acórdão Bosman21, que trouxe mudanças radicais que moldaram o futebol moderno. Por fim, para encerrar a linha do tempo que simboliza a “diminuição” da ação estatal sobre o futebol, a Lei nº 10.67122, de 15 de maio de 2003, conhecido como Estatuto do 18SOUZA, Juliano; ALMEIDA, Bárbara; MARCHI JÚNIOR, Wanderley. Op. Cit. P. 229. 19BRASIL. Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998. Institui normas gerais sobre desportes e dá outras providências. Brasília, DF. Março 1998. 20 “A importância devida por um empregador a outro, pela cessão do atleta durante a vigência do contrato ou depois de seu término, observadas as normas desportivas pertinentes.”- O fim do passe - Universidade do Futebol. Disponível em: . Acesso em: 27 abril. 2021. 21A Lei Bosman foi fruto de uma ação movida pelo belga Jean-Marc Bosman contra o seu então clube, o RFC Liege. A decisão permitiu que jogadores deixassem seus times após o final de seus contratos para assinar com outras equipes, além de derrubar as restrições relacionadas ao número de atletas da União Europeia nas escalações. Lei Bosman: o que foi a decisão que mudou para sempre o futebol? Disponível em: . Acesso em: 5 maio. 2021. 22BRASIL. Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003. Dispõe sobre o Estatuto de Defesa do Torcedor e dá outras providências. Brasília, DF. Maio 2003. 18 Torcedor, trouxe mais disposições normativas consolidando a especularização do futebol, tornando o torcedor o consumidor ativo do produto futebol. Superada toda a explicação histórica sobre intervenção estatal no futebol brasileiro, é compreensível a condição de dependente do futebol brasileiro do Estado. A herança de controle estatal ainda está atrelada diretamente ao tratamento tributário e estrutura societária organizacional de quase a totalidade dos clubes brasileiros. Em regra, os clubes de futebol são Associações sem fins lucrativos, com exceção de poucas iniciativas23 modernas que conseguiram fazer a transição para Sociedades Anônimas ou Limitadas, passando a usufruir do arcabouço jurídico desses tipos de sociedade empresária. A realidade é que a transição para clube empresa é algo ainda distante para as agremiações que disputam os campeonatos nacionais e estaduais de futebol. Essa estrutura empresarial demanda gestão, governança e compliance profissionalizados, além de consolidação financeira, parte muito prejudicada pela pandemia de Covid-19. Por tudo isso, o tema “transição” tornou-se assunto delicado para muitos clubes centenários em nosso país. Estruturas desatualizadas significam atraso em relação a novas práticas de mercado, ou seja, situações que interferem diretamente nos níveis e potencial de alavancagem de recursos para financiamento de suas atividades. Isso ocorre no futebol já que a condição de Associação sem fins lucrativos não permite certas prerrogativas legais e financeiras, como acesso ao mercado de capitais em sua forma mais badalada, que é a bolsa de valores, entre outros exemplos. Além disso, com base em decisões recentes extremamente importantes para o mundo do futebol, será analisada a possibilidade do uso do arcabouço jurídico disponibilizado pela Lei n° 11.101, de 09 de fevereiro de 200524, a Lei de Falências, Recuperação Judicial e Extrajudicial para resolver ou auxiliar a retomada econômico-financeira dos clubes de futebol brasileiros por meio da Recuperação Judicial ou Extrajudicial. 23Nas quatro principais divisões do Brasil, apenas Cuiabá EC, Botafogo de Ribeirão Preto, Ferroviária e Red Bull Bragantino são considerados clubes empresas. 24BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Brasília, DF. Fevereiro 2005. 19 2. METODOLOGIA O método de pesquisa foi desenvolvido a partir de: 1. Pesquisa Bibliográfica de livros, artigos, matérias; 2. Pesquisa normativa de legislação seca e comentada; 3. Pesquisa em demonstrações financeiras e análise econômico-financeira; 4. Análise de decisões judiciais. 20 3. ESTRUTURA DOS CLUBES DE FUTEBOL BRASILEIROS Diante do histórico estadista de financiamento dos clubes de futebol do Brasil, há uma evidente dificuldade em cativar e seduzir investidores privados nesse mercado, uma vez que a imprevisibilidade é uma essência do esporte e da atividade esportiva, no entanto, a mitigação de riscos é, sim, possível. O grande problema é o ambiente de negócios no país, que apresenta ao investidor extrema insegurança jurídica, política e, principalmente, econômica. Além disso, as estruturas organizacionais dos clubes apenas cooperam com essa imprevisibilidade exacerbada que distancia o capital, já que as trocas de gestões constantes, falta de planejamento de longo prazo, saúde financeira e fiscal deficitária, falta de governança e compliance e antiprofissionalismo, infelizmente, assolam nossos clubes. Exemplos atuais são as gestões do Cruzeiro25 e Corinthians26, que por uma série de ações incompetentes estão afundados em dívidas. Essa condição faz com que o modelo associativo seja malvisto e incorra em muita desconfiança, o que é errado, já que independente do modelo, a eficácia e qualidade da gestão é o que realmente faz diferença. Barcelona e Real Madrid, maiores clubes do mundo, são Associações. No Brasil, há diversos exemplos de Associações bem geridas, que fazem com que resultados esportivos expressivos sejam possíveis. Isso só coopera com o entendimento que a melhoria da gestão é mais importante que o formato jurídico da entidade. Não obstante, já existem iniciativas legislativas em busca de novos modelos para transformação de clubes em Associações com fins lucrativos de direito, ou como popularmente conhecido, clube-empresas. Entre as iniciativas mais desenvolvidas, então os Projetos de Lei n° 5.516/201927 de relatoria do Presidente do Senado Federal Rodrigo Pacheco (DEM-MG), Projeto de Lei n° 5082/201628 do Deputado Pedro Paulo (DEM-RJ). Ocorre que, os projetos buscam soluções demasiada imediatistas para a crise financeira de 25Cruzeiro Esporte Clube 26Sport Club Corinthians Paulista 27BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei nº 5.516, de 2019. Cria o Sistema do Futebol Brasileiro, mediante tipificação da Sociedade Anônima do Futebol, estabelecimento de normas de governança, controle e transparência, instituição de meios de financiamento da atividade futebolística e previsão de um sistema tributário transitório. Brasília. 2019. Disponível em: . Acesso em: 05 maio. 2021. 28BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 5.082 de 2016. Cria a via societária, e estabelece procedimentos de governança e de natureza tributárias, para modernização do futebol, e dá outras providências. Brasília. 2016.Disponívelem: . Acesso em: 13 maio. 2021. 21 alguns clubes, com a promessa de fomentar as possiblidades de financiamento de suas atividades. O case do Figueirense mostra que mesmo com iniciativas modernas, quando mal geridas e aplicadas, resultam em situações ainda mais delicadas que a prévia. Não é à toa que conforme demonstrado mais adiante, o próprio Figueirense foi o primeiro clube de futebol no Brasil a entrar em juízo objetivando possibilidade de recuperação judicial. O verdadeiro problema é a gestão, e o clube-empresa não é uma solução, é um meio. Em projeto com a companhia Elephant29, o clube foi dividido em dois, com a Sociedade Limitada denominada Figueirense Ltda. responsável pela gestão do futebol e uma Associação sem fins lucrativos para as demais atividades do clube social. Além disso, a empresa Elephant ainda era detentora de 95% da Sociedade Limitada. Situações internas com dirigentes, assim como a falta de transparência e problemas com garantias fizeram com que o projeto não fosse adiante, deixando o clube em situação ainda pior que a anterior, como será demonstrado no presente trabalho. Iniciativas como essa demandam estudos mais detalhados e projetos bem desenvolvidos para a transição, e não projetos “tampões” como os que tramitam em nosso Legislativo. Não é suficiente somente um novo formato jurídico de organização, e, sim, uma mudança radical da estrutura e mentalidade do futebol brasileiro e dos seus players. O clube-empresa deve ser compreendido como uma nova possibilidade de alavancagem de capital, e não como uma salvação. No entanto, ainda sem alternativas efetivas para essa mudança radical, o modelo associativo estatutário é o adotado por nossas instituições centenárias e para fins da Lei nº 11.101, esse modelo deve ser adotado momentaneamente. 3.1 ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS Do ponto de vista doutrinário, a Associação sem fins lucrativos é simplesmente a união de pessoas com o fim comum de exercer atividades sem finalidade lucrativa, e em caso de lucro, o mesmo deve ser aplicado na própria associação, não havendo entre os associados direitos e obrigações recíprocos, conforme o artigo 53 do Código Civil de 200230. 29Elephant Participações Societárias S/A 30BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.Institui o Código Civil. Brasília, DF. Janeiro 2002. 22 Para Renato Berger e Syllas Tozzini31, a única dúvida conceitual do dispositivo é o significado do termo “fins não econômicos”: A única dúvida que se coloca, portanto, refere-se ao significado da expressão "fins econômicos", mais precisamente se ela se confunde com "fins lucrativos". A resposta parece ser sim. Na sistemática do novo Código Civil, associações seriam organizadas por pessoas interessadas em perseguir finalidades que não tivessem por objetivo a partilha futura de lucros. Além disso, ainda analisam a necessidade de distinção da atividade desempenhada pela associação da sua finalidade: A distinção entre atividade e finalidade é então fundamental. Em nenhum momento o novo Código Civil indica que a associação não pode ter "atividade" econômica. Menciona-se apenas "fins" econômicos. Por isso faz sentido o critério de que, mesmo havendo atividade econômica, a associação não perderá sua natureza se não tiver por objeto a partilha dos resultados. Superada a dúvida, é fato notório que, como já citado, poucos clubes no Brasil seguem um modelo efetivamente empresarial, como sociedade empresária de fato e de direito. Dos vinte clubes da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol de 2020, todos foram criados como Associações sem fins lucrativos, sendo organizados por seus estatutos sociais conforme disposições legais que virão a seguir. Conforme o Código Civil de 2002 consideram-se pessoas jurídicas de direito privado32, caracterizadas pela união de pessoas físicas que se organizam para fins não econômicos, de forma a ser consolidada por um Estatuto que deve conter obrigatoriamente todas as exigências do art. 54 do Código Civil, sendo para fins do presente estudo os mais importantes como a denominação, os fins e a sede da associação33, as fontes de recursos para sua manutenção34 e a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas35. As Associações são compostas pelos seus associados que podem ser divididos em subcategorias, tendo ou não direito a votos nas Assembleias da Associação, que, não necessariamente, exercem cargos de administração. Além disso, para fins de ordem organizacional, podem existir subcategorias que atuam nos poderes sociais, como a 31BERGER, Renato; TOZZINI, Syllas. A finalidade das associações no novo Código Civil. Disponível em: . Acesso em: 5 maio. 2021. 32 Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: I – as associações 33Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá: I - a denominação, os fins e a sede da associação; 34IV - as fontes de recursos para sua manutenção; 35VII – a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas. 23 Assembleia Geral, o Conselho Deliberativo, o Conselho de Orientação, o Conselho Fiscal e a Diretoria. O futebol, no modelo associativo, não é tratado de forma especial, já que faz parte das modalidades praticadas pelo clube social, o que significa que todos os associados do clube, com direito de voto, podem efetivamente atuar mesmo que indiretamente no futebol do clube. Para Antonio Carlos Kfouri Aidar, ex-membro da administração do São Paulo, em entrevista para a FGV36, além da necessidade de desvinculação do clube social do futebol, é necessário que se entenda que os principais gestores devem ser profissionais com remuneração, o que, inacreditavelmente, não ocorre. Ainda enfatiza que o movimento eleitoral que influencia diversas decisões é péssimo para o planejamento em longo prazo, já que privilegia decisões que serão usufruídas em futuro bem próximo. Por esse motivo, a troca de gestões periodicamente por questões de ordem política é prejudicial ao projeto de clube profissional, em conjunto com a escolha de gestores que não necessariamente possuem competência técnica para ocupar determinadas posições estratégicas. Nesse caso específico, a escolha democrática das posições não é positiva, pois só aumenta a insegurança e imprevisibilidade que a instituição apresenta ao investidor. Além disso, diferentemente do que ocorre na Inglaterra, por exemplo, os sócios diretores da Associação não respondem por dívidas da Associação, ou seja, os sócios não respondem solidariamente e ilimitadamente em suas pessoas físicas, o que só aumenta a possibilidade de inadimplência e irresponsabilidade na gestão. Como colocado, na Inglaterra, as Associações são denominadas “unincorporated associations” 37 e não tem a prerrogativa de constituição de personalidade jurídica distanciada de seus sócios ou diretores, o que faz com que a situação apresentada não ocorra. Por esse motivo, o modelo empresarial com limitação de responsabilidade é preferido38. Esse molde só foi mudado em 2011, em relação às entidades esportivas profissionais, na mudança da Lei Pelé pela Lei nº 12.39539. 36VALENTE, Rafael; SERAFIM, Mauricio C. Gestão Esportiva: Novos Rumos para o Futebol Brasileiro. RAE- Revista de Administração de Empresas, v. 46, n. 3, jul-set, p.131-136, 2006. Disponível em . Acesso em 05.maio. 2021. 37Associações sem fins lucrativos inglesa. Assim como no Brasil, é vedada a distribuição de lucros e dividendos para os associados. 38MOTTA, Luciano de Campo Prado. O mito do clube-empresa. Belo Horizonte: Sportto. 2020. P. 106. 39BRASIL. Lei nº 12.395 de 16 de março de 2011. Altera as Leis nº s 9.615, de 24 de março de 1998, que institui normas gerais sobre desporto, e 10.891, de 9 de julho de 2004, que institui a Bolsa-Atleta; cria os Programas Atleta Pódio e Cidade Esportiva; revoga a Lei nº 6.354, de 2 de setembro de 1976; e dá outras providências. Brasília. Março 2011. 24 No Brasil, ainda há decisão em tribunais superiores, no caso, no Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 1.398.438/SC, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, em 2013, que afasta a possibilidade de desconsideração da personalidade de associações civis para atingir o patrimônio dos associados ou administradores, com o principal argumento da falta de vínculo jurídico entre os associados, por força do artigo 53 do Código Civil. Mesmo com a decisão de 2013, ainda não há grande discussão em doutrina e jurisprudência sobre o tema e, como exposto na decisão pela própria ministra, isso se deve, principalmente, às características muito peculiares da Associação em relação à sociedade empresária. Dentro dessas peculiaridades trazidas pela douta ministra, há toda a estrutura tributária que permeia as relações do Estado com a Associação sem fins lucrativos, em destaque a esportiva, que é o caso de nossos clubes. Conforme prerrogativa constitucional e acentuada por normativa infraconstitucional, a Associação sem fins lucrativos é imune à instituição de impostos pelos entes da federação, como exposto no art. 150, inciso VI, alínea “c” da Constituição Federal, de 1988: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: VI – instituir impostos sobre: c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei. No entanto, pelo caráter centenário dessas instituições, o tratamento tributário diferenciado começou muito antes, somente consolidado pela regra constitucional citada. A história começou com o Decreto-Lei nº 5.844 de 194340, em seu artigo 2841 que as sociedades e fundações de caráter esportivo estariam isentas de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ, o que, portanto, afastaria qualquer incidência desse tributo sobre associações. Importante ressaltar novamente que o termo sociedade para fins desse estudo, somente no Código Civil de 2002 foi endurecido o entendimento do significado do termo, para que não se confunda com o formato legal empresário sociedade. Assim, prevalece o entendimento de Washington de Barros Monteiro42: “nas primeiras [sociedades civis], há o fito de lucro, enquanto, nas segundas [associações], inexiste finalidade lucrativa. O objetivo das 40BRASIL. Decreto-Lei nº 5.844 de 23 de setembro de 1943. Dispõe sobre a cobrança e fiscalização do imposto de renda. Rio de Janeiro. Setembro. 1943. 41Art. 28 Estão isentas do imposto de renda: a) as sociedades e fundações de caráter beneficente, filantrópico, caritativo, religioso, educativo, cultural, instrutivo, científico, artístico, literário, recreativo e esportivo. 42 Monteiro, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1991, 30ª ed., v. I, p. 111 25 associações é puramente cultural, beneficente, altruísta, religioso, esportivo ou moral”. Por isso, mesmo que constar o termo nos diplomas legais antes de 2002, deve ser entendido como associação sem fins lucrativos, e não sociedade. Em 1964, por meio da Lei nº 4.50643, o artigo 30 estabeleceu algumas condições para o gozo da isenção de IRPJ pelas associações, sejam elas profissionais, amadoras, o que modificado posteriormente pela Lei nº 9.532 de 1997. As condições trazidas pela Lei de 1964 exigiam que: não se remunerassem dirigentes nem distribuíssem lucros, a qualquer título; se aplicassem todos os recursos em seus objetivos sociais; mantivesse escrituração regular de suas receitas e despesas; e que prestassem ao Fisco todas as informações determinadas por lei e recolham todos os tributos sobre os rendimentos pagos por elas44. A disposição gera efeitos até hoje, já que a prática de não remuneração dos dirigentes está presente nos estatutos sociais dos clubes, o que só coopera com a perpetuação da gestão não profissional dos clubes. Se não há remuneração, não é possível a contratação de referências técnicas no mercado para comandar os clubes, portanto, esse cenário torna-se irreal. As associações esportivas profissionais passaram a gozar de tais benefícios até 1997, quando a Lei nº 9.53245 revogou expressamente os artigos 28 do Decreto-Lei nº 5.844 de 1943 e o artigo 30 da Lei nº 4.506, além do disposto no artigo 18 da nova Lei, que revogada as disposições contra as associações de caráter profissional, com ressalvas às que cumprissem com os dispostos nos artigos 12 e 15 da mesma Lei. O artigo 12 trouxe a adequação da isenção às entidades de educação e assistência social que estavam no rol do artigo 150, IV, alínea “c” da CF de 1988, já o artigo 15 dispôs sobre a isenção de IRPJ46 e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL para associações que atendessem os dispostos no artigo 12, parágrafo 2°, alíneas “a” até “e” e parágrafo 3°, que traziam disposições sobre requisitos da mesma forma da Lei de 1964. Como de notório saber da comunidade jusdesportiva, no ano de 1998 foi promulgada a Lei nº 9.61547 (Lei Pelé), que além de revogar a Lei nº 8.76248 de 1993 (Lei Zico), ainda 43BRASIL. Lei nº 4.506 de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o imposto que recai sobre rendas e proventos de qualquer natureza. Brasília. Novembro. 1964. 44AUGUSTO, Carlos. Carf reconhece isenção tributária de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins para clubes de futebol. Disponível em: . Acesso em: 05 maio. 2021. 45BRASIL. Lei nº 9.532 de 10 de dezembro de 1997. Altera a legislação tributária federal e dá outras previdências. Brasília. Dezembro. 1997. 46Imposto de Renda para Pessoa Jurídica. 47BRASIL. Lei nº 9.615 de 24 de março de 1998. Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências. Brasília. 1998. 48Brasil. Lei nº 8.762 de6 de julho de 1993. Institui regras gerais sobre desportes e dá outras previdências. 26 previa que a exploração e gestão do esporte profissional passaram a ser consideradas exploração de atividade econômica, e que seu tratamento deveria ser diferenciado do esporte amador. O art. 27 da Lei Pelé é importantíssimo para esse trabalho, já que pode ser considerado como principal marco jurídico de tentativa de mudança do formato jurídico dos clubes. O caput trouxe disposição de que as práticas relacionadas a competições de atletas profissionais eram privativas de Ipsisliteris: (a) sociedades civis de fins econômicos, (b) sociedades comerciais admitidas na legislação em vigor, ou (c) entidades de prática desportiva que constituírem sociedade comercial para administração das atividades. Em 200049, esse mesmo artigo 27 foi alvo de mudança com introdução da faculdade50 às associações na sua estruturação como entidade com fins lucrativos, sem a obrigação expressa dessa formatação. Já a Lei nº 10.67251 de 2003 foi responsável pela adição do parágrafo 1352 ao artigo 27 da Lei Pelé, onde foi introduzido o dispositivo que equiparava às associações esportivas profissionais a uma sociedade empresária para fins administrativos, tributários, contábeis, financeiros, previdenciários não importando a sua forma de constituição. Por pressão da comunidade jurídica, após diversas autuações e ações no judiciário, em 2006 foi promulgada a Lei nº 11.34553, que trouxe novamente a figura da isenção de IRPJ e CSLL além da COFINS54, e consolidou regime especial para cobrança do PIS55. O problema foi que essa lei foi aprovada com vigência de apenas seis anos, ou seja, até o fim de 2011. No entanto, antes disso, a Medida Provisória foi convertida em Lei, com ressalvas da redação original, dando origem à Lei nº 12.395 de 2011, cuja alteração mais significante para esse estudo foi uma mudança no parágrafo 13 do artigo 27 da Lei Pelé, com a supressão da Brasília. 1993. 49BRASIL. Decreto nº 14 de novembro de 2000. Regulamenta a autorização e a fiscalização de jogos de bingo e dá outras providências. Brasília. Novembro. 2000. 50§ 9o É facultado às entidades desportivas profissionais constituírem-se regularmente em sociedade empresária, segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. 51BRASIL. Lei nº 10.672 de 15 de maio de 2003. Altera dispositivos da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, e dá providência 52§ 13. Para os fins de fiscalização e controle do disposto nesta Lei, as atividades profissionais das entidades de que trata o caput deste artigo, independentemente da forma jurídica sob a qual estejam constituídas, equiparam- se às das sociedades empresárias. 53BRASIL. Lei nº 11.345 de 14 de setembro de 2006. Dispõe sobre a instituição de concurso de prognóstico destinado ao desenvolvimento da prática desportiva, a participação de entidades desportivas da modalidade futebol nesse concurso e o parcelamento de débitos tributários e para com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS; altera as Leis nº s 8.212, de 24 de julho de 1991, e 10.522, de 19 de julho de 2002; e dá outras providências. Brasília. Setembro 2006. 54Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social. 55Programa de Integração Social. 27 parte “notadamente para efeitos tributários, fiscais, previdenciários, financeiros, contábeis e administrativos” sobre o tratamento das associações como sociedades empresárias. Após essa mudança, até 2021, não houve mais mudanças legislativas nesse sentido, sendo que o protagonismo passou do congresso nacional para os tribunais, administrativos com decisões disruptivas do CARF56 e da justiça comum. Após diversas tentativas do fisco federal em descaracterizar a disponibilidade dos clubes do não pagamento aos tributos supracitados, com decisões sempre favoráveis às instituições, foi em decisão na instância máxima administrativa tributária, na CSRF57, em 2018 envolvendo o Athletico Paranaense, que finalmente foi consolidado o entendimento que os benefícios fiscais são legítimos, com reafirmação das decisões a quo anteriores. Ainda, há decisões judiciais importantes nesse sentido, sendo uma das principais a decisão do TRF3 em favor do Santos Futebol Clube sobre a isenção de COFINS, em decisão de 200658. Importante só mencionar o parecer da PGFN Parecer PGFN/CAT 587/2013 e Solução de Consulta COSIT 231/2018 da Receita Federal que consolidam as discussões desse tema, aparentando o esgotamento das tentativas do fisco ao redor do problema. Ponto principal para a continuidade do trabalho é o argumento utilizado pelas autoridades fiscais sobre o desenvolvimento de atividade econômica pelos clubes. Tal argumento foi uma tentativa de levar o julgador a considerar a exploração de atividade econômica como uma forma de caracterizar o fim lucrativo da instituição. A letra da lei é clara, esse benefício fiscal somente pode ser usufruído por entidades que não distribuem lucro, mas em nenhum momento há a proibição de auferir lucro. Nas palavras de Rafael Marchetti Marcondes, encerra-se essa discussão: O fato de uma entidade ter finalidades não lucrativas não significa que ela não possa gerar superávit (resultado positivo das entidades sem fins lucrativos, comparável ao lucro de sociedades empresárias). Não ter fins lucrativos significa, tão só, que eventuais superávits devem ser integralmente revertidos ao patrimônio social, e não distribuídos aos associados, administradores ou afins, conforme previsto na Lei 9.532;1997, em seu artigo 13, ss 3o59. O que ocorre hoje é que as associações sem fins lucrativos que atuam no futebol profissional não são obrigadas ao recolhimento de IRPJ, CSLL e COFINS, ou seja, alíquota 0; possuem regime especial de recolhimento de PIS, com alíquota de 1% sobre a folha de 56Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. 57Câmara Superior de Recursos Fiscais 58TRF3, 3a turma, ApCiv 0206336-43.1997.4.03.6104, Santos Futebol Clube, Juíza Convocada Eliana Marcelo, j. 25.10.2006. 59MARCONDES, Rafael Marchetti. Manual de tributação do esporte. São Paulo: QuartierLatin, 2020. P. 109. 28 salários, e INSS, com recolhimento de 5% na receita bruta de eventos esportivos60, além das obrigações sem regime especial como o recolhimento para o FGTS, de 8% da folha de salário e 4,5% da folha de salários para entidades terceiras (2,5% para salário-educação61, 0,2% ao INCRA62, 1,5% ao SESC63 e 0,3% ao SEBRAE64). Em 2015, foi criado por meio da Lei nº 13.15565 o PROFUT, Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro, que foi responsável por criar regras específicas para o fair play financeiro dos clubes contra gestões temerárias. Em caso em falta de cumprimento do regime, esses clubes podem até sofrer penalidades esportivas como exclusão de campeonatos. Além disso, foram criadas regras para um novo programa de parcelamento do passivo tributário e previdenciário, com possibilidade de parcelamento em até 240 meses no quesito tributário e 180 meses no previdenciário, com redução de 70% de multas, 40% de juros e 100% em encargos legais. Por fim, por conta da pandemia de Covid-19, algumas alterações normativas visaram os clubes, com a clara tentativa de auxiliá-los no período. Mudanças como essa trazida pela Lei nº 14.11766 de 08 de janeiro de 2021, que permitem contratos profissionais de, no mínimo, 30 dias de duração sofreram modificação no dia 29 de abril de 2021, com a inclusão da suspensão do pagamento das parcelas do Profut pelos clubes até o final do estado de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional. 3.2 REALIDADE CONTÁBIL: CORINTHIANS E CRUZEIRO 60Receita de bilheteria, patrocínio, uso de marcas, propagandas e transmissão. 61Salário educação 62INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. 63SESC – Serviço Social do Comércio. 64SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas. 65Brasil. Lei nº 13.155 de 4 de agosto de 2015. Estabelece princípios e práticas de responsabilidade fiscal e financeira e de gestão transparente e democrática para entidades desportivas profissionais de futebol; institui parcelamentos especiais para recuperação de dívidas pela União, cria a Autoridade Pública de Governança do Futebol - APFUT; dispõe sobre a gestão temerária no âmbito das entidades desportivas profissionais; cria a Loteria Exclusiva - LOTEX; altera as Leis n º 9.615, de 24 de março de 1998, 8.212, de 24 de julho de 1991, 10.671, de 15 de maio de 2003, 10.891, de 9 de julho de 2004, 11.345, de 14 de setembro de 2006, e 11.438, de 29 de dezembro de 2006, e os Decretos-Leis n º 3.688, de 3 de outubro de 1941, e 204, de 27 de fevereiro de 1967; revoga a Medida Provisória nº 669, de 26 de fevereiro de 2015; cria programa de iniciação esportiva escolar; e dá outras providências. Brasília. Agosto. 2015. 66Brasil. Lei nº 14.117 de 8 de janeiro de 2021. Suspende o pagamento do parcelamento de dívidas no âmbito do Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), criado pela Lei nº 13.155, de 4 de agosto de 2015, durante a vigência de calamidade pública nacional reconhecida pelo Congresso Nacional; e altera as Leis nos 9.615, de 24 de março de 1998, e 10.671, de 15 de maio de 2003. Brasília. Janeiro. 2021. 29 Mesmo contando com toda situação benéfica detalhada no tópico anterior, os clubes brasileiros, ainda dotados de gestões políticas e com pouco repertório técnico, contam com dívidas com valores cada vez mais relevantes, que resultam em performance pífia dentro de campo, visto que a dificuldade de investimentos em atletas de alto nível se torna cada vez mais complicada. Para fins do presente estudo, serão analisadas duas situações de clubes com histórias grandiosas, com títulos importantíssimos que se encontram em situação de desespero financeiro, são eles Cruzeiro Esporte Clube e Sport Club Corinthians Paulista. Figura 1 - Detalhamento dos custos e despesas e comparativo com as receitas totais - 2019 Fonte: Itaú BBA (2020). A Figura 1, retirada do estudo denominado Análise Econômico-Financeirados Clubes Brasileiros de Futebol de 2020, feita pelo Itaú BBA, braço de Investimentos do Banco Itaú, antes mesmo da pandemia de Covid-19, com interrupção de competições e volta sem público nos estádios apresenta o detalhamento dos custos e despesas e o comparativo com as receitas totais em 2019. A situação dos clubes Cruzeiro e Corinthians já se apresentavam bem delicadas, com os custos e despesas com valor acima das próprias receitas. Não há necessidade de grande argumentação para entender que essas instituições estão em crise, sem possibilidade de fechar as contas no final de cada exercício. Nessa situação, assim como feito pelo Figueirense, o instituto da recuperação judicial ou extrajudicial pode ser uma medida efetiva na recuperação econômica dessas instituições centenárias. Por conta da situação anormal da pandemia, a maior parte da análise será retiradada do ano de 2019 e algumas considerações serão retiradas das recentes demonstrações financeiras disponibilizadas por Cruzeiro e Corinthians. De fato, a situação que já era péssima em 2019 e só piorou em 2020, o que corrobora com a tese em discussão e sua viabilidade. Figura 2 - Composição de dívidas efetivas – Corinthians e Cruzeiro 30 Fonte: Itaú BBA (2020). Na análise da Figura 2, é disposto o crescimento exponencial das dívidas de Corinthians e Cruzeiro, que antes constantes tem seus picos na transição de 2018 para 2019. Em ambos, as dívidas operacionais foram as que mais subiram de valor, por conta de investimentos no plantel de jogadores, consequentemente, nos salários, além do nível de alavancagem que, por conta de contratações caras, foi necessária. A alavancagem de capital sem planejamento faz com que a evolução de dívidas em curto prazo sufoque os clubes, já que a esse tipo de prática significa modificação de receitas futuras ou mesmo criação de novas dívidas, cada dia piorando a situação. O problema aqui disposto não é apenas a evolução da receita conforme a Figura 2, mas, sim, a evolução da dívida sem lastro, sem evolução igual ou maior das receitas. Infelizmente, gestões catastróficas resultam nesse tipo de condição, com crescimentos absurdos e nem um pouco sustentáveis. Figura 3 - Evolução e composição das receitas corrigidas – Corinthians e Cruzeiro Fonte: Itaú BBA (2020). Ao contrário dos custos e despesas que aumentaram e geraram mais dívidas, a receita de ambos diminuiu em 2019. Coincidentemente, os dois clubes protagonizaram a final da Copa do Brasil de 2018, com vitória do clube celeste. Em ambos os casos as agremiações por conta de resultados expressivos em campo tiveram aporte de verbas de premiação, o que não ocorreu em 2019. Além disso, o Cruzeiro, por conta de problemas seríssimos de gestão e 31 corrupção, foi rebaixado para a disputa do Campeonato Brasileiro Série B, fato que provocou queda brusca na arrecadação, principalmente, quanto à venda de seus direitos de transmissão. Outro fato que chama atenção é a arrecadação com venda de atletas, enquanto o Corinthians viu essa parte da receita despencar em 2019, o Cruzeiro por conta do rebaixamento foi obrigado a reformular o elenco, vendendo jogadores para montar um elenco mais enxuto e com salários mais baixos, além de adequado para a disputa da Série B. Figura 4 - Receitas, Custos e Geração de Caixa – Corinthians e Cruzeiro Fonte: Itaú BBA (2020). Na Figura 4, após análise das dívidas e das receitas, e por meio do cálculo do EDITDA67ou LAJIDA, que simbolizam a geração de caixa de uma instituição, é possível ver uma perda de poder de geração muito grande no Cruzeiro, com o ápice em 2019 com o EBITDA corrigido e recorrente corrigido negativo, o que também ocorreu com o Corinthians de uma forma mais sutil. O que também chama atenção é a condição decorrente da diferença das receitas com as despesas, cuja linha de representação pela primeira vez resultou em déficit. O que foi intensificado pela pandemia de Covid-19 no ano de 2020. Nas palavras de José Laudelino Azzolin68: “o Ebitda representa a geração operacional de caixa da companhia, ou seja, o quanto a empresa gera de recursos apenas em suas atividades operacionais, sem levar em consideração os efeitos financeiros e de impostos”. Conforme exposto, as demonstrações financeiras do ano de 2020 demonstraram uma piora no cenário para todos os clubes brasileiros, e para Corinthians e Cruzeiro não foi diferente. Nos seus balanços disponibilizados em 2021, Corinthians e Cruzeiro apresentaram resultados que elevaram suas dívidas que estão perto da casa de 1 bilhão de reais. Tratando-se 67Earnings before interest, taxes, depreciation and amortization ou LAJIDA (Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) 68AZZOLIN, José Laudelino. ANÁLISE DAS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS. 1º Ed. Curitiba: Editora Iesde Brasil, 2012. P. 184 32 de clubes que geram entre 300 e 400 milhões de receitas, a dívida estar em 2,5 vezes o valor da receita é preocupante69. Em 2021 com base 2020, o Corinthians apresenta EBITDA corrigido positivo de 86 milhões de reais, e mesmo assim, diante do tamanho da dívida, em cerca de 925 milhões de reais, essa geração de caixa positiva só representaria 9% do valor da dívida. Além disso, por conta do Profut, utilizando atualização pela atual taxa DI, de 2,75%, sobraria cerca de 30 milhões de reais para pagamento da dívida, o que demoraria 30 anos para ser paga se mais nada fosse adicionado70. Cenário utópico. Para Cesar Grafietti, mesmo que o EBITDA seja positivo, é fato que o pagamento de dívidas pela geração de caixa própria, ainda que positiva, é improvável. Por isso, é impossível o cenário onde os próprios clubes, em especial Corinthians e Cruzeiro, paguem suas dívidas sem meios jurídicos e econômicos que servem como ajudas externas, o que só coopera com a necessidade da discussão sobre a extensão do uso da Lei nº 11.101, de 2005, como alternativa para um novo começo aos clubes deficitários, além de outras formas de alavancagem de capital que naturalmente surgirão com a modernização das estruturas organizacionais das instituições. O Cruzeiro segue o mesmo modus operandi do Corinthians, com dívida beirando o primeiro bilhão de reais, sem qualquer meio de resolução em vista. Conforme Cesar Grafietti, “logo, o segredo para não entrar no Clube do Bilhão errado é cuidar dos custos antes de tudo. Respeitar o trabalho de quem diz “não” ao invés de glorificar os que repetem os erros de sempre, contratando, prometendo, gastando, mas deixando a conta para outros pagarem. Especialmente o torcedor”. 3.3 FINANCIAMENTO DOS CLUBES POR TERCEIROS Conforme narrado, por conta da condição de associações civis sem fins lucrativos, os clubes brasileiros não têm acesso a todos os meios de financiamento disponíveis e viáveis para sociedades empresárias no geral, tendo que buscar meios tradicionais e, consequentemente, mais caros e menos efetivos. 69Corinthians pior do que Botafogo, Atlético-MG supera Cruzeiro: o ranking das dívidas de mais de R$ 10 bilhões dos clubes brasileiros. Disponível em: . Acesso em: 3 maio. 2021. 70GRAFIETTI, Cesar. Clube do Bilhão: o que fazer para evitar que seu clube faça parte. InfoMoney. Disponível em: . Acesso em: 3 maio. 2021. 33 Com receitas mais baixas por conta da pandemia, e diante desse cenário de limitação de alternativas financeiras e de profissionais qualificados para estruturação de operações dentro das instituições, os empréstimos bancários surgem como meio mais utilizado para capitalização das instituições. Ocorre que, empréstimos são feitos para pagamento de dívidas antigas e para novos projetos, que não necessariamente são certos, o que só faz com que as dívidas aumentem em longo prazo. Na leitura de algumas notícias veiculadas na grande imprensa nos últimos anos, é perceptível que certas práticas utilizadas por Corinthians e Cruzeiro cooperaram e muito com a atual situação dessas instituições tão vitoriosas. E o endividamento bancário é uma delas. Além dos juros altíssimos praticados pelas instituições bancárias brasileiras regularmente, a condição de associação faz com que o preço do crédito para essas instituições seja muito mais caro que o comum. Em suma, a precificação do crédito para um clube de futebol será diferenciada, já que por conta de sua estrutura organizacional nada profissional, a execução de garantias em caso de default se torna um processo mais difícil para o credor da operação. Por esse motivo cada vez serão pedidas mais garantias aos clubes, que são parte direta de seu patrimônio. Quanto maior a probabilidade de inadimplência da instituição, ou melhor, quanto menor seu score de crédito perante o mercado, maior será a taxa cobrada pela instituição tomadora de risco original e, consequentemente, mais garantias serão pedidas. Essa prática, repetidamente, só aumenta o nível de endividamento das instituições em longo prazo, além de esgotar ainda mais a liquidez de determinadas garantias que não podem ser compartilhadas e diminuir o apetite de risco das instituições que emprestam. Em caso de inadimplência, o credor executará essas garantias que fazem parte da estrutura operacional da instituição, como, por exemplo, sua sede social ou até o próprio estádio. Tem-se como exemplo concreto o Guarani, que por conta de endividamento trabalhista teve seu estádio penhorado e vendido em hasta pública em 201571. A disponibilidade de crédito é muito positiva e essencial para o desenvolvimento de atividade econômica no geral, no entanto, o endividamento excessivo não é nada positivo, já que a partir do momento que é tomado crédito, esse deve ser pago depois. Por esse motivo, novos meios de financiamento devem ser utilizados pelas instituições que compõem nosso futebol, como no mercado de capitais. 71Estádio do Guarani é arrematado por R$ 105 milhões em leilão. Disponível em: . Acesso em: 05 maio. 2021. 34 Um dos pilares de meios de financiamento é o acesso ao mercado de capitais. Como já exposto, a conversão dos clubes em sociedades anônimas ainda é tema que necessita de muita discussão na academia e no legislativo, no entanto, o mercado de capitais não se resume apenas em mercado de bolsa ou mercado de balcão, mais especificamente o mercado de equities ou ECM72. Há o mercado de dívida (DCM73), que além de muito mais simples de ser acessado, é extremamente importante para a movimentação da economia e é muito mais barato que o endividamento bancário. Portanto, na eventual reorganização das dívidas, e nas mudanças necessárias das instituições esportivas, será possível explorar novos meios de financiamento, como os disponibilizados pelo mercado de equities e dívida. 72Equity Capital Markets. 73Debt Capital Markets. 35 4. CONTEXTO DO PEDIDO PRÉVIO DE RECUPERAÇÃO Diante do cenário caótico intensificado pela pandemia, o instituto falimentar e recuperacional trazido pela Lei n° 11.101, de 2005, com alterações posteriores se apresenta como alternativa plausível para a reorganização das finanças de empresas em situações delicadas. Aqui, o princípio da conservação da empresa em consonância com a função social da mesma reflete todo o arcabouço jurídico que foi elaborado para esse tipo de situação. Em matéria recente veiculada pelo portal Consultor Jurídico74, por conta do momento de crise causado pela paralisação da economia pelo Covid-19, o mercado foi obrigado a dispor de opções para prorrogação de prazos e renegociação de dívidas, além da interferência estatal por meio do auxílio emergencial, controle do juro e flexibilização das regras trabalhistas, medidas que, de certa forma, amenizaram em parte a busca pelo instituto falimentar em 15% em relação a 2019. Acontece que, diante do cenário que ainda se perpetua por 2021, com menos opções e ações governamentais de incentivo à economia, uma demanda ao instituto foi represada e em algumas situações, a única saída foi o pedido de recuperação judicial. Como já exposto na introdução, o mercado do futebol foi igualmente atingido pela crise gerada pelo Covid-19. Os clubes deficitários, que mesmo antes de 2020 já emitiam sinais de alerta foram ainda mais atingidos, por falta de receita provenientes de público nos estádios, perda de sócios torcedores e interrupção de campeonatos. A atividade geradora de receita foi interrompida, entretanto, os custos continuaram pesados e de certo modo, crescendo cada vez mais pela falta de planejamento e gestão ineficiente. Diante desse cenário, em atenção ao conteúdo do presente trabalho, e por conta de decisões recentes que foram inovadoras no sentido de viabilizar o instituto falimentar da Lei n° 11.101 para associações sem fins lucrativos que atuam com futebol profissional, necessário estudo aprofundado principalmente quanto a legitimidade dessas instituições em um futuro de pedido de Recuperação Judicial ou Extrajudicial. No direito brasileiro, a Lei n° 11.101 é o ponto de partida quando o assunto é Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência, sendo fruto da mudança trazida pela Constituição Federal, de 1988, com a atuação neoliberal, inaugurando um sistema pautado na Ordem Social e Econômica, na tentativa de conciliação entre ambas. Por isso, visando 74HIGÍDIO, José. Pedidos de recuperação judicial não param de crescer. Disponível em: . Acesso em: 05 maio. 2021 36 principalmente à conservação das empresas que são constituídas e efetivam suas funções sociais no dia a dia, são necessárias algumas medidas protetivas, onde o Estado disponibiliza um meio para a continuidade da atividade empresarial ali explorada, quando aquela se encontra passando por crise, seja ela financeira ou econômica. Em caso de crise econômica, ou seja, no modelo de negócio, há o instituto da falência como alternativa. No Brasil, diferentemente de outros ordenamentos como, por exemplo, nos Estados Unidos75, a falência é vista como uma péssima alternativa, já que significa fim das atividades da empresa que a utiliza. Esse fato é contraditório, já que em uma visão neoliberal, aquela que supostamente era o desejo do constituinte de 1988, aqueles que desempenham atividades eficientes e que não geram lucro não devem ter a nova oportunidade de desempenhar tal atividade, uma vez que não obteve sucesso na primeira oportunidade. A intervenção estatal como a trazida pela Lei n° 11.101 gera muitos questionamentos sobre até que ponto o Estado brasileiro interfere na economia, e se esse dispositivo legislativo é benéfico ou não para o sistema no geral. Essa questão merece ser desenvolvida, entretanto, para fins do presente trabalho, ela existe e deve ser aplicada. Em linhas gerais, a Recuperação Judicial brasileira se comporta como demasiada estadista e protecionista, já que com a bandeira da preservação de empregos e da própria empresa, é resguardado o direito ao “perdão” em caso de gestão ineficaz e consequente endividamento das instituições, que podem legalmente por meio da Lei n° 11.101 renegociarem suas dívidas com credores e assim continuar em pleno funcionamento, ainda que continue sendo ineficaz e sem conseguir seu propósito por essência, que é o lucro. Esse modo pouco preventivo e muito protetivo só escancara o sistema econômico brasileiro que é uma manifestação da cultura brasileira, pouco preventiva e muito protetiva e combativa, fato que é notado desde a disponibilidade da lei falimentar extremamente protetiva até em relação à vacinação contra o Covid-19, ineficazes e nada preventivas. O trazido pela Lei n° 11.101 no caso recuperacional é preventivo quando demonstrado que não há uma crise econômica dentro da empresa, e que há viabilidade e necessidade da preservação da mesma. Além disso, importante lembrar que em nada é efetiva a preservação da empresa a qualquer custo, ou melhor, a custo dos credores que podem demorar anos para receber o que lhes é devido. Trazendo para o futebol, a Recuperação Judicial aparece como alternativa para o ressurgimento dos clubes que afundados por dívidas, não conseguem performar 75Title 18 ofthe United States Code. 37 esportivamente e ao invés de adotar políticas restritivas de gastos, buscam soluções em curto prazo que resolvem situações momentâneas e destroem as instituições pouco a pouco, seja com empréstimos, antecipação de recebíveis ou mesmo venda de atletas muito jovens. A cultura do imediatismo é péssima para os negócios dentro de nossos clubes, que se utilizam desses meios “simples” como escape, o que ao final do dia, de nada adianta. Gestores sem preparação, estatutos desatualizados e estruturas societárias antigas, preocupações políticas excessivas, endividamento extremo e recorrente e a falta de geração de receita, essa é a realidade de nosso futebol, como ocorreu com o Figueirense, figura central desse estudo. Por conta dessa situação, há de se falar que a Recuperação Judicial para clubes, enquanto medida propícia para a restruturação das instituições não será suficiente por si só, já a reorganização momentânea somente servirá para um verdadeiro respiro. É possível considerar a recuperação judicial como uma saída momentânea da UTI onde se o tratamento não for continuado, em nada resultará. Essa oportunidade de renegociação de dívidas e reorganização dada pela Lei n° 11.101 deve ser entendida como o começo do processo de mudança de gestão e de transparência dos clubes, e que se não for efetiva, deve sim resultar em falência. Além da Lei n° 11.101, de 2005, e alterações posteriores, em 2020, no contexto da pandemia de Covid-19, foi publicada a Lei n° 14.11276, de 2020, que trouxe inovações interessantes como possibilidade de transação tributária, maior responsabilidade do administrador judicial e até apresentação de Plano de Recuperação pelos próprios credores. Para esse estudo, nos atemos ao instituto da recuperação judicial de clubes, onde todo trâmite legal ocorre em juízo sob supervisão do magistrado. Além disso, os leading cases que serão a frente analisados não abordam a recuperação extrajudicial ou mesmo a falência. 4.1 PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA Para começo de conversa, é necessário citar o artigo 47 da Lei nº 11.101/2005 como precursor da finalidade essencial da recuperação judicial, assim como seu método, que deve atingir apenas instituições que conseguem vislumbrar a melhora de sua saúde financeira e consequente superação da crise, ou seja, preservação da empresa. 76BRASIL. Lei nº 14.112 de 24 de dezembro de 2020. Altera as Leis nos 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, 10.522, de 19 de julho de 2002, e 8.929, de 22 de agosto de 1994, para atualizar a legislação referente à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária. Brasília. Dezembro. 2020. 38 Nesse sentido, é o único em toda letra da lei que menciona as bases do sistema falimentar brasileiro, ou seja, manutenção da empresa, preservação de empregos e cumprimento ao interesse dos credores. Nas palavras do professor João Eudes Bezerra Filho, o Direito se preocupa com a sobrevida da empresa, já que faz parte da política econômica do Estado derivada da Constituição de 1988 o zelo pela ordem econômica e social, e isso só ocorre quando ambas caminham juntas. A recuperação judicial destina-se às empresas que estejam em situação de crise econômico-financeira, com possibilidade, porém, de superação; pois aquelas em tal estado, mas em crise de natureza insuperável, deve ter sua falência decretada, até para que não se tornem elemento de perturbação do bom andamento das relações econômicas do mercado. Tal tentativa de recuperação prende-se, como já lembrado acima, ao valor social da empresa em funcionamento, que deve ser preservado não só pelo incremento de produção, como, principalmente, pela manutenção do emprego, elemento de paz social77. Portanto, o papel do Estado aqui é se atentar àquelas empresas que realmente possuem a possibilidade de sobrevida, com condições de continuação de exploração de atividade econômica e consequente geração de empregos e lucro. O papel do Estado é de fiscalizador e de entendimento se a crise ali não é relacionada com o modelo de negócio, pois se a atividade está saturada, a falência deve ser o caminho escolhido. No caso do futebol, como exposto nos tópicos anteriores, a prática faz parte da cultura brasileira além do papel social importantíssimo que essas instituições centenárias desempenham em suas sedes, principalmente em relação à prática do esporte como ferramenta educacional e de desenvolvimento físico e humano. Grande parte do dever constitucional do Estado com políticas públicas é e foi desempenhado pelas associações que compõem o futebol brasileiro hoje, por isso, é importante a manutenção dessas instituições, que cada dia devem se tornar mais profissionais. O Estado e a sociedade ganham com preservação dessas instituições, além de que, com o crescimento da cultura do Sportainment78, esse mercado cada dia se mostra mais rentável. É fato que a indústria do futebol brasileiro ainda é represada justamente pelo caráter não profissional de nossos clubes, por isso mudanças são necessárias e a recuperação judicial pode ser uma alternativa para o começo da mudança. 77BEZERRA FILHO, João Eudes. Orçamento aplicado ao setor público: abordagem simples e objetiva. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013. P. 139-140 78Entrevista: Marcos Motta fala sobre o conceito de Sportainment. Disponível em: . Acesso em: 11 maio. 2021 39 4.2 FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE E FIGUEIRENSE FUTEBOL CLUBE LTDA. No dia 11 de março de 2021, o Figueirense Futebol Clube em litisconsórcio com o Figueirense Futebol Clube Ltda. nos autos do processo 5024222-97.2021.8.24.002379 apresentou Ação Preparatória de Pedido de Recuperação Judicial com a intenção de preparar o terreno para o pedido definitivo de Recuperação Judicial. Tal demanda, simples ao ver de sociedades empresárias comuns, é de extrema ruptura ao sistema que existe hoje no futebol, uma vez que se trata da primeira vez na história de nosso país que um clube de futebol requere esse tipo de proteção judicial. O pedido do Figueirense, associação sem fins lucrativos centenária, abre um novo precedente no futebol brasileiro, simbolizando ainda mais a necessidade de mudanças sistêmicas que só serão feitas por meio de iniciativas como essa. Como já exposto, a Recuperação Judicial não é a solução, mas abre uma porta muito interessante que merece ser bem explorada. A petição inicial, ainda, dotada de caráter de urgência, foi prontamente analisada pelo Juiz Luiz Henrique Bonatelli e no dia 12 de março de 2021, foi proferida decisão indeferindo a demanda por conta de ilegitimidade passiva dos requerentes extinguindo o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 330, II80, do Código de Processo Civil de 2015. Na sentença proferida pelo douto magistrado, é crucial destacar os dizeres que lastreiam a discussão do presente trabalho e que abrem a porta para a discussão sobre a condição se as associações sem fins lucrativos estão ou não no rol de legítimos para requerimento da Recuperação Judicial: Com a devida vênia aos entendimentos em sentido contrário, este magistrado filia-se à primeira corrente doutrinária tida positivista, de modo que, por esta razão, entendo que as associações civis sem fins lucrativos não podem utilizar-se da recuperação judicial por não constituírem sociedade empresária. Como colocado pelo magistrado, a primeira corrente entende a estrutura societária dos clubes, de associações, não suportaria o instituto falimentar previsto no rol do art. 1° da norma. Nesse trabalho, é defendida a segunda corrente, intitulada como “mais principiológica, sistemática e teleológica” 81, ou seja, que o direito deve se atentar sempre ao diálogo de 79TJSC. Processo 5024222-97.2021.8.24.0023. 80Art. 330. A petição inicial será indeferida quando: II - a parte for manifestamente ilegítima; 81TEIXEIRA, Pedro Freitas; BRAGA FILHO, Vanderson Maçullo. Recuperação judicial, extrajudicial e falência de associações civis desportivas. Revista dos Tribunais: RT, São Paulo, v. 107, n. 996, p. 393-441, out. 2018. 40 normas, que seguindo a teoria do diálogo das fontes de Norberto Bobbio, não excluiria a aplicação de outra norma, como ocorre na aplicação do positivismo clássico, mas sim pelo diálogo de duas normas ao mesmo tempo e espaço, em disposição de complementação. Nesse sentido, é viável a utilização do fardamento falimentar pelos clubes. Esse raciocínio jurídico será refletido mais a frente, entretanto, esse entendimento inovador foi o que motivou a decisão do douto desembargador relator Torres Marques em sua decisão monocrática em recurso de Apelação apresentado pelos requerentes no dia 15 de março de 2021. Os autos do recurso tramitaram no Tribunal de Justiça de Santa Catarina sob o mesmo número do juízo a quo e, no dia 18 de março de 2021 veio decisão reconhecendo a legitimidade do Figueirense Futebol Clube para atuar como requerente de Recuperação Judicial (ou nesse caso, atuação prévia), pois cumpria todos os requisitos da Lei de Recuperação e Falência - requisitos esses que serão em breve analisados. Tal decisão representa, como já exposto, uma nova fase do futebol brasileiro, que nos próximos anos terá o caminho um pouco menos congestionado para seu renascimento e consequente restruturação. Em suma, a “ousadia” da decisão82 do desembargador Torres Marques significa uma ruptura de paradigmas que circundavam as associações sem fins lucrativos que baseiam os clubes de futebol, já que esse entendimento simboliza mais um passo no caminho da compreensão do que o futebol é mais que somente uma paixão, mas uma indústria que assim deve ser tratada. O futebol e sua gestão não devem ser mais romantizados. Até o fechamento do presente trabalho, após a reforma da decisão de primeira instância, no dia 31 de março de 2021, foi deferido em sede de decisão liminar a antecipação dos efeitos do stayperiod de 180 dias em relação aos credores trabalhistas e quirografários do Figueirense. Após esse evento, ainda se aguarda o pedido definitivo de Recuperação Judicial do clube, por isso, muitos capítulos dessa história ainda estão por vir antes do desfecho. 4.2.1 Contexto histórico até pedido Antes de entrar no mérito da decisão, reforçando a história contada na introdução do presente trabalho, no Campeonato Brasileiro de Futebol, o Figueirense encontra-se atualmente em preparação para a disputa da Série C do Campeonato, ou seja, 3ª divisão nacional. 82TJSC. Apelação 5024222-97.2021.8.24.0023. Relator Desembargador Torres Marques. J. 18/03/2021. 41 A última disputa do Brasileirão Série A foi em 2016, quando foi rebaixado para a Série B em 18° lugar, o que demonstra a grandeza da instituição, que disputava a primeira divisão nacional há pouquíssimo tempo. Após a disputa da Série B em 2017, 2018, 2019 - quando inclusive contou com uma derrota por W.O.83 por atraso de salários - e 2020, já enfrentando uma situação extremamente delicada financeiramente, foi rebaixado em 17° lugar, com uma campanha de 09 vitórias em 38 jogos. Além da perda natural de receita por conta do rebaixamento, situação natural para qualquer clube, por conta da estruturação da operação do futebol nos últimos anos, principalmente em relação à parceria à Elephant, como narrado na introdução, a pandemia de Covid-19 foi responsável por uma queda vertiginosa na receita do clube, o que só cooperou com o endividamento por completo, principalmente com a queda da receita vinda da bilheteria e sócio torcedor, que praticamente foram zerados em 2020. Em dados retirados da petição inicial apresentada pelos patronos do Figueirense Futebol Clube e Figueirense Futebol Clube Ltda., a receita do clube entre 2016 e 2019 foi praticamente cortada em dois terços, com receita total de 30 milhões de reais em 2016 e 9 milhões em 201984. Inversamente proporcional às receitas foi o endividamento do clube, que desde o rebaixamento para a série B em 2017 vem aumentando exponencialmente, em 2020 o valor total chegou a 165 milhões de reais, contra 45 milhões em 2017. Mesmo com contratação de profissionais habilitados para a restruturação do clube, o endividamento faz com que certas negociações sejam inviáveis, ainda fortalecidas pelo cenário de pandemia. Dos 165 milhões de reais de dívida, cerca de 100 milhões de reais foram originados de litígios trabalhistas e com credores quirografários, ou seja, com fornecedores, com empréstimos e indenizações cíveis no geral. Para o presente estudo, esse valor é o que efetivamente importa, já que são os créditos que efetivamente entram debaixo do guarda- chuva da Lei n° 11.101, de 2005. O período sob gestão “profissional” da Elephant foi temerária e deixou o clube em situação muito mais delicada que antes. A situação do clube, antes do ajuizamento da ação, já era caótica e qualquer medida de austeridade ou controle de gastos pela instituição não refletia e não ajudava em nada, tratava-se apenas de medidas que conseguia controlar a situação momentaneamente, o que só deixava a situação cada vez mais sufocante. 83Jogadores do Figueirense não entram em campo, e Cuiabá vence por W.O. na Série B do Brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 06 maio. 2021. 84Entende-se como receita aqui o total de transação de atletas, sócio torcedor, patrocínios, bilheteria, entre outros, sem venda de direitos de transmissão. 42 Somente em demandas trabalhistas anteriores ao ajuizamento do pedido prévio de Recuperação Judicial, o Figueirense (Associação + Sociedade Limitada) consta no polo passivo de 104 reclamações trabalhistas entre ações de conhecimento e recurso, além de 17 ações de execução, o que só coopera com a tese que certas negociações eram inviáveis, conforme dados acostados ao processo. A atividade esportiva, como qualquer outra, visa lucro, no entanto, haja vista a condição financeira do clube, com incremento sem limites da dívida, esse objetivo era impossível. Ainda assim, o clube continuava exercendo suas atividades esportivas sob total e eminente risco de colapso, o que traria consequências graves a diversos agentes relacionados com a instituição Figueirense. Caso a operação do futebol fosse descontinuada, o clube teria que abandonar competições em curso e futuras, no caso o Campeonato Catarinense Série A e Brasileirão Série C, além de tomar punições no âmbito da Justiça Desportiva Estadual e Nacional, da estagnação da atividade geradora de receitas, perda de um contribuinte pelo fisco local e, por fim, o não pagamento efetivo e certo dos credores das dívidas. Após diversos estudos de viabilidade financeira, o clube não conseguiu prever meios possíveis de continuar a operaçãofutebol sem o auxílio do procedimento da Recuperação Judicial, com o intuito de reestruturar toda sua gestão a fim de conseguir pagar seus credores devidamente, com proteção a seus ativos. 4.2.2 Estrutura do litisconsórcio: associação + sociedade limitada Para melhor compreensão da estrutura societária e do litisconsórcio formando pelas entidades requerentes, é necessário entender a história, o papel de ambas e como funciona sua ligação. O Figueirense Futebol Clube, fundado em 12 de junho de 1921 em Florianópolis, Santa Catarina, sempre foi considerado um dos grandes clubes da região, tendo conquistado em sua história 18 títulos do Campeonato Catarinense e 01 torneio Mercosul em 1995, competição preparatória para o seguinte da temporada, além disso, já foi vice-campeão do Campeonato Brasileiro série B em 2001 e 2010 e vice-campeão da Copa do Brasil em 2007, em campanha de muito destaque, perdendo apenas o título para o Fluminense. O Figueirense, além do pioneirismo no Estado de Santa Catarina de ser o primeiro clube a disputar uma competição nacional, em 1973, ainda é o clube com maior torcida em 43 Santa Catarina, segundo a revista Placar, o que demonstra a tradição do clube não só no Estado, mas em todo o Brasil. Como já situado na introdução do trabalho, em 2014 o clube, com a intenção de profissionalizar de vez sua gestão e constituir práticas similares às de grandes clubes europeus, resolveu constituir parceria com a empresa Elephant Participações, empresa de investimentos trazida pelo presidente do clube à época, com uma proposta muito tentadora e pioneira, a constituição do primeiro clube-empresa brasileiro, entre os clubes que compunham a elite do futebol no país. Por conta da parceria, em acordo selado em 2017, foi acordada a transferência de toda a operação futebol para a então criada Figueirense Futebol Clube Ltda., sociedade limitada que seria controlada pelo clube Figueirense Futebol Clube, associação civil sem fins lucrativos. Pelo contrato, a Elephant, seria acionista controladora da sociedade, com 95% do capital social, enquanto o clube seria detentor de 5% do capital social. Ideia fantástica onde a única contrapartida da Elephant seriam aportes regulares para o desenvolvimento das atividades da empresa, o que, ao passar do tempo, não ocorreu. Uma série de inadimplementos contratuais por parte da Elephant foi ocorrendo até que em maio de 2019, o Figueirense Futebol Clube, descontente com toda situação, notificou seu “parceiro” com a intenção de solucionar a situação ora descrita. Ocorre que, mesmo após o reconhecimento de diversas obrigações pela Elephant e assinatura de novo acordo em julho de 2019, nada mudou. As obrigações oriundas da segunda negociação não foram nada eficazes e consequências dessa gestão temerária foram cruciais para o desenrolar da história até a recente situação. Tanto que, em 2018 e 2019, atrasos de salários foram tão recorrentes que jogadores do clube decidiram entrar em greve por conta de não pagamento de meses de salário. O ápice ocorreu no fatídico dia de 20 de agosto de 2019, em jogo da Série B, entre Cuiabá e Figueirense, na Arena Pantanal, onde em tom de protesto, os jogadores do Figueirense não entrando em campo acarretando uma derrota por 3x0 por W.O, como já exposto. Com a situação cada vez pior, o clube conseguiu a rescisão do vínculo contratual com a Elephant em setembro de 2019. No entanto, o legado dessa parceria temerária deixou o clube e toda a operação futebol com alto endividamento e consequente desempenho esportivo pífio. Após toda a reviravolta, o Figueirense Futebol Clube hoje controla a sociedade Figueirense Futebol Clube Ltda., que após restruturação na operação futebol, é responsável 44 por algumas tarefas vitais para o funcionamento de toda a instituição. A associação e a sociedade limitada são parte integrante da operação do clube, e como exposto na inicial apresentada pelos patronos dos requerentes no pedido prévio, como exposto na parte: “se complementam e se integram, formando um feixe único e indissociável de atividades destinadas a um objetivo único e comum” 85. O vínculo, além de societário, também é comercial. O Figueirense Futebol Clube, associação, é o agente responsável pela assinatura de contratos com atletas e comissão técnica, além de receber verba proveniente de patrocínios e ser titular da marca Figueirense, ou seja, recebe os rendimentos do licenciamento da marca. Ainda, é responsável pelo pagamento dos salários e direitos de imagem, pagamentos de taxas de registro, despesas operacionais de jogos, despesas com categorias de base, fornecedores em geral e contas do dia a dia, como luz, água etc. Já a sociedade limitada, Figueirense Ltda., administra o programa de sócio torcedor e toda a operação do estádio Orlando Scarpelli, ou seja, contratação e gestão de todos os fornecedores necessários às atividades, além de cuidar das despesas de logística para a disputa de jogos dentro e fora de casa. Em suma, embora estruturados em modelos organizacionais distintos, ambos são cruciais para a atividade empresarial desenvolvida no departamento de futebol do Figueirense, por isso formam o litisconsórcio ativo na busca da restruturação da instituição. 4.3 DO CABIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DO STAY PERIOD Em decorrência dos efeitos da pandemia de Covid-19, algumas medidas foram necessárias para a efetivação da preservação de diversas empresas em todo território nacional. Por conta de pressão para medidas legislativas, no dia 23 de dezembro de 2020 foi publicada a Lei n° 14.212, de 2020, que trouxe diversas inovações e atualizações para a Lei n° 11.101, de 2005, entre elas a positivação de entendimento já efetivada e recorrente em nossos tribunais superiores, a possibilidade de suspensão de ações de execução dos créditos sujeitos à Recuperação Judicial, ou seja, a antecipação dos efeitos do stayperiod antes do pedido recuperacional. Nas palavras de Daniel Carnio Costa e Alexandre Correa Nasser de Melo, essa possibilidade dá maior conforto e tranquilidade à empresa requerente no pedido, já que antes 85TJSC. Processo 5024222-97.2021.8.24.0023, fls. 6. 45 mesmo do ajuizamento do pedido, já consegue usufruir da suspensão de 180 dias que é essencial em todo processo de restruturação objetivado pela medida: A lei 11101 de 2005, art. 6º, §2º estabelece que o magistrado, quando respeitado o contido no CPC /2015 art. 300, poderá deferir tutela de urgência para antecipar, total ou parcialmente os efeitos do processamento da recuperação judicial. Esse expediente poderá ser utilizado quando da determinação da constatação prévia para conceder proteção ao devedor enquanto é feita a aferição do cumprimento dos requisitos legais para deferimento definitivo do processamento ou o indeferimento da inicial. Essa disposição legal é de essencial importância para a proteção das empresas que buscam em juízo a recuperação judicial. Isto porque o simples protocolo do pedido acarreta em uma verdadeira corrida ao ouro, com o ajuizamento de ações pelos credores em busca de seus direitos, antes de juízo conceder a suspensão prevista na lei 11.101/2005, art. 6º, § 4º. Ao possibilitar a suspensão antes mesmo de ser deferido o processamento da recuperação judicial a lei protege a devedora e assegura ao juízo a tranquilidade de não colocar em processamento recuperação judicial de empresa cuja situação esteja irregular86. Além disso, como previamente exposto, esse tipo de pedido liminar cautelar não é uma novidade e inclusive, por grata surpresa, os tribunais já estavam demonstrando certa sensatez nesse sentido, como, por exemplo, no caso emblemático e tão importante para o processo aqui em voga, o pedido de Recuperação Judicial da Associação Sociedade Brasileira de Instrução e pelo Instituto Cândido Mendes no primeiro semestre de 2020, quando veio à tona a discussão da viabilidade do pedido de Recuperação Judicial de uma associação civil educacional sem fins lucrativos. Esse caso será explorado mais a frente, pela sua vital importância. Por isso, a nova redação de artigos como o §12º87 do art. 6º, em linha com o §2° 88 e §4° 89do mesmo artigo fez com quea antecipação dos efeitos do stay period fosse possível de um ponto de vista estritamente positivista, levando em conta apenas a letra da lei. 4.4 LEI 11.101, DE 2005: REQUISITOS PARA PEDIDO Nos termos da Lei de Recuperação e Falência, nos termos do seu art. 48, estão fixados os requisitos necessários para o início do procedimento ora descrito, para aqueles. 86CARNIO COSTA, Daniel. NASSER DE MELO, Alexandre Correa. Comentários a lei de recuperação de empresas e falência: lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Curitiba: Juruá, 2021. P. 72. 87Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica: § 12. Observado o disposto no art. 300 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), o juiz poderá antecipar total ou parcialmente os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial. 88§ 2º É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o art. 8º desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença. 89§ 4º-A. O decurso do prazo previsto no § 4º deste artigo sem a deliberação a respeito do plano de recuperação judicial proposto pelo devedor faculta aos credores a propositura de plano alternativo, na forma dos §§ 4º, 5º, 6º e 7º do art. 56 desta Lei, observado o seguinte: 46 Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente: I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes; II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial; III - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo; IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei. Por ser um pedido pioneiro, os requisitos ditados pelos incisos I, II, III e IV não são foco de preocupação pelos requerentes. A parte que realmente interessa aqui é o disposto no caput, sobre o exercício regular das atividades por mais de dois anos, já que a associação sem fins lucrativos não possui registro na junta comercial pela sua estrutura societária. Além do artigo 48, os artigos 1° e 2º são cruciais para essa análise e são os centros da pesquisa aqui produzida. Nos termos do artigo 1º da Lei nº 11.101, de 2005, o cabimento de todo o arcabouço falimentar ampara os empresários e as sociedades empresárias, apenas. O artigo 2º, por sua vez, detalha expressamente aqueles que taxativamente não podem recorrer a essa Lei, como no inciso I, empresa pública e sociedade de economia, que não possuem legislação falimentar própria e no inciso II, com instituições financeiras públicas e privadas, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores. As instituições financeiras públicas e privadas e aquelas a elas equiparadas possuem legislação especial para esse procedimento, já que o risco atrelado à falência de instituições que atuam no mercado financeiro pode resultar em crises sistêmicas. Por isso, há legislação especial que trata essa situação de outra forma, como na Lei nº 6.024, de 197490, e regulamentação expedida pelo Banco Central do Brasil. Como o objetivo do presente trabalho é a defesa da legitimidade de associações esportivas para o uso da Lei nº 11.101, de 2005, utilizando a decisão do Figueirense como base, o item 4.4.1 é a parte central do trabalho, uma vez que superada a problematização da legitimidade, um novo caminho aparenta nascer para o renascimento de nossas instituições esportivas. 90BRASIL. Lei nº 6.024 de 13 de março de 1974. Dispõe sobre a intervenção e a liquidação extrajudicial de instituições financeiras, e dá outras providências. Brasília. Março. 1974. 47 4.4.1 Legitimidade O processo nº 5024222-97.2021.8.24.0023 SC trouxe à tona pela primeira vez a discussão sobre a legitimidade de uma associação sem fins lucrativos que atua com futebol profissional para requerer as prerrogativas de uma recuperação judicial. É notório que não é a primeira ocasião que há a discussão nos tribunais brasileiros inclusive com o deferimento de recuperações judiciais de associações civis, entretanto, é a primeira vez que um clube de futebol estruturado dessa maneira é contemplado com o benefício. Trata-se de uma decisão divisora de águas para o futebol. Como já exposto, a decisão em 1ª instância, proferida pelo Juiz de Direito Luiz Henrique Bonatelli, foi desfavorável ao clube, com o entendimento que a associação não se enquadra no conceito de sociedade empresária e por isso não teria legitimidade para o pedido. Ocorre que, em sua própria argumentação, o magistrado reconheceu a existência de duas correntes de pensamento nesse sentido, como transcrito na decisão: “Não desconheço a existência, de fato, de duas correntes doutrinárias a respeito desse tema. Uma tida por conservadora, positivista e literal, ou seja, com foco na dicção legislativa, e, por outro lado, outra que se atribui principiológica/teleológica, cada qual com forte e respeitada fundamentação em sentidos opostos”. A primeira corrente, estritamente positivista, entende que somente aqueles que possuem carcaça de sociedade empresária podem requerer o benefício nos termos do artigo 1º da LRF, no entanto, em conjunto com o artigo 2º, onde estão as hipóteses de não aplicação da LRF, a associação sem fins lucrativos também não está presente. De um lado, é entendido que o rol trazido pela junção dos artigos 1º e 2º é taxativo, já que delimita quem pode usufruir da prerrogativa normativa da lei ao mesmo tempo em que não evidencia uma expressa proibição do uso pelas associações. É justamente aqui que não há consenso sobre o que é o correto e o que não é. Enquanto a primeira corrente se socorre na literalidade pura do dispositivo, a segunda corrente, que foi a utilizada pelo Desembargador Torres Marques na Decisão no Tribunal de Justiça de Santa Catarina reformando a decisão, procura a análise mais principiológica, sistemática e por fim teleológica da questão, tentando efetivamente se atentar ao papel social e econômico do Direito e sua aplicação. O Direito, por sua vez, deve ser entendido como único e suas regras devem se comportar como um sistema, e não isoladas umas das outras, e esse sistema é coordenado de maneira que essas regras se comuniquem, sendo ajustadas em torno das demandas reais. 48 O ordenamento jurídico, pela sua essência positivista e burocrática, não consegue acompanhar as novidades da sociedade, que está em constante mudança. Por isso, é essencial que os precedentes estejam em linha com as mudanças orgânicas e diárias da sociedade. Nesse caso da recuperação judicial, ainda mais pelo agravamento da situação não prevista pela pandemia de Covid-19, medidas que não necessariamente estavam codificadas são necessárias. Para alguns autores como Pedro Teixeira e Vanderson Braga Filho91, esse gap na legislação deve ser compreendido como uma situação de extensão de efeitos, já que entende que se não há previsão expressa de não aplicação, não há proibição. Além disso, importante levar em conta a importância e impacto da instituição na sociedade, ou seja, a função social da instituição é o que realmente importa, não sendo essencial ter roupagem empresarial de direito. Conforme consta na própria decisão, o entendimento da ilegitimidade para a demanda foi fruto de uma convicção conservadora do magistrado, que se ateve a uma leitura literal do texto de lei: “Com a devida vênia aos entendimentos em sentido contrário, este magistrado filia-se à primeira corrente doutrinária tida positivista, de modo que, por esta razão, entendo que as associações civis sem fins lucrativos não podem utilizar-se da recuperação judicial por não constituírem sociedade empresária.” Ou seja, independente da atividade econômica exercida, o que realmente importa é a roupagem jurídica adotada. Aqui, é possível inclusive, uma cognição mais profunda sobre o uso do positivismo como corrente de entendimento. Como é de notório saber, o positivismo possui vertentes que compreendem verdadeiramente o sentido do chamado fenômeno jurídico, que de certa forma entendem que o texto legal pode ser moldado a certas situações quando necessário para cumprir como sua eficácia. É o que entende o nobre professor Norberto Bobbio92, que entende que mesmo dentro da forma positiva, é necessário que haja uma folga no conteúdo expresso da regra, para adequação aos fatos, à realidade. Segundo Bobbio: “Para o realismo jurídico, é natural que haja uma “defasagem” ou uma “divergência” entre o ordenamento do legislador e o ordenamento os juízes”. Portanto entende-se que mesmo a defesa do positivismo expresso como compreensão total desse indeferimento não é totalmente correta. Fato é que mesmo com a utilização da 91TEIXEIRA, Pedro Freitas; BRAGA FILHO, Vanderson Maçullo. Recuperação judicial, extrajudicial e falência de associações civis desportivas. Revista dos Tribunais: RT, São Paulo, v. 107, n. 996, p. 393-441, out. 2018. 92BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico: Lições de filosofia do Direito. São Paulo: Ícone, p. 143 49 literalidade, no ordenamento brasileiro não há nada que proíbe expressamente a recuperação judicial de associações civis. Nesse sentido, há quatro disposições normativas que baseiam a viabilidade da recuperação judicial para clubes. Em primeiro lugar, o art. 20 da LINDB93, que de certa forma, pode ser entendido como uma “positivação” do realismo jurídico, que diz: “Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão”. Por esse artigo, é dever primordial do magistrado a compreensão e busca pelo instituto jurídico mais adequado para solucionar de forma prática a demanda, e não utilizar regras que distanciam a verdadeira função do direito, que é a ordem social. Claramente nesse caso, a interpretação literal da norma não levou em consideração as consequências de uma decisão naquele sentido. Em segundo lugar, o art. 8º do Código de Processo Civil atenta o dever do magistrado de se ater às exigências da sociedade: “Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência”. Ou seja, as decisões judiciais, devem ao mesmo passo de aplicação da lei, levar em conta as exigências da sociedade para promover o equilíbrio jurídico, econômico e social. O juiz não deve se atentar apenas ao direito, até porque qualquer decisão tomada resultará em algo de grande impacto em todas as vertentes da sociedade. Nesse sentido, o direito segue a 3ª lei de Newton, ou seja, toda ação resulta em uma reação. Em terceiro lugar, a própria Lei Pelé, em seu artigo 27 §6º e §13º equipara o tratamento das entidades desportivas que atuam no futebol profissional ao de sociedades empresárias, independente do roupamento jurídico adotado: § 6º Sem prejuízo de outros requisitos previstos em lei, as entidades de que trata o caput deste artigo somente poderão obter financiamento com recursos públicos ou fazer jus a programas de recuperação econômico-financeiros se, cumulativamente, atenderem às seguintes condições: § 13. Para os fins de fiscalização e controle do disposto nesta Lei, as atividades profissionais das entidades de que trata o caput deste artigo, independentemente da forma jurídica sob a qual estejam constituídas, equiparam-se às das sociedades empresárias. Na leitura dos dispositivos, fica clara a intenção do legislador, que, atento à ausência de vedação legal no art. 2º da Lei nº 11.101 de 2005 sobre associações civis, optou pela 93BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657 de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Rio de Janeiro. Setembro. 1942. 50 introdução da norma deliberativa dentro da legislação específica da atividade em questão, que, no caso, abrange apenas instituições que atuem em linha com Lei Pelé na atividade profissional do futebol. Essa exposição demonstra que o legislador, em linha com entendimento das dimensões econômicas adquiridas pelo futebol, totalmente diferente de outros esportes, mesmo com a estrutura ainda associativa, explora a atividade econômica futebol e, deve ser beneficiada com as prerrogativas dispostas na Lei de Recuperação e Falências. O futebol, ainda que estruturado de maneira arcaica, é responsável por evidente desempenho de atividade econômica, incontestavelmente sendo agente de mercado que gera empregos, paga tributos e ainda, exerce função social essencial, com incentivo à prática de esporte e inclusão social por meio de atividade esportiva. É verdade que, de fato, os clubes associativos não são formalmente uma sociedade empresária, mas desempenham atividade econômica como assim fossem94. Nesse sentido, novamente Pedro Teixeira e Vanderson Braga Filho95 se manifestam: É indiscutível, como já ressaltado, a importância das entidades desportivas, mormente os grandes clubes de futebol, frente à economia, bem como a notável função social que exercem. Ademais, não há como se negar que a bancarrota de uma agremiação desportiva, principalmente uma entidade grande de futebol, prejudica a todos que dela dependem e, de modo geral, toda a sociedade. Importante nesse caso, citar o entendimento do nobre professor Norberto Bobbio sobre a teoria do diálogo das fontes, onde uma norma não excluiria a aplicação da outra, pelo contrário, para certas demandas é necessária a aplicação conjunta das normas num mesmo tempo e num mesmo espaço, afastando assim a discussão sobre uma possível antinomia jurídica. Portanto, o que deve ser compreendido é que no caso de clubes associativos, e apenas para clubes de futebol, é possível aplicar o disposto no art. 1º da LRF, ou seja, a aplicação da Lei e o disposto no art. 27 §6º e §13º da Lei Pelé. Em quarto lugar, após demonstração de pontos que devem ser levados em consideração, ainda há o disposto no artigo 966 do Código Civil, onde está expressa qual a denominação de empresário: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”. Inegável, portanto, o 94 RAMUNNO, Pedro Alves Lavacchini. DUARTE, Gabriel de Macedo. Recuperação Judicial do Botafogo de Futebol e Regatas, por que não? Disponível em: . Acesso em: 1 maio. 2021. 95TEIXEIRA, Pedro Freitas; BRAGA FILHO, Vanderson Maçullo. Recuperação judicial, extrajudicial e falência de associações civis desportivas. Revista dos Tribunais: RT, São Paulo, v. 107, n. 996, p. 393-441, out. 2018. 51 argumento que clubes de futebol associativos exercem profissionalmente atividade econômica organizada, visto que os valores movimentados pelo futebol no Brasil representam porcentagem significativa do PIB nacional96, sendo, inclusive, muito mais relevantes que diversas atividades que essencialmente são exploradas por sociedades empresárias natas. Por fim, após toda argumentação possível para demonstrar que a associação sem fins lucrativos deve se beneficiar da Recuperação Judicial, importante também citar o Enunciado 534 da VI Jornada de Direito Civil do Conselho Federal de Justiça em 2013, onde fica expresso que “as associações podem desenvolver atividade econômica, desde que não haja finalidade lucrativa” 97. Ou seja, ainda que não presente a estrutura de sociedade empresária, as associações que desenvolvem o futebol profissional exploram atividade econômica como se sociedades empresárias fossem, portanto, sem levar em conta as questões tributárias já superadas, é totalmente viável e legitimidade das associações esportivas que explorem o futebol profissional em pleitear a Recuperação Judicial. É inegável também o fato que o negócio futebol estimule a circulação de bens e serviços, nos termos do artigo 966 do Código Civil, visto que para o jogo ocorrer dentro de campo é necessário a realização de atividades fora dele, como estádio, transmissão, logística, entre muitas outras coisas. Por isso, após análise profunda de cada entidade, deve ser entendido que uma associação sem fins lucrativos pode ter fins econômicos, e, em caso de viabilidade econômico-financeira de recuperação, o benefício ofertado pela Lei nº 11.101 deve ser utilizado. 4.4.2 Precedentes importantes O deferimento prévio para antecipação do stay period para o Figueirense Futebol Clube e para o Figueirense Futebol Clube Ltda. é certamente uma enorme novidade para o mercado do futebol, entretanto, não é a primeira vez que uma associação sem fins lucrativos consegue o aval para uma recuperação judicial. 96CBF apresenta relatório sobre papel do futebol na economia do Brasil - Confederação Brasileira de Futebol. Disponível em: . Acesso em: 1 maio. 2021. 97Consulta de Enunciados. Disponível em: . Acesso em: 1 maio. 2021. 52 Dentre alguns exemplos de deferimento, é possível citar alguns casos como a do Hospital Casa de Portugal, deferida em 2006 na 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro após decisão do STJ, a da Unimed Petrópolis Cooperativa de Trabalho Médico, deferida em 2018 na 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, a da Unimed Manaus Cooperativa de Trabalho Médico, em 2020 na 16ª Vara Cível e Acidentes de Trabalho de Manaus e do Hospital Evangélico de Salvador, em 2020 na 1ª Vara Empresarial de Salvador. No entanto, o deferimento com maior importância para o presente trabalho é o da Universidade Cândido Mendes, com deferimento processado em 13 de maio de 2020, após pedido pelas mantenedoras da instituição, Associação Sociedade Brasileira de Instrução – ASBI e Instituto Cândido Mendes. Trata-se de decisão no processo 0093754- 90.2020.8.19.000198 da douta juíza Maria da Penha Nobre Mauro, da 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. Na decisão histórica, é possível extrair passagens que só legitimam a condição das associações sem fins lucrativos, além de corroborar com a imensa importância social dessas entidades, no caso da educação da Cândido Mendes, e no esporte com o Figueirense. Sobre o não enquadramento em sociedades empresárias: Embora as requerentes não se enquadrem no regime jurídico de sociedade empresária, tratandose de associação civil sem fim lucrativo, qual se vê do seu instrumento de constituição, não extraio dos artigos 1º e 2º da LRF impedimento a que se possam beneficiar do procedimento da recuperação judicial.” É certo que o art. 1° da Lei n° 11.101/2005, se refere à recuperação judicial, à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária, e que o art. 2°, nos seus incisos I e II, expressamente exclui da abrangência da lei as entidades que elenca, entre as quais não consta associação de ensino. Assim, a menos que se estenda à associação civil de ensino a proibição genérica oriunda da sua não inclusão no art. 1°, é forçoso concluir não existir na lei vedação ao deferimento de recuperação judicial às instituições ora requerentes99. Sobre o entendimento de atividade empresária levando em conta a idade das instituições aqui citadas; A Cândido Mendes fundada em 1902 e o Figueirense Futebol Clube em 1921: A existência da atividade empresária, vale dizer, da empresa, não deve ser considerada simplesmente sob o aspecto formal, mas fático. Uma compreensão que se deflui, inclusive, do próprio Código Civil, o qual, no art. 982, considera empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro. Não se pode olvidar que a dinâmica dos fatos, a evolução do direito comercial e do direito econômico, demandam uma nova forma de reflexão. Os tempos de agora não são os tempos de 15 anos atrás, quando editada 98TJRJ. Processo 0093754-90.2020.8.19.0001. Juíza Maria da Penha Nobre Mauro. J. em 13.05.2020. 99TJRJ. Processo 0093754-90.2020.8.19.0001.Fls. 7054. 53 a Lei nº 11.101, menos ainda os de 118 anos atrás, quando tudo começou para a Universidade Cândido Mendes100. Ainda é possível citar algumas passagens judiciais citadas pela eminente juíza em sua argumentação, inclusive em outros processos de Recuperação Judicial que também versavam sobre estruturas societárias semelhantes ao Figueirense e à Cândido Mendes que defendem a corrente teleológica como a melhor interpretação: [...] sempre que for verificada alguma dissonância entre os efeitos produzidos pela interpretação literal dos dispositivos legais e a intenção do legislador, deve o intérprete analisar teleologicamente a norma aplicável à espécie de julgamento. (...) é sempre necessário observar o princípio constitucional da função social da propriedade e também o postulado da manutenção dos meios de produção101. No mesmo sentido, o Ministro Luis Felipe Salomão defende o uso da legislação falimentar como fomentadora da superação da crise empresarial, e não o contrário: Com efeito, a hermenêutica conferida à Lei 11.101/2005, no particular relativo à recuperação judicial, deve sempre se manter fiel aos propósitos do diploma, isto é, nenhuma interpretação pode ser aceita se dela resulta circunstância que, além de não fomentar, na verdade inviabilize a superação da crise empresarial, com consequências perniciosas ao objetivo de preservação da empresa economicamente viável, à manutenção da fonte produtora e dos postos de trabalho, além de não atender a nenhum interesse legítimo dos credores, sob pena de tornar inviável toda e qualquer recuperação, sepultando o instituto102. Por fim, para finalização de todo o raciocínio, crucial citar o entendimento dos professores Luiz Roberto Ayoub e Cássio Cavalli sobre o tema: Conquanto a grande maioria dos agentes econômicos sejam qualificados como empresários - legitimados, portanto, a recorrer aos processos concursais previstos na LRF - há em menor número agentes econômicos que não são qualificados como empresários e são excluídos do sistema concursão da LRF. Essa divisão do sistema concursal é fundada em razões de path dependence. Ou seja, atualmente reserva-se o sistema de direito concursal para os agentes qualificados como empresários, enquanto os não-empresários são excluídos, apenas porque em um dado momento do passado essa divisão foi afirmada. No entanto, se observado o contexto econômico atual, não há nenhuma razão que justifique a opção de excluir quem não for empresário do sistema concursal da LRF. Qualquer exclusão legal do regime concursal da LRF deve ser afirmada com base em claros objetivos103. 100TJRJ. Processo 0093754-90.2020.8.19.0001.Fls. 7056. 101Citação da Ministra Nancy Andrighi, constante no acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na recuperação judicial de Associação Educacional Luterana do Brasil, Apelação Cível nº 5000461- 37.2019.8.19.0008 102STJ. REsp nº 1.207.117-MG, Relator Ministro Luis Felipe Salomão. J. em 10/11/2015. 103AYUB, Luiz Roberto; CAVALLI, Cássio Machado. "A Construção Jurisprudencial da Recuperação Judicial de Empresas, 4ª edição, Forense. P.3. 54 4.5 IMPORTÂNCIA PARA O FUTURO DO FUTEBOL BRASILEIRO Como reiteradamente citado, a decisão proferida favorável ao Figueirense no Processo nº 5024222-97.2021.8.24.0023 SC marca um divisor de águas para o futebol brasileiro. Os clubes, que organizados como associações sem fins lucrativos, foram e ainda são castigados pelos efeitos da pandemia de Covid-19, já que enquanto as receitas continuaram deficitárias, as despesas não foram igualmentes reduzidas. Por conta disso, algumas alternativas foram construídas tendo em vista a resolução pelo menos momentânea de algumas questões. O Figueirense Futebol Clube, que por questões de gestões temerárias em um passado recente, já em uma situação dita como inssustentável, foi o primeiro clube a se aventurar em questões falimentares e recuperacioanais, e, com esse sucesso, abre a possibilidade do uso da prerrogativa por outros clubes que também se encontram em situações muito delicadas, como Corinthians e Cruzeiro. No entanto, a Recuperação Judicial não deve ser entendida como o meio de salvação dos clubes que, por conta de péssimas gestões, chegaram a situações catastróficas em suas finanças, e sim como uma oportunidade de reorganização e consequente profissionalização de gestão, abrindo um caminho favorável à mudança para clube-empresa, seguindo os principais players do mercado do futebol europeu. Além disso, a evolução em quesitos de compliance e governança corporativa são igualmente cruciais em todo o processo, já que esse ambiente mais transparente é propício ao recebimento de novos investimentos, seja por meio de patrocínios ou mesmo por meio do mercado de capitais, questão que merece ser muito bem explorada em futuros trabalhos, já que depende da construção de um ambiente favorável que começa a ser construído com a disponibilidade da Recuperação Judicial. Trata-se de grande passo rumo à mudança do futebol brasileiro, que necessita de mudanças radicais de cultura e organização. 56 5. CASES INTERNACIONAIS RECENTES – O RENASCIMENTO APÓS A RECUPERAÇÃO JUDICIAL Diante do pioneirismo do Figueirense em questões relacionadas à Recuperação Judicial, não há nenhuma experiência prévia sobre o tema em território nacional, por isso, alguns exemplos internacionais de sucesso podem ser utilizados como modelo para os clubes brasileiros que utilizarão o instituto no futuro. 5.1 ESPANHA Quando o assunto é futebol espanhol, Real Madrid e Barcelona são os primeiros exemplos a serem lembrados como clubes grandiosos que, consequentemente, possuem jogadores de nível mundial e folhas de pagamento exorbitantes. O Real Madrid dos anos 2000, por exemplo, conhecido pela montagem do elenco dos Galácticos, é um exemplo de sucesso desse tipo de prática, já que os resultados esportivos alcançados pela equipe, de certo modo, conseguiram suportar o alto nível de investimento que foi feito. Entretanto, a mesma prática não foi um sucesso para outras agremiações espanholas. Em suma, uma série de medidas como a migração forçada para o modelo empresarial da Sociedade Anônima Esportiva e a falta de controle e fiscalização de gastos fizeram com que, em 2004, fosse anunciada o primeiro pedido de Recuperação Judicial entre clubes com maior relevância nacional, como foi o caso do Las Palmas, clube que atualmente joga a La Liga 2, segunda divisão do futebol espanhol. Após o requerimento do Las Palmas, Sporting de Gijón e Málaga seguiram os mesmos passos e entraram em juízo requerendo o benefício. Desde 2017 não há mais notícias de novos pedidos de Recuperação Judicial. No entanto, de 2004 até 2017 ao todo 22 clubes conseguiram renegociar suas dívidas, entre eles, em destaque Real Betis em 2011, Celta de Vigo em 2013, Real Sociedad em 2013 e Deportivo La Coruña em 2013104. Mesmo com a legislação espanhola limitando os acordos entre os clubes recuperandos e os credores em um desconto máximo de 50%, em algumas ocasiões o desconto total conseguido foi de 85%, como o caso do Celta de Vigo. 104CAPELO, Rodrigo. Com questionáveis descontos e prazos para pagar dívidas, o futebol espanhol se salvou da falência via recuperação judicial. Disponível em: . Acesso em: 3 maio. 2021. 57 Além disso, a legislação espanhola também impunha prazo máximo para pagamento do acordo de cinco anos, no entanto, alguns juízes optavam pelo entendimento de se tratar de casos excepcionais para a sobrevivência dos clubes que eram essenciais para a sociedade. No caso do próprio Celta de Vigo, por exemplo, foram dez anos para o pagamento e, no caso do Deportivo La Coruña, foram incríveis trinta e quatro anos para o pagamento do acordo. Em estudo dos economistas espanhóis Manuel Rico Llopis e Francisco Puig Blanco105, a maior flexibilidade conseguida pelos clubes para pagamento de seus credores se deu pela maioria da dívida ser de ordem tributária, previdenciária e trabalhista, ou seja, pela condição de credor do Estado, foram conseguidos prazos e descontos que não seriam possíveis com instituições financeiras, por exemplo. Em contrapartida a flexibilização dada pelo governo, algumas medidas foram tomadas como endurecimento da responsabilidade dos clubes no controle orçamentário e, a partir de 2015, uma distribuição mais igualitária da receita decorrente dos direitos de transmissão que passaram a ser negociados coletivamente e não mais individualmente por cada clube. Fato é que tal exemplo mostra o caráter de excepcionalidade do futebol e o dever da máquina estatal em garantir os meios adequados para salvação das instituições centenárias que compõem o futebol nacional. 5.2 WIGAN ATHLETIC: INGLATERRA O Wigan Athletic Football Club, clube inglês tradicional foi o responsável pelo último pedido de Recuperação Judicial em solo britânico. Em crise intensificada pela pandemia de Covid-19, no dia 1 de julho de 2020, o clube passou a constar como “under administration”, situação que corresponde ao “em Recuperação Judicial” conforme o artigo 69 da Lei nº 11.101, de 2005106. Assim como na lei brasileira, a entrada “under administration” obriga a instituição a apresentar novo plano judicial de reorganização do passivo além de tomar medidas para renegociação com credores e venda de ativos para cobrir o endividamento. Além disso, ainda há a perda de 12 pontos no campeonato que o clube esteja disputando, quando o formato é por pontos corridos. 105LLOPIS, Manuel Rico; BLANCO, Francisco Puig. ¿Por quésuperanlos concursos de acreedoreslos clubes de fútbolprofesionalesespañoles?Universia Business Review. Cuarto Trimestre 2015. 106 Wigan entra em administração judicial por problemas financeiros e terá 12 pontos de penalização. Disponível em: . Acesso em: 3 maio. 2021. 58 Para instituições que exploram o futebol profissional no Reino Unido, após a entrada na condição de recuperação judicial ou “administration”, ainda há a obrigação de pagamento prioritário para outros clubes e atletas antes de outros credores, na chamada “football creditors rule”. Além da medida mais restritiva análoga à Recuperaração Judicial, há o procedimento denominado “Company voluntary arrangement – CVA”, que pode ser entendido como uma Recuperação Extrajudicial, onde as negociações de dívidas podem ser feitas fora de juízo. No entanto, da mesma forma do procedimento mais rígido, há perda de pontos no campeonato em disputa. Desde 1983 diversos clubes ingleses como Queens Park Rangers em 2001, Leicester City em 2002, Leeds United em 2007, Southampton em 2009 e Wigan em 2020 optaram pelos procedimentos de recuperação que foram essenciais para a continuação de suas atividades. Um caso de sucesso é o Leicester City, por exemplo, que após restruturação e criação de ambiente favorável para investimentos, mesmo com orçamento menor que outras equipes inglesas, foi campeão inglês da temporada 2015-16. 59 6. CONCLUSÃO Diante de toda situação exposta, com exemplos internacionais de sucesso da concessão da Recuperação Judicial para agremiações que exploram o futebol profissional, fica claro que pelo tipo de atividade econômica explorada pelos clubes e por sua importância na economia, cultura e história do nosso país, é necessária a pacificação do reconhecimento da legitimidade de clubes – independente do roupamento jurídico estruturado – a terem acesso à Recuperação Judicial e Extrajudicial, nos termos da Lei nº 11.101, de 2005. Entretanto, que fique claro, que a oportunidade de acesso ao benefício da Recuperação Judicial não deve ser entendida como uma mera salvação aos clubes, mas como um meio de reestruturação e profissionalização da gestão esportiva. Independente do modelo societário adotado, associativo ou empresarial, o que realmente fará diferença é a gestão. Por este motivo, a simples transformação do modelo associativo para o clube-empresa sem um efetivo plano de transição não surtirá efeito. O processo de mudança é lento e exige sacrifícios, como corte de gastos, estruturação de políticas de austeridade econômica, fortalecimento de mecanismos de transparência e compliance, entre outras coisas. Levando em consideração todo o histórico citado na introdução deste trabalho, que discorre sobre a evolução do futebol no Brasil e sua legislação, não basta mudarem o modelo de gestão. Faz-se necessário o entendimento de tudo que envolve a indústria do futebol – as pessoas, as entidades, o marketing, a gestão, o entretenimento – para que ocorra uma revolução no modo como isto é tratado. O futebol é uma atividade econômica importante para o Brasil e deve ter o tratamento profissional adequado ao seu tamanho e relevância. Apenas quando o futebol tiver seu espaço como atividade econômica reconhecido, haverá um ambiente favorável que inspire a confiança para novos investidores, como ocorre na Europa. Entretanto, não se deve desprezar a história e vale levar em conta que os clubes – alguns centenários – foram fundados a partir de um modelo associativo porque este era o modelo adequado à época em que iniciaram suas atividades. Até o momento, estes clubes permanecem estruturados da mesma forma porque todas as inovações legislativas não foram eficientes e razoáveis para uma transição de modelo literalmente empresarial. Diante deste cenário, o primeiro passo rumo à transformação e profissionalização da gestão do futebol é legitimar os clubes, mesmo como associações sem fins lucrativos, a atuar como se sociedade empresária fossem, tendo a Recuperação Judicial como alternativa para sua nova organização financeira. Afinal, os clubes podem ser associações sem fins lucrativos, mas não associações sem fins econômicos. 60 REFERÊNCIAS AUGUSTO, C. Carf reconhece isenção tributária de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins para clubes de futebol. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-jun-05/direto-carf-carf- reconhece-isencao-tributaria-clubes-futebol. Acesso em: 13 maio. 2021. AYOUB, L. R.; CAVALLI, C. M. A construção jurisprudencial da recuperação judicial de empresas. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. AZZOLIN, J. L. Análise das demonstrações contábeis. Curitiba: Editora Iesde Brasil, 2012. BERGER, R; TOZZINI, S. A finalidade das associações no novo Código Civil. Disponível em: . Acesso em: 5 maio. 2021. BEZERRA FILHO, J. E. Orçamento aplicado ao setor público: abordagem simples e objetiva. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013 BOBBIO, N. Teoria do Ordenamento Jurídico. 6. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1995. BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012. BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983. CAMPINHO, S. Falência e recuperação de empresas: o novo regime de insolvência empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. CAPELO, R. Com questionáveis descontos e prazos para pagar dívidas, o futebol espanhol se salvou da falência via recuperação judicial. Disponível em: . Acesso em: 3 maio. 2021. CARNIO COSTA, D. NASSER DE MELO, A.C. Comentários a lei de recuperação de empresas e falência: lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. Curitiba: Juruá, 2021. CARVALHO, C. A., GONÇALVES, J. C. S., & ALCÂNTARA, B. C. S. (2005). Transformações no contexto do futebol brasileiro: O estado como agente de mudança. GESTÃO.Org - Revista Eletrônica de Gestão Organizacional, 3(1). CEREZETTI, S. C. N. A Recuperação Judicial de Sociedade por Ações: o princípio da preservação da empresa na Lei de Recuperação e Falência. São Paulo: Malheiros, 2012. COELHO, F. U. Comentários à Lei de Falência e de Recuperação de Empresas. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. COELHO, F. U. Princípios do direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2012. 61 DIAS, L. A. R. Financiamento na Recuperação Judicial e na Falência. São Paulo: Quartier Latin, 2014. EIZIRIK, N. Interpretação dos Arts. 60 e 145 da Lei de Recuperação de Empresas e Falência. In: VON ADAMEK, M. V. (coord.). Temas de Direito Societário e Empresarial Contemporâneos. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 637-644. FILHO, A.M. Futebol brasileiro e seu arcabouço jurídico - Migalhas. Disponível em: . Acesso em: 28 abril. 2021. FRANCO, V. H. M.; SZTAJN, R. Falência e Recuperação da empresa em crise: comparação com as posições do direito europeu. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. GRAFIETTI, C. Análise econômica-financeira dos clubes brasileiros de futebol: demonstrações financeiras de 2019. 11. ed. São Paulo: Itaú BBA, 2020. Disponível em https://static.poder360.com.br/2020/07/Analise-dos-Clubes-Brasileiros-de-Futebol-2020- ItauBBA.pdf. Acesso em 06 maio. 2021. GRAFIETTI, C. Clube do Bilhão: o que fazer para evitar que seu clube faça parte. InfoMoney. Disponível em: . Acesso em: 3 maio. 2021 HELAL, R. Passes e impasses: futebol e cultura de massa no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1997. HIGÍDIO, J. Pedidos de recuperação judicial não param de crescer. Disponível em: . Acesso em: 05 maio. 2021 HIRATA, E. El Club de los 13: una representación incompleta de la modernización del fútbol brasileño (1980-2012). EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires - Ano 18 - Nº 181 - Junho de 2013. LLOPIS, M. R; BLANCO, F.P. ¿Por qué superan los concursos de acreedoreslos clubes de fútbol professional españoles? Madrid: Universia Business Review. Cuarto Trimestre. 2015. MARCONDES, R. M. Manual de tributação do esporte. São Paulo: QuartierLatin, 2020. MONTEIRO, W. B. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1991, 30ª ed., v. I. MOTTA, L. O mito do clube-empresa. Belo Horizonte: Sportto. 2020. PUGLIESI, A. V. Direito Falimentar e preservação da empresa. São Paulo: Quartier Latin, 2013. RODRIGUES, N. A pátria de chuteiras. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013. 62 RAMUNNO, P.A.L. DUARTE, G. M. Recuperação Judicial do Botafogo de Futebol e Regatas, por que não? Disponível em: . Acesso em: 1 maio. 2021. SALOMÃO, L. F.; SANTOS, P. P. Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência: teoria e prática. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2017. SCALZILLI, J. P.; SPINELLI, L. F.; TELLECHEA, R. Recuperação de empresas e falência: teoria e prática na Lei 11.101/2005. 3. ed. São Paulo: Almedina, 2018. SOUZA, J; ALMEIDA, B; MARCHI JÚNIOR, W. Por uma reconstrução teórica do futebol a partir do referencial sociológico de Pierre Bourdieu. Rev. Bras. Educ. Fís. Esporte, (São Paulo) 2014 Abr-Jun; 28(2). P. 221-32. STJ. Recurso Especial: REsp 1.398.438 - SC (2013/0269598-4). Relatora: Ministra Nancy Andrighi. DJ. 11/04/2017. JusBrasil. 2017. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/860527790/recurso-especial-resp-1398438-sc-2013- 0269598-4. Acesso em 05. maio. 2021. TEIXEIRA, P. F.; BRAGA FILHO, V. M. Recuperação judicial, extrajudicial e falência de associações civis desportivas. Revista dos Tribunais: RT, São Paulo, v. 107, n. 996, p. 393- 441, out. 2018. VALENTE, R.; SERAFIM, M. C. Gestão Esportiva: Novos Rumos para o Futebol Brasileiro. RAE-Revista de Administração de Empresas, v. 46, n. 3, jul-set, p.131-136, 2006. Disponível em . Acesso em 05 maio. 2021.