UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE ADEMIR RIBEIRO Álvaro Reis – Pastor, Pregador e Polemista: Uma breve análise sobre seu Discurso São Paulo 2006 ADEMIR RIBEIRO Álvaro Reis – Pastor, Pregador e Polemista: Uma breve análise sobre seu Discurso Dissertação apresentada à Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Religião, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Ciências da Religião. Orientadora: Profª. Drª. Márcia Serra Ribeiro Viana São Paulo 2006 ADEMIR RIBEIRO Álvaro Reis – Pastor, Pregador e Polemista: Uma breve análise sobre seu Discurso Dissertação apresentada à Coordenação do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Religião, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ciências da Religião. Aprovado em: / / 2006 BANCA EXAMINADORA Profª. Drª. Márcia Serra Ribeiro Viana Universidade Presbiteriana Mackenzie Prof. Dr. Ronaldo de Paula Cavalcante Universidade Presbiteriana Mackenzie ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Jarbas Vargas Nascimento Pontifícia Universidade Católica de São Paulo À minha esposa Eliane, meus filhos Adriana, Silvana, Raquel e Ademir, pela paciência, apoio e compreensão que demonstraram, entendendo os momentos difíceis em que não pude lhes dar atenção. AGRADECIMENTOS A Deus, fonte de toda sabedoria, pela força e pela coragem que nos concedeu, permanecendo ao nosso lado em todo o percurso dessa caminhada. À minha querida esposa e filhos, pela compreensão, oração, apoio e carinho a mim dedicados durante essa caminhada. À minha mãe, Lydia de Jesus Ribeiro que de alguma maneira esteve me apoiando, principalmente com suas orações. À Universidade Presbiteriana Mackenzie, por nos oferecer esse curso de Mestrado. Pela bolsa oferecida, sem a qual não seria possível esta realização. À Profª. Drª. Márcia Serra Ribeiro Viana, por ter sido minha orientadora, pela dedicação e empenho na construção desta Dissertação e por tudo que me ensinou. Aos Profs. Dr. Antonio Gouvêa Mendonça, Dr. Jarbas Vargas Nascimento membros da Banca de qualificação que, com respeito e profissionalismo, teceram comentários e sugestões, auxiliando-me na finalização desta qualificação. Ao meu irmão Gilberto, que sempre me incentivou, principalmente com apoio financeiro, nesta caminhada. À Igreja Presbiteriana de Eldorado, principalmente o seu Conselho, pela compreensão e apoio que me deram durante o período dessa caminhada. RESUMO Este trabalho tem como objetivo fazer uma breve análise do Discurso polêmico, de parte de uma das obras de Álvaro Reis, intitulada, As Origens Caldaicas da Bíblia, obra originária de um debate polêmico travado com José de Campos Novaes, erudito da época. O objetivo é analisar o primeiro capítulo que trata da autenticidade dos cinco primeiros livros da Bíblia, conhecidos como Pentateuco. Como esta análise tem a Bíblia como objeto de base do discurso e seu contexto ligado ao Protestantismo, para atingir o objetivo foi necessário construir um capítulo sobre como e quando o Protestantismo foi inserido no País, e em que contexto cultural, político e religioso a Igreja Presbiteriana se estabeleceu no Brasil. E também se fez necessário um capítulo sobre a vida de Álvaro Reis, foi feito uma pesquisa de como exerceu sua função de pastor e pregador da Igreja Presbiteriana do Brasil, e por meio de estudo e pesquisa em duas de suas obras, uma citada acima e a outra denominada Espiritismo, resultado de seus discursos polêmicos, verificou-se como desenvolveu sua função de polemista e como realizava suas refutações. Palavras-Chave: Bíblia. Pentateuco. Análise de Discurso. Igreja Presbiteriana. Álvaro Reis. ABSTRACT This dissertation as its objective a short analysis of the polemic discourse of Alvaro Reis, as seen in part of one of his works, The Caldaic Origins of Bible. This text was initially written as a polemic debate with José Campos Novaes, a scholar of the times. We mean to analyze the first chapter, dealing with authenticity of the first five chapter of the Bible known as Pentateuch. Since our analyses has the Bible and its relation with the protestant context, as base of the discourse, we discuss the coming of the Protestants to the country, its cultural, political and religious context, as far as it is a par of Alvaro Reis’s life. The research included his functions as minister and preacher of Brazilian Presbyterian Church. Through the readings of the work mentioned above, and one of his other words, The Spiritism, both part of his polemic discourses, we found the means of his function as a polemist and his refutations. Keywords: Bible. Pentateuch. Analysis of Discourse. Presbyterian Church. Alvaro Reis. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................8 1 FUNDAÇÃO DA IGREJA PRESBITERIANA NO BRASIL....................................11 1.1 Inserção do protestantismo no Brasil .............................................................11 1.2 Contexto da Igreja Presbiteriana do Brasil .....................................................21 2 ÁLVARO REIS: PASTOR, PREGADOR E POLEMISTA ......................................32 2.1 Álvaro Reis: Pastor ...........................................................................................32 2.2 Álvaro Reis: Pregador.......................................................................................40 2.3 Álvaro Reis: Polemista......................................................................................46 3 ANÁLISE DO DISCURSO DE ÁLVARO REIS ......................................................73 3.1 Autenticidade do Pentateuco ...........................................................................73 CONCLUSÃO ...........................................................................................................87 REFERÊNCIAS.........................................................................................................90 ANEXOS ...................................................................................................................96 8 INTRODUÇÃO Este trabalho tem como proposta analisar brevemente parte do discurso que Álvaro Reis, pastor presbiteriano, pronunciou em 1892, em debate polêmico com o Dr. José de Campos Novaes, advogado. Esse discurso que deu origem a um dos livros de Álvaro Reis, com o título: As Origens Caldaicas da Bíblia. Tomar-se-á como base para a análise, um capítulo deste livro, cujo título é: Autenticidade do Pentateuco. Para o seu desenvolvimento o trabalho foi dividido em três capítulos. No primeiro tratar-se-á da fundação da Igreja Presbiteriana no Brasil. Ter-se-á, como teórico, Boanerges Ribeiro, na análise da fundação e Inserção do Protestantismo no Brasil e quanto ao contexto no qual isto ocorreu. Primeiramente relatar-se-á como aconteceu a inserção do protestantismo no Brasil. Depois de duas tentativas frustradas, uma em 1555 por intemédio dos franceses e outra em 1630, pelos holandeses. A análise que Boanerges Ribeiro faz do século XIX, período em que o Protestantismo chegou ao Brasil, é de fundamental importância para este trabalho, tendo em vista a abordagem que ele faz dos aspectos da cultura brasileira deste período, possibilitaram, e facilitaram, a aceitação do Presbiterianismo. “[...] não apenas a Igreja Católica, mas todos os sistemas sociais estavam comprometidos na situação cultural propícia à aceitação no País, das Denominações Protestantes”. (RIBEIRO, 1973, p. 11-12) No início do século XIX o Protestantismo era inexistente no Brasil. O seu estabelecimento só aconteceu definitivamente em 1859. Por meio da junta de missões presbiterianas dos Estados Unidos, que enviou o pastor Ashbel Green Simonton abrindo, assim, as portas, para outras denominações aqui se estabelecerem. Em seguida relatar-se-á o contexto em 9 que se encontrava a Igreja Presbiteriana no Brasil, neste período, onde os movimentos para mudanças internas eram intensos. O movimento político era muito forte, pois o País se encontrava às portas da transição do Império para República. Embora os protestantes em geral tivessem liberdade para exercer sua religião, por força da lei do Império, eles sofriam perseguições em vários lugares por líderes e adeptos da Igreja Católica Romana. Segundo Ribeiro: “a violência contra os protestantes, não alcançou grandes proporções, por causa da liberdade garantida pela lei da República”. (RIBEIRO, 1991, p. 23). Conforme relata Ribeiro: [...] não avassalou o País porque a Constituição Republicana oferecia garantias de liberdade de culto, muitas vezes as autoridades mantiverem essas garantias: por outro lado a violência e a intolerância contra a minoria religiosa nem sempre recebiam adesão de grande parte das populações [...] há indícios de uma conspiração anti-protestantes. “[...] O País não se convulsionou numa Contra-Reforma unânime; casos locais surgem em vários pontos do território, e com insistência, e se repetem”. (RIBEIRO, 1991, p. 23). No segundo capítulo, discorrer-se-á sobre a vida de Álvaro Reis como pastor, especialmente, no período em que pastoreou a Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro, durante 28 anos. Também como pregador e conferencista, qualidade que o fez conhecido em todo o Brasil e no exterior. E, como polemista, relatar-se-á seus discursos de refutação: As Origens Caldaicas da Bíblia, pelo qual refutou os argumentos do Dr. José de Campos Novaes, no qual negava a autenticidade da Bíblia; o outro sobre o Espiritismo, onde travou polêmica com o Dr. Augusto José da Silva, refutando sua argumentação de negação da divindade de Jesus Cristo e do valor de sua morte na cruz. No terceiro far-se-á uma breve análise do discurso de parte do texto do seu livro, As Origens Caldaicas da Bíblia. Neste capítulo, buscar-se-á fundamentação 10 teórica em Análise de Discurso, Eni Orlandi Puccinelli. Utilizar-se-á do pressuposto teórico da ideologia que se expressa no discurso. Analisar-se-á no capítulo: Autenticidade do Pentateuco, com o objetivo de demonstrar como desenvolve seu discurso por meio da refutação. Tentar-se-á mostrar que sua argumentação está firmada em bases sólidas, como documentos arqueológicos e escritos bíblico. 11 1 FUNDAÇÃO DA IGREJA PRESBITERIANA NO BRASIL 1.1 Inserção do protestantismo no Brasil A primeira tentativa de implantação do protestantismo no Brasil foi no final de 1555. Um grupo de franceses liderados por Nicolas Durand de Villegagnon instalou- se em uma das ilhas da Baía da Guanabara, denominada França Antártica, Rio de Janeiro. Um ano e meio mais tarde, chegou aqui um grupo de colonos e pastores reformados enviados pelo próprio João Calvino, em resposta a um pedido de Nicolas Durand de Villegagnon, no dia 10 de março de 1557, uma quarta-feira, e realizaram o primeiro culto protestante do Brasil, ministrado pelo pastor Pierre Richier. A mensagem foi baseada no Salmo 27:4. Foi cantado o Salmo 5. Conforme Lery, (1961, p. 80): Fez a primeira prédica no Forte de Coligny, na América. Durante a cerimônia não cessou Villegagnon de juntar as mãos, erguer os olhos para o céu, dar altos suspiros e fazer outros gestos que a todos nós pareciam dignos de admiração. Eventualmente, surgiram discordâncias teológicas entre Villegagnon e os calvinistas. Cinco deles foram presos e forçados a escrever uma declaração de suas convicções. O resultado foi à Confissão de Fé da Guanabara (LERY, 1961, p. 80). Em razão desta declaração, três dos calvinistas foram executados e outro só foi poupado por ser o único alfaiate da colônia. O quinto autor da confissão de fé, Jacques le Baleur conseguiu fugir, mas foi preso e mais tarde enforcado. Entre os que conseguiram retornar para a França estava o sapateiro Jean de Léry, que mais tarde tornou-se pastor e escreveu a célebre obra Viagem à Terra do Brasil (1578). 12 A outra tentativa de introdução do protestantismo no Brasil ocorreu no século XVII por meio dos holandeses. No dia 15 de fevereiro de 1630, os holandeses dominam o Estado de Pernambuco, tomam a cidade de Olinda, “consideravam a invasão como parte de uma guerra justa contra a Espanha, que a este tempo submetia politicamente tanto Holanda como Portugal” (SCHALRWIJR, 1989, p. 60). A Holanda ocupou o nordeste brasileiro por 24 anos (1630-1654). O mais famoso governante do Brasil holandês foi o Conde João Maurício de Nassau-Siegen, que aqui esteve por apenas sete anos (1637-1644). Embora os residentes católicos e judeus tenham gozado de tolerância religiosa, a igreja oficial da colônia era a Igreja Reformada da Holanda, que realizou grande obra missionária. Ao longo dos anos foram criadas 22 igrejas e congregações, dois presbitérios (Pernambuco e Paraíba) e até mesmo um sínodo, o Sínodo do Brasil (1642 -1646). Além da assistência aos colonos europeus, a igreja reformada fez trabalho missionário com os indígenas. Além da pregação, se preocuparam em formular um catecismo que facilitasse o ensino aos os índios, pois a língua deles era o tupy, e o português, “[...]a preparação de um catecismo trilingüe (tupy, português, holandês)” (SCHALRWIJR, 1989, p. 317). Quando os holandeses retornaram para Holanda, levaram alguns índios, “Seis jovens índios foram enviados para a Holanda, onde aprenderam a língua, convertidos ao calvinismo, auxiliaram na evangelização dos índios” (SCHALRWIJR, 1989, p. 246). Outros projetos incluíam a tradução das Escrituras e a ordenação de pastores indígenas, o que não chegou a efetivar-se. Com a expulsão dos holandeses, em 1654, “restabelece-se uma teocracia católico- romana, que não permitia liberdade religiosa” (SCHALRWIJR, 1989, p. 462), por um século e meio desapareceram os vestígios do protestantismo no Brasil. 13 Em 1810, o Tratado de Aliança, Amizade, Comércio e Navegação, firmado com a Inglaterra, abriu a primeira brecha na muralha levantada em torno do sistema religioso, até então impenetrável ao protestantismo. Permitia a prática, de outros cultos, a cidadãos britânicos não católicos-romanos dentro de certas limitações e restrições. O Artigo XII desse tratado rezava que Portugal concederia aos súditos britânicos essa medida de liberdade religiosa dentro de suas igrejas e capelas privadas, desde que não possuíssem forma exterior de templo, caracterizada pela torre e o sinos. Além disso, estipulava que não deveria existir nenhuma animosidade contra a religião Católica, que deveria ser respeitada, sem qualquer tentativa de fazer prosélitos. (RIBEIRO, 1973, p. 17). Ainda Segundo Ribeiro (1973, p.17): Artigo 12 do tratado de Comercio e Navegação – que os vassalos de S.M. Britânica residentes nos territórios e domínios portugueses não seriam perturbados, inquietados, perseguidos ou molestados por causa da sua religião, e teriam perfeita liberdade de consciência , bem como licença para assistirem e celebrarem o serviço divino em honra do Todo-Poderoso Deus, quer dentro de suas casas particulares, quer nas suas particulares igrejas ou capelas, sob as únicas condições de que estas externamente se assemelhassem a casas de habitação, e que também que o uso dos sinos lhes não fossem permitido [...] e quaisquer outros estrangeiros de comunhão diferente da religião dominante [...] não seriam perseguidos ou inquietados [...] sendo vedado, entretanto, pregar ou declarar publicamente contra a religião Católica ou procurar fazer prosélitos ou conversões. Os ingleses obtiveram permissão, ainda, para enterrar os seus mortos em cemitérios especiais, podendo administrá-los, e celebrar os funerais segundo suas crenças. Assim, o país recebeu muitos ingleses que vieram para fazer negócios, desenvolver suas profissões, buscar riquezas. Após o término da guerra entre Inglaterra e Estados Unidos, vieram para o Brasil inúmeros norte-americanos. Muitos destes eram protestantes e trouxeram suas Bíblias e livros. Alguns desses negociantes voltaram para seus países de origem, publicaram apaixonados relatórios sobre as experiências aqui vividas. 14 Não demorou muito para que se organizassem grupos ou colônias de imigrantes. Por volta de 1824 a mesma tolerância concedida à Igreja Anglicana Britânica pelo Tratado de Comércio de 1810 era estendida aos luteranos da Alemanha e da Suíça e a outros grupos evangélicos. Naturalmente, pesavam sobre estes as mesmas limitações e restrições anteriores. Essas restrições legais aliadas à barreira da língua impediam quaisquer planos para o desenvolvimento de esforços missionários entre os brasileiros. Entre os anos de 1835 e 1841 a Igreja Metodista Episcopal dos Estados Unidos enviou missionários para ministrar aos negociantes e marinheiros de fala inglesa no porto do Rio de Janeiro. Eles iniciaram um programa de distribuição de Bíblias, mas enfermidades, mortes e dificuldades financeiras nos Estados Unidos fizeram com que o trabalho fosse interrompido. As Bíblias estavam sendo mandadas para o Brasil pela Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira e pela Sociedade Bíblica Americana. Eram, em geral, remetidas juntamente com a bagagem de homens de negócios que simplesmente deixavam as caixas abertas nas docas à disposição dos interessados. A distribuição de Bíblias pelas Sociedades Bíblicas, por intermédio de seus colportores, contribuiu de forma decisiva para a inserção e expansão do protestantismo brasileiro e especialmente o Presbiteriano. Simonton na reunião do Presbitério do Rio de Janeiro em 15 de Julho de 1867, descrevendo os meios necessários e próprios para plantar o reino de Jesus Cristo no Brasil, destacava entre outras coisas a distribuição da Bíblia, de livros e folhetos religiosos. (DIÁRIO, 1982, p. 210). Desse modo, pode-se dar notícias de Jesus a muitos que não querem assistir ao culto público. Nesta época a imprensa é a arma poderosa para o bem, ou para o mal. Devemos trabalhar para que se faça e se propague em toda a parte uma literatura religiosa em que se possa beber a pura verdade ensinada na Bíblia. Há diversos crentes ocupados neste serviço. São merecedores da nossa estima como cooperadores. Devemos animá-los em 15 seus trabalhos com nossos conselhos e orações constantes. Porém, todo crente deve ser induzido a fazer alguma coisa neste sentido. O Cristão evangélico que do princípio do ano até o fim não espalha nenhum livro ou folheto nem folha, não têm convicção do seu dever. O envio de bíblias para serem distribuídas no Brasil começou a partir do século XIX, após a fundação das Sociedades Bíblicas. Elben Cézar(2000, p. 69) afirma: A introdução das Sagradas Escrituras no Brasil começou discretamente em 1814. Naqueles primórdios, exemplares de Novos Testamentos e Bíblias completas eram distribuídas a bordo dos navios que deixavam Lisboa e portos ingleses com destino ao Brasil [...]. Os capelães britânicos radicados nos mais importantes portos do país também participavam desse ministério. O primeiro colportor de bíblias para a América Latina que se tem notícia foi o pastor batista escocês James Thomson, agente das Sociedades Bíblicas Britânica e Americana. Elben Cezar, (2000) diz que Thomson, em 1820 solicitou a remessa de 100 Bíblias e 200 Novos Testamentos para distribuição no Brasil. Daniel Parish Kidder foi o primeiro missionário metodista americano correspondente da Sociedade Bíblica Americana a se fixar no Brasil. Em 1839, na província de São Paulo, propôs, ao governo, o uso da Bíblia nas escolas primárias. Kidder não se limitou somente às cidades, onde certamente o potencial de leitores era mais significativo, percorreu todo País entrando pelas zonas rurais. “viajou extensamente pelo País, observando-o e providenciando a distribuição de Bíblias” (RIBEIRO, 1991, p. 19). Em 1856 a sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira abriu um depósito permanente para armazenar as Escrituras Sagradas no Rio de Janeiro, sob os cuidados de Richard Corfiel. A Sociedade Bíblica Americana abriu a sua agência no Brasil no ano de 1876. 16 Sobre a história das Sociedades Bíblicas, diz Ferreira, (1960, p. 210): Um dos acontecimentos de maior significação na história do Evangelho Brasileiro no ano de 1942, foi a unificação do trabalho das Sociedades Bíblicas do Brasil, a Americana e a Britânica, sob o nome de Sociedades Unidas. A tendência era de estímulo à formação de Sociedades Bíblicas nacionais. Dentro de poucos anos surgiu a Brasileira. Instalada a 12 de junho de 1948, no templo da Primeira Igreja Batista do Rio de Janeiro, a Sociedade Bíblica do Brasil tem tido progresso rápido. Neste decênio (1948-1958) distribuiu 1.237.732 Bíblias; 832.326 Novos Testamentos; 15.081.034 de Porções Bíblicas. A Igreja Presbiteriana tem parte na história da Sociedade Bíblica Brasileira, quer através de contribuição de seus sócios, como através do consumo de suas Bíblias; e mesmo através da colaboração de seus líderes. Diz Émile Leonard (1963), que os que mais adquiriram Bíblias, não com o propósito de simples curiosidade e esnobismo, na segunda metade do século XIX, foram os educadores: “[...] viam, nessas distribuições, um meio de obter gratuitamente livros de leitura para seus alunos.” (LEONARD,1963, p. 43-44) No mesmo lugar, Émile Leonard, descreve a recepção de Bíblias até por parte de padres educadores: “Um padre, que possuía uma escola primária na Vila Paranaguá, pediu-lhe 40 ou 50 exemplares; foram pedidos também 20 para a Escola Normal do Rio; 50 para de Niterói; 18 para Ubatuba”. (LEONARD, 1963, p. 44) Segundo dados fornecidos por Émile Leonard até 1854, as duas sociedades Bíblicas haviam distribuído apenas 4.000 exemplares das Escrituras. Nos cinco anos seguintes distribuíram 20.000”. ( LEONARD, 1963, p. 49) Foram essas Bíblias – a principal literatura nas mãos dos colportores no Brasil no final do século XIX e início do XX que prepararam o ambiente para início e expansão do protestantismo. Boanerges Ribeiro em seu livro: Igreja Presbiteriana do Brasil, Da Autonomia ao Cisma, relata fatos históricos que dão fundamento à tese da Bíblia como elemento de aproximação do Católico ao Protestantismo, no momento histórico da 17 inserção do protestantismo brasileiro. Eis a narrativa de 1890: (RIBEIRO, 1987, p. 12-13): Dois ou três anos atrás, um membro de nossa igreja em Lençóis, analfabeto, foi morar nesse rico vale, e contou o Evangelho aos vizinhos igualmente analfabetos. Impressionaram-se e quiseram saber mais. Foram- lhes enviados Novos Testamentos, Evangelhos e Catecismos. Aplicaram- se a alfabetizar, com a ajuda de uns poucos semi-analfabetos de seu grupo. Mais tarde o Rev. G.W. Chamberlain e o Rev. D Maclaren, cada um por sua vez, estiveram lá pregando por alguns dias. [...] queriam professar a fé e organizar-se em igreja. [...] Após necessária instrução, 47 adultos apresentaram à profissão de fé. (O número, pouco depois, cresceu para 54). Outros 8 ou 10 foram aconselhados a instrui-se melhor. A casa não cabia, fez-se um galpão coberto de ramos; no primeiro dia batizaram-se 54 adultos, no segundo, 68 crianças. Fazendo trabalho de pregador itinerante, a exemplo do Rev. José Manoel da Conceição, Rev. Chamberlain relata os primórdios da inserção do presbiterianismo em Botucatu, desta forma citado por Ribeiro na mesma obra acima (RIBEIRO, 1987, p. 21-23): Caiu uma Bíblia nas mãos de um velho; por causa dessa Bíblia o velho fez um voto: Se Deus mandasse alguém a Botucatu explicar-lhe aquele livro, ele construiria uma casa, onde se ensinaria o Livro. Pois, pela Divina Providência, passaria eu por Botucatu, dois anos mais tarde, a caminho de Lençóis. [...] Poucos meses depois, mandava avisar que a casa estava pronta. Essa foi uma casa construída para a leitura e pregação da Bíblia. Na inauguração o Rev. Chamberlain pregou aí de oito a dez noites. Aquela Bíblia foi achada pelo Sr. Domingos Soares de Barros e que tinha sido usada na inauguração da Loja Maçônica de Botucatu, quando veio de encomenda do Rio de Janeiro juntamente com outros objetos para os juramentos. Boanerges Ribeiro, citando relato de Chamberlain, fala da conversão daquele que haveria de ser futuro pastor presbiteriano, na cidade de Botucatu, o Rev. João Ribeiro de Carvalho Braga. “[...] O empregado dessa venda era um portuguesinho, um João Ribeiro de Carvalho Braga; leu a Bíblia e se fez Presbiteriano” (RIBEIRO, 18 1987, p. 24). Sua conversão também se deu por meio de um folheto protestante e uma Bíblia sem capa adquirida no meio da compra de jornais velhos, no comércio de seu patrão, quando era empregado na cidade do Rio de Janeiro. Ainda Boanerges Ribeiro cita a narrativa do começo do protestantismo presbiteriano, na cidade Santa Luzia, Goiás, tendo como instrumento uma Bíblia, (RIBEIRO, 1987, p. 24-25): Em 1884 o Rev. Boyle, um de nossos missionários, penetrou pela primeira vez em Goiás. Foi recebido na cidadezinha de Santa Luzia por um pequeno grupo de crentes, todos da mesma família, que anos antes tinham se separado da Igreja de Roma e agora tratavam de seguir os preceitos bíblicos. Boyle verificou que eles haviam se convertido pela leitura da Bíblia comprada a mais de 180 quilômetros de Santa Luzia, em Paracatu, noutra Província, por um parente; esse tendo encontrado paz para sua alma após ler a Bíblia, mandou o precioso volume de presente aos pais, irmãos e irmãs e todos abraçaram a verdade. O movimento evangélico brasileiro se alastra no seio das populações, desde as adesões informais recebidas por José Manoel da Conceição, até as congregações reformadas que se instituíram antes que chegasse ao local um pregador protestante, a exemplo de Paracatu, de Santa Luzia de Goiás, de Ubatuba; entre outras cidades, sendo anunciados quilômetros adiante a parentes e amigos, por leigos convertidos. Como ilustração da inserção do protestantismo também no Nordeste do país, com a relevância da Bíblia como elemento de aproximação do católico ao protestantismo presbiteriano, tem-se a citação de Ribeiro em seu livro Igreja Evangélica e República Brasileira (RIBEIRO, 1991, p.155): Mas havia no Ceará, latente, a necessidade da reforma da religião. Ali se repetiu o que ocorria em quase todo o Brasil: igrejas protestantes surgiam espontaneamente, ou quase, antes que chegasse o pastor, pela leitura da Bíblia e ou pelas explicações doutrinárias de “leigos” [...] 19 Também Julio Andrade Ferreira corrobora de que as Sociedades Bíblicas, com a produção de Bíblias, tiveram papel relevante na inserção do protestantismo no Brasil e em outras partes do mundo, (FERREIRA, 1960, p.10): O fato é que sem as Sociedades Bíblicas a história de cada igreja evangélica (e a nossa, portanto) seria diferente. Talvez nem houvesse. Os grupos que se reuniram na Inglaterra, em 1804 e na América do Norte, em 1816, e se empenharam na grande tarefa de dar a Bíblia ao Mundo, merecem a nossa gratidão. Desde o princípio de nossa evangelização presbiteriana, e antes dela, a Sociedade Bíblica Britânica e a Sociedade Bíblica Americana é que nos possibilitaram conhecer a Palavra. Em 1827, por iniciativa do cônsul da Prússia, foi fundada no Rio de Janeiro a Comunidade Protestante Alemã-Francesa, que congregava luteranos e calvinistas. Foram organizadas algumas Igrejas Luteranas: Em 1851, em Joinvile, no Estado de Santa Catarina. Em 1856 em Porto Alegre, em 1857 em Blumenau, Santa Catarina e, em 1860, em Curitiba. No Rio de Janeiro, chamada Corte,“ o Cônsul da Prússia iniciou reuniões de Culto numa sala alugada na rua Mata Cavalos “(HAHN,1989, p. 86). Durante várias décadas, o calvinismo ficou restrito às comunidades imigrantes, sem atingir os brasileiros. Os poucos pastores reformados ou presbiterianos que por aqui passaram limitaram suas atividades religiosas aos estrangeiros. Em 1851 um pastor presbiteriano dos Estados Unidos, James Cooley Fletcher, veio trabalhar no Rio de Janeiro com a Sociedade Americana dos Amigos dos Mari- nheiros, com a Sociedade Bíblica Americana e, mais tarde, com a Embaixada Americana. deu assistência religiosa a marinheiros e imigrantes europeus, procurou aproximar o Brasil e os Estados Unidos nas áreas diplomática, comercial e cultural. Era homem de refinada cultura, tendo estudado tanto nos Estados Unidos como na Europa. Seu relacionamento com gente dos círculos sociais e políticos em muito 20 contribuiu para a abertura de portas ao culto evangélico, entretanto, a obra missionária entre os brasileiros de fala portuguesa só começou em 1855. Escreveu o livro O Brasil e os Brasileiros, publicado em 1857. “Em 1855; viera o médico escocês, Robert Reid Kalley, já perseguido na Ilha da Madeira, onde exercera atividade evangelística” (FERREIRA, 1992, p. 23). Foi por meio dele que ocorreu a fundação da primeira igreja de missão em solo brasileiro. Dr. Robert Reid Kalley viveu de 1809 a 1888 e sua esposa Sarah Poulton Kalley de 1825 a 1907. Natural de Monte Flórida, próxima de Glasgow, Escócia, Kalley diplomou-se em medicina e cirurgia em Glasgow. Foi para Ilha da Madeira, onde permaneceu por oito anos. Exercia a profissão de médico, e ao mesmo tempo ministrava instrução evangélica aos seus pacientes. Chegou a organizar uma igreja presbiteriana na Ilha, em 1846; a perseguição forçou-o, entretanto, a se retirar em agosto do mesmo ano. Em 10 de maio de 1855 o casal chegou à cidade do Rio de Janeiro, iniciando uma obra evangélica pioneira. No dia 19 de agosto do mesmo ano os Kalley organizaram sua primeira Escola Dominical (REILY, 1984, p. 96). Em 11 de julho de 1858, Kalley organizou a primeira igreja protestante brasileira de fala portuguesa, Igreja Fluminense. Constituída de 5 britânicos (o casal Kalley e 3 ingleses), 8 portugueses (inclusive 3 casais que também haviam fugido da Ilha da Madeira, bem como José Pereira de Souza Louro, o primeiro crente que Kalley havia batizado no Brasil) e ainda um brasileiro, Pedro Nolasco de Andrade, batizado no dia da organização da igreja. (REILY, 1984, p. 95). Cauteloso após a perseguição na Ilha da Madeira, Kalley trabalhava dentro dos limites estabelecidos pelas leis brasileiras, adotando como modelo básico de evangelização o culto doméstico, o qual, aliás, influiu profundamente na forma do culto protestante brasileiro. 21 1.2 Contexto da Igreja Presbiteriana do Brasil. Somente em 1859, através da junta de missões presbiterianas dos Estados Unidos, o protestantismo foi consolidado, abrindo assim as portas para outras denominações. O surgimento do presbiterianismo no Brasil resultou do pioneirismo e desprendimento do Rev. Ashbel Green Simonton (1833 -1867). Nascido em West Hanover, na Pensilvânia, Simonton estudou no Colégio de Nova Jersey e inicialmente pensou em ser professor ou advogado. Influenciado por um reavivamento em 1855, fez a sua profissão de fé e, pouco depois, ingressou no Seminário de Princeton. Um sermão pregado por seu professor, o famoso teólogo Charles Hodge, levou-o a incorporar o trabalho missionário no exterior. Três anos depois, candidatou-se perante a Junta de Missões da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos, citando o Brasil como campo de sua preferência. Dois meses após a sua ordenação, embarcou para o Brasil, chegando ao Rio de Janeiro em 12 de agosto de 1859, aos 26 anos de idade. No dia 31 de agosto Simonton realizou um culto a bordo do navio de nome John Adams, falando a mais de duzentos ouvintes que o aguardavam. Continuou pregando no navio, em inglês. Mostrava-se preocupado com o aprendizado da língua portuguesa. Então começou a dar aulas aos filhos do Sr. Eubank, para aprender com eles a língua da terra. (FERREIRA, 1992, p. 28-29) No dia 22 de abril de 1860 Simonton reúne uma escola dominical em casa. Dirigiu o seu primeiro culto em português. As crianças do sr Eubank estavam todas. Também Amália e Marroquinas Knaak. A Bíblia, um catecismo de história sagrada e a viagem do peregrino, de Bunyan, foram nossos livros do texto. 22 Em janeiro de 1862, recebeu os primeiros conversos, as primeiras profissões de fé, sendo fundada a Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro. No sábado, celebramos a ceia, recebi por profissão de fé a Henry E. Milford e a Cardoso Camilo de Jesus [...] foram entrando para a igreja outros elementos, a principio quase só estrangeiros: José Maria Ferreira e sua mulher Eulália Cândida [...] Robert Duncan, escocês, batizado na infância; Francisco José da Costa [...]. (FERREIRA, 1992, p. 28-29) Em 1965 é organizada em São Paulo a 1ª Igreja Presbiteriana Paulista, que juntamente com outras duas a do Rio de Janeiro e a de Brotas deram origem ao primeiro Presbitério brasileiro. [...] Em sua casa, à rua Aurora, um jovem português, empregado no comércio, ia para “confabular sobre a religião evangélica”. Não tardou a que este jovem trouxesse outro; [...] Eram, respectivamente, Antonio Trajano e Miguel Torres, futuros ministros do Evangelho, converteram-se e professaram a fé a 5 de março de 1865, [...] Esta ficou assinalado como o da organização da 1ª Igreja da capital paulista viu nascer o primeiro Presbitério brasileiro. Tomou o nome de Presbitério do Rio de Janeiro. (FERREIRA, 1992, p. 58-59) No breve período em que viveu no Brasil, Simonton, auxiliado por alguns colegas, fundou o primeiro periódico evangélico do país (Imprensa Evangélica, 1864), criou o Presbitério do Rio de Janeiro em 1865, conforme citação acima e organizou um seminário em 1867, com três alunos: Antonio Bandeira Trajano, Miguel Gonçalves Torres e Modesto Perestrelo Barros de Carvalhosa. Conforme Julio Ferreira diz: “A 14 de maio de 1867, deu-se início às aulas do Seminário, eram professores os Rvs. Simonton, Schneider e Wagner, este pastor da igreja Luterana do Rio. Eram estudantes: Carvalhosa, Trajano e Torres” (FERREIRA, 1992. p. 79- 80) . O Rev. Ashbel Simonton morreu vitimado pela febre amarela aos 34 anos, no dia 8 de dezembro de 1867. 23 Os principais colaboradores de Simonton naquele período foram seu cunhado Alexander L. Blackford, que em 1865 organizou as Igrejas de São Paulo e Brotas; Francis J. C. Schneider, que trabalhou entre os imigrantes alemães em Rio Claro, lecionou no seminário do Rio e foi missionário na Bahia; e George W. Chamberlain, grande evangelista e operoso pastor da Igreja de São Paulo. Os quatro únicos estudantes do "seminário primitivo" foram eficientes pastores: Antonio Bandeira Trajano, Miguel Gonçalves Torres, Modesto Perestrelo Barros de Carvalhosa e Antonio Pedro de Cerqueira Leite. Outras poucas igrejas organizadas no primeiro decênio foram as de Lorena, Borda da Mata (Pouso Alegre) e Sorocaba. O homem que mais contribuiu para a criação dessas e outras igrejas foi o notável Rev. José Manoel da Conceição (1822-1873), um ex-sacerdote católico- romano, que se tornou o primeiro brasileiro a ser ordenado ministro do evangelho (1865). Conceição visitou incansavelmente dezenas de vilas e cidades no interior de São Paulo, Vale do Paraíba e sul de Minas, pregando o evangelho. Simonton e seus companheiros eram todos da Igreja Presbiteriana do norte dos Estados Unidos. Em 1869 chegaram os primeiros missionários da igreja do sul: George Nash Morton e Edward Lane. Eles fixaram-se em Campinas, região onde residiam muitas famílias norte-americanas que vieram para o Brasil após a Guerra Civil em seu país (1861-1865). Em 1870, Morton e Lane fundaram a igreja de Campinas e, em 1873, o famoso, porém efêmero, Colégio Internacional. Os missionários da PCUS (Igreja Presbiteriana do Sul dos Estados Unidos da América) evangelizaram a região da Mogiana, o oeste de Minas, o Triângulo Mineiro e o sul de Goiás. O pioneiro em várias dessas regiões foi John Boyle, falecido em 1892. 24 Os obreiros1 da Igreja do Sul foram também os pioneiros presbiterianos no nordeste e norte do Brasil, de Alagoas até a Amazônia. Os principais foram John Rockwell Smith, fundador da igreja do Recife (1878); De Lacey Wardlaw, pioneiro em Fortaleza; e o Dr. George W. Butler, o "médico amado" de Pernambuco. O mais conhecido dentre os primeiros pastores brasileiros do nordeste foi o Rev. Belmiro de Araújo César, patriarca de uma grande família presbiteriana. Os missionários da Igreja do norte dos Estados Unidos, auxiliados por novos colegas, davam continuidade ao seu trabalho. Seus principais campos eram Bahia e Sergipe, onde atuou, além de Schneider e Blackford, o Rev. John Benjamin Kolb, no Rio de Janeiro, onde inaugurou seu templo em 1874, e em Nova Friburgo, onde trabalhou o Rev. John M. Kyle; no Paraná, os pioneiros foram Robert Lenington e George A. Landes, tendo atuado especialmente em São Paulo. Na capital paulista, o casal Chamberlain fundou em 1870 a Escola Americana, que mais tarde veio a ser o Mackenzie College, dirigido pelo educador Horace Manley Lane. No interior da província, destacou-se o Rev. João Fernandes Dagama, português da Ilha da Madeira. No Rio Grande do Sul, trabalhou por algum tempo o Rev. Emanuel Vanorden, um judeu holandês. Entre os novos pastores nacionais deste período estavam Eduardo Carlos Pereira, José Zacarias de Miranda, Manuel Antônio de Menezes, Delfino dos Anjos Teixeira, João Ribeiro de Carvalho Braga e Caetano Nogueira Júnior. As duas igrejas norte-americanas também enviaram ao Brasil algumas notáveis missionárias educadoras como Mary Parker Dascomb, Elmira Kuhl, Nannie Henderson e Charlotte Kemper. 1 Obreiro – Termo usado pelas igrejas que significa trabalhador, operário, usado pela igreja para designar aqueles que trabalham na igreja e para a igreja na função de divulgar a mensagem da Bíblia. 25 Em 06 setembro de 1888 foi organizado o Sínodo da Igreja Presbiteriana do Brasil, que se tornou assim autônoma, desligando-se das igrejas-mães norte- americanas. O Sínodo compunha-se de três presbitérios: Rio de Janeiro, Campinas- Oeste de Minas e Pernambuco e tinha vinte missionários, doze pastores nacionais e cerca de sessenta igrejas. O primeiro moderador foi Alexander L. Blackford. O Sínodo criou o Seminário Presbiteriano, elegeu seus dois primeiros professores e dividiu o Presbitério de Campinas e Oeste de Minas em dois: São Paulo e Minas. No dia 6 de setembro de 1888 reuniram-se no templo da Igreja Presbiteriana do Rio os presbitérios: do Rio de Janeiro; de Pernambuco; e de Campinas e Oeste de Minas, sobre a presidência do Ver. G.W. Chamberlaim [...] O Rev. Alexander L. Blackford foi eleito moderador [...]. (RIBEIRO, 1987. p. 193) Nesse período, a denominação expandiu-se, com muitos novos missionários, pastores brasileiros e igrejas locais. O seminário começou a funcionar em Nova Friburgo, no final de 1892 e, no início de 1895 transferiu-se para São Paulo, tendo à frente John Rockwell Smith. O Mackenzie College ou Colégio Protestante foi criado em 1891, sendo seu primeiro presidente o Horace Manley Lane. O Colégio Internacional foi transferido de Campinas para Lavras, e mais tarde veio a chamar-se Instituto Gammon, numa homenagem ao seu grande líder, o Rev. Samuel R. Gammon (1865-1928). A primeira escola evangélica do nordeste foi o Colégio Americano de Natal (1895), fundado por Katherine H. Porter, esposa do Rev. William C. Porter. Na mesma época, a cidade de Garanhuns começou a tornar- se um grande centro da obra presbiteriana. Além do trabalho evangelístico, foram lançadas as bases de duas importantes instituições educacionais: o Colégio Quinze de Novembro e o Seminário do Norte, hoje sediado em Recife. No final desse período, além de estar presente em todos os estados do nordeste, a Igreja Presbiteriana chegou ao Pará e ao Amazonas. 26 Os progressos desse período foram, em parte, ofuscados por uma grave crise que se abateu sobre a vida da igreja. Inicialmente, surgiu uma diferença de prioridades entre o Sínodo e a Junta de Missões de Nova York. O Sínodo queria apoio para a obra evangelística e para instalar o Seminário, ao passo que a Junta preferia dar ênfase à obra educacional, principalmente por meio do Mackenzie College. Paralelamente, surgiram desentendimentos entre o pastor da Igreja Presbiteriana de São Paulo, Rev. Eduardo Carlos Pereira, e os líderes do Mackenzie, Horace M. Lane e William A. Waddell. Com o passar do tempo, Eduardo Carlos Pereira passou a tornar-se mais radical em suas posições, perdendo o apoio até mesmo de muitos dos seus colegas brasileiros. Em 1900 foi organizada a Igreja Presbiteriana Unida de São Paulo, que resultou da fusão de duas igrejas formadas por pessoas que haviam saído da igreja de Eduardo Carlos Pereira. Na mesma época, um novo problema veio complicar ainda mais a situação: o debate acerca da maçonaria. Em março de 1902, Pereira e seus partidários começaram a divulgar a sua Plataforma, com cinco tópicos sobre as questões missionárias, educativa e maçônica. Após pouco mais de um ano de debates acalorados, a crise chegou ao seu lamentável desfecho, em 31 de julho de 1903, durante a reunião do Sínodo. Após serem derrotados em suas propostas, Eduardo Carlos Pereira e seus colegas desligaram-se do Sínodo e formaram a Igreja Presbiteriana Independente. Nós abaixo assinados, membros deste Sínodo, convencidos da incompatibilidade da maçonaria com o Evangelho, vimos pedir aos ministros e presbíteros maçons que, pela paz e pela união em Cristo, deixem a maçonaria, e que o Sínodo nos reconheça a liberdade de externar nossos pensamentos sobre o assunto. Assinados [...] (RIBEIRO, 1987, p. 421). 27 No início de agosto de 1903, os independentes organizaram o seu presbitério2, com quinze presbíteros e sete pastores: Eduardo Carlos Pereira, Caetano Nogueira Jr., Bento Ferraz, Ernesto Luiz de Oliveira, Otoniel Mota, Alfredo Borges Teixeira e Vicente Themudo Lessa. O Sínodo contava com 77 igrejas e cerca de 6500 membros; em 1907, os independentes tinham 56 igrejas e 4200 comungantes. O prédio do seminário, no bairro Higienópolis, foi ocupado sem solenidade em setembro de 1899. Os principais professores eram John R. Smith, Erasmo Braga, este a partir de 1901 e Rev. Álvaro Reis. Em fevereiro de 1907, o seminário foi transferido para Campinas, ocupando a antiga propriedade do Colégio Internacional. A primeira turma de Campinas só se formou em 1912. Entre os formandos estavam Tancredo Costa, Herculano de Gouvêa Jr., Miguel Rizzo Jr. e Paschoal Luiz Pitta. Mais tarde viriam Guilherme Kerr, Jorge T. Goulart, Galdino Moreira e José Carlos Nogueira. A Igreja Presbiteriana crescia em muitos lugares. A primeira cidade atingida no leste de Minas foi Alto Jequitibá, Manhuaçu e, no Espírito Santo, São José do Calçado. Os primeiros pastores daqueles campos foram Matatias Gomes dos Santos, Aníbal Nora, Constâncio Omero Omegna e Samuel Barbosa. No Vale do Ribeira, o evangelista Willes Roberto Banks continuava em atividade. A família Vassão daria grandes contribuições à igreja. Em 1907, o Sínodo dividiu-se em dois (Norte e Sul) e em 1910 foi organizada a Assembléia Geral da Igreja Presbiteriana do Brasil. O moderador do último sínodo e instalador da Assembléia Geral foi Modesto Carvalhosa, ordenado 40 anos antes. 2 Presbitério – Sistema Organizacional da Igreja Presbiteriana do Brasil é formado pela união de algumas Igrejas locais, no mínimo quatro, seus representantes são pastores e presbíteros. 28 A Assembléia Geral foi instalada na Igreja do Rio de Janeiro e o Rev. Álvaro Reis foi eleito seu primeiro moderador. Os conciliares visitaram a Ilha de Villegagnon para lembrar os mártires calvinistas e comemorar o quarto centenário do nascimento de Calvino. Na época, a Igreja Presbiteriana do Brasil tinha 10 mil membros comungantes, outro tanto de menores e cerca de 150 igrejas em sete presbitérios. As demais denominações tinham os seguintes números: metodistas, 6 mil membros; independentes, 5 mil; batistas, 5 mil; e episcopais, cerca de mil. Em 1911, a IPB enviou a Portugal seu primeiro missionário, Rev. João da Mota Sobrinho, que lá permaneceu até 1922. Os missionários americanos continuavam em plena atividade. Devido a divergências quanto ao lugar da educação na obra missionária, a Missão Sul da PCUS dividiu-se em duas: Missão Leste, Lavras e Missão Oeste, Campinas. William Waddell fundou uma influente escola em Ponte Nova, Bahia. Pierce, um filho de Chamberlain, trabalhou na Bahia de 1899 a 1909. A Igreja presbiteriana no Mato Grosso começou nesse período: os pioneiros foram os missionários Franklin Graham (1913) e Filipe Landes (1915). A Igreja presbiteriana desde sua fundação estava crescendo em muitos lugares. E mesmo com a liberdade de culto estabelecida pela constituição do Brasil, continuou a ser perseguida, proibiam a leitura da Bíblia dos protestantes e eram queimadas em público, sob a alegação de que não possuíam os apócrifos, por isso denominavam ser Bíblias Falsificadas O confronto entre os católicos-romanos e os protestantes eram constantes. 29 Os embates do confronto entre protestantes e católicos são destacados por Ribeiro: Os missionários, invariavelmente, entravam em qualquer polêmica, escrita ou oral, com a condição de que as posições em confronto fossem provadas pela Bíblia, somente pela Bíblia e claramente pela Bíblia. Os líderes católicos romanos brasileiros deixaram-se envolver, e com esperteza pouco produtiva, recorreram ao expediente das “Bíblias Falsificadas”, em que impugnavam as edições das Sociedades Bíblicas, porque não incluíam os Apócrifos; proibiam sua leitura e as queimavam em público [...]. O resultado era arrasador, contra o polemista católico [...]. O número de pessoas que, assim, aderiram à Reforma é imenso e de boa qualidade. Os pregadores da Reforma, pois, explicavam e expunham textos da Bíblia, e aplicavam-nos aos ouvintes. Ao enfrentarem a polêmica católica romana, faziam-no de Bíblia em punho. Os bispos, os padres e os freis tinham de defender suas posições numa sociedade cujas elites rejeitavam o ultramontanismo, a infalibilidade papal, a autoridade hierárquico-clerical. É a sociedade onde se produziu o prefácio de Ruy a “O Papa e o Concílio” (1877); dos maçons anti-clericais, com o formidável Saldanha Marinho à frente “A Igreja e o Estado” (1875); e do próprio imperador avesso a clericalismo e a frades, extintor de ordens monásticas. Apelar para a autoridade da “igreja” ou do “Papa” seria pouco útil. Restava a Bíblia como queria os protestantes. (RIBEIRO 1991, p. 197-198). O contexto em que a Igreja protestante, especialmente a Presbiteriana estava vivendo, mesmo na República, com liberdade de culto garantida pela lei, era de constante perseguição. Os líderes da Igreja Católica Romana, não conseguiram argumentos contra os pastores e missionários, que usavam somente a Bíblia para firmar suas posições. Apelavam, acusando as Bíblias dos protestantes de falsificadas, por não conterem os apócrifos, chegando a queimá-las em público, como foi visto na citação acima. O que se vai constatar de forma mais abrangente, abaixo, em citação e por Pedro Tarsier. Este contexto conduz ao objeto do estudo, a polêmica de Álvaro Reis e a análise, esta polêmica será tratada no capítulo seguinte e no posterior. Pedro Tarsier (1936) faz a mais completa resenha existente das perseguições aos evangélicos no período. Por ser um pouco extensa, far-se-á um relato parcial dessa resenha. A resenha completa está no anexo A. 30 De 1889 a 1909, o folheto anônimo Esboço Histórico-Cronológico das perseguições realizadas contra os evangélicos desde a Proclamação da República até a presente data, no Rio de Janeiro, em maio de 1909 reúne resumidamente as perseguições aos evangélicos: 1. Em 12 de março de 1890 - Na vila do Conde — Bahia, o rev. Z. Taylor, da Igreja Batista, foi atacado na casa particular, em que anunciava o Evangelho, por uma turba chefiada pelo padre do lugar, sendo o pregador e vários assistentes arremessados no rio adjacente. (Jornal da Bahia de 28 de março). 2. Setembro de 1890 - Em Mar de Espanha — Minas, o padre promoveu uma perseguição ao rev. F.R. de Carvalho, que teve a casa assaltada e foi vaiado diversas vezes. Os assaltantes tentaram arrombar a porta de sua casa. 3.O delegado de polícia Major Agostinho foi o salvaguarda do perseguido, guarnecendo a casa com soldados. 4. Novembro de 1890 - Em Palmeiras, Rio de Janeiro, o rev. A. Cardoso da Fonseca foi assaltado na casa de cultos e na hora do serviço. Atiraram dinamites que felizmente não ofenderam à congregação. Depois do culto, foi ainda cercado quando se retirava para o hotel em que se hospedava. 5. Maio de 1892 - Em Santa Luzia do Rio das Velhas, Minas, os revds. J.L. Bruce e A.C. da Fonseca, residente então em Sabará, foram quase assassinados. Houve pedradas etc. 6.Na cidade do Recife, ia o culto em meio, na Igreja Presbiteriana, quando passou perante ela uma procissão da Igreja do Carmo dos Capuchinhos, que arremessou-se-lhe contra, num ataque feroz, ficando as janelas e telhas quebradas (Gazeta do Recife transcrito pelo Estandarte de 28-3- 1893). 7.Na Barra do Rio Grande, Estado da Bahia, o rev. Z.C. Taylor, e os srs. Emiliano Novaes e Dionísio de Oliveira quando iam começar o culto, viram- se cercados por mais de mil pessoas capitaneadas pelo padre Júlio Maria Fiorentini. O motim e a sanha fanática chegaram ao auge, que as autoridades todas, intervindo, não puderam contê-los e pediram ao Evangelista, que desistisse dos direitos que a Constituição lhe outorgava, sob pena de por em risco a sua vida. ("Estandarte" de 8 de julho de 1893). 8. Em janeiro de 1894 - no domingo 15, foram barbaramente espancados, em Ubá, Minas, os revds. A.J. Araújo Filho e J.L. Becker, quando voltavam de uma chácara a um quilômetro da cidade, onde tinham ido pregar. Diziam ter sido eles a causa de uma grande chuva de pedras, que assolava a cidade e os campos pelos arredores. 9. Em Campo Grande, próximo à Capital Federal, três crentes evangélicos buscavam realizar uma reunião religiosa, quando surgiu um motim contra eles, sendo obrigados a retirar-se perseguidos até grande distância (Estandarte 24- 3-1894). 10. O sr. Manoel Pereira Lacerda, anunciava o Evangelho, numa casa particular, em Guaraiba, Estado da Paraíba do Norte, quando o próprio delegado de polícia se apresentou acompanhado por umas quinhentas pessoas, intimando-o a calar-se sob pena de morte. ("ESTANDARTE" de 10 de agosto de 1895). 31 Este relato resumido das perseguições aos evangélicos, dá uma mostra bastante consistente da situação de confrontos e conflitos existentes nesse período do estabelecimento permanente do protestantismo e especialmente da Igreja Presbiteriana no Brasil. É importante destacar que o sentimento de liberdade e de garantias foi reforçando e as perseguições eram locais, ou quando muito regionais, nunca nacionais, mas que em diversos lugares católicos-romanos e evangélicos viviam em conflitos, gerando, inevitavelmente, as discussões polêmicas, envolvendo a interpretação da Bíblia como principal objeto. Normalmente esses debates eram feitos por meio de conferências, publicadas em jornais e boletins da época. É dentro desse contexto que viveu Álvaro Reis, como pastor e pregador presbiteriano, tornando-se um grande polemista. No capítulo seguinte far-se-á um estudo sobre a vida de Álvaro Reis como pastor, pregador e polemista. 32 2 ÁLVARO REIS: PASTOR, PREGADOR E POLEMISTA 2.1 Álvaro Reis – Pastor Nasceu o Rev. Álvaro Emygdio Gonçalves dos Reis na capital do Estado de São Paulo, a 22 de março de 1864, e foi filho de Miguel Gonçalves dos Reis e Isabel de Almeida Reis, ambos portugueses e já falecidos. Depois de terminar os cursos primário e secundário da Escola Americana, custeada na mesma cidade pelo Presbyterian Board of Foreign Missions, de New York, saiu desse estabelecimento de ensino aos 14 anos de idade, ingressando logo na atividade comercial e industrial. Até aos 18 anos, não tinha compromisso com o evangelho, andara sem o conhecimento das doutrinas Bíblicas. Até então não sabia que para ele estava reservado um brilhante e produtivo ministério pastoral. Mas, crê-se que pela providência de Deus que já o estava preparando, pois, era filho de pais cristãos e a educação cristã ali recebida despertara-lhe a consciência, e decidiu seguir a Cristo, fazendo pública profissão de fé, em 29 de outubro de 1882, perante a Igreja de Mogi Mirim. (RIBEIRO, D., 1925. p. 6) Nesse mesmo ano, 1822, Álvaro Reis completou, na referida cidade de Mogi Mirim, o curso de humanidades, sendo o Rev. Dr. João Boyle um dos seus professores. Em Campinas conheceu a senhorita Maria Fonseca, com quem veio a casar- se no dia 21 de agosto de 1886, tendo como celebrante do seu casamento o pastor Dr. Eduardo Lane. 33 Foi, então, neste período que se tornou candidato ao ministério. Matriculando- se no curso teológico mantido no Colégio Internacional de Campinas pelo Presbyterian Board of Foreign Mission, Nashville. Álvaro Reis exercia, durante esse tempo, as funções de presbítero regente da Igreja Presbiteriana de Campinas. Foi licenciado ministro do evangelho, em 2 de setembro de 1888, pelo presbitério de Campinas e Oeste de Minas, e ordenado pastor em São João da Boa Vista, em 2 de setembro de 1889, precisamente um ano depois de sua licenciatura, pelo Presbitério de Minas. Em 1893 tomou assento no Sínodo Presbiteriano, reunido no Rio de Janeiro, onde, por essa ocasião pregou um sermão com o título o clamor das Pedras, conquistando, logo, aqui, grande fama como orador sacro. Pastoreou as Igrejas de Itapira e Mogi Mirim, desde a sua licenciatura até abril de 1897. Nessa época o seu campo evangelístico era muito grande, compreendia uma área demasiadamente extensa. Além destas duas cidades paulistas, abrangia também as de Batatais, Mato Grosso de Batatais, Espírito Santo de Batatais, Ribeiro Preto, São Simão, Cajuru, Casa Branca, Mococa, São José do Rio Pardo, Santa Verediana, Palmeiras, São João da Boa Vista, e os arredores de todos esses lugares. Unindo-se ao Presbitério do Rio de Janeiro, foi nomeado pastor da Igreja Presbiteriana do Rio na então Capital Federal, em 6 de maio de 1897. Na vigência de seu fecundo ministério pastoral no Rio de Janeiro, que durou quase três décadas, Álvaro Reis fez muitas viagens, ora a serviço dos Concílios, ora de propaganda3 e algumas para breves repousos. 3 PROPAGANDA é um termo comum usado, na época, para divulgação do evangelho, a propagação das boas novas da salvação por todos os lugares da nova república. Os pregadores eram conhecidos como propagandistas, não no sentido de comercializar e sim de divulgar e explicar , esclarecer o real sentido do evangelho de Cristo. Usavam todos os meios possíveis no púlpito e na imprensa, 34 Quatro dessas viagens merecem menção especial: A primeira ao Estado de São Paulo, em 1901, para levantamento de coletas, cujo resultado foi usado para saldar a dívida do Seminário. A Segunda em 1904, aos Estados da Bahia, Sergipe, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte. A terceira em 1906, aos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. E a quarta em 1908, ao Estado de Minas Gerais onde pregou em diversas cidades: Sengó de Pouso Alto, Conchas, Caxambu, Baependy, Serra do Chapéu, Conceição do Rio Verde, São João da Cristina, Itajubá e Cruzeiro. (RIBEIRO, D., 1925. p. 6). Em 1910, na última reunião do Sínodo, presidida pelo Rev. Modesto Carvalhosa, foi instalada a Assembléia Geral da Igreja Presbiteriana do Brasil e eleito o Rev. Álvaro Reis, seu primeiro Moderador, que viria a ser eleito para mais uma gestão no ano de 1920. “Foi designado para ir à Convenção de Escolas Dominicais em Washington”. (FERREIRA, 1992. p. 125 ) Álvaro Reis trouxe naquela ocasião um grande benefício para o povo, especialmente aos evangélicos presbiterianos, quando da fundação do Orfanato Presbiteriano, pois, numa das sessões daquele Supremo Concílio, 1910, apresentou o respectivo projeto e propôs a criação desse estabelecimento de assistência e caridade, que foi então planejado para funcionar em Lavras. Mais tarde foi transferido para Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, estabelecido em terreno e edifício próprios, cedido pela Igreja de Copacabana. O orfanato, que em sua homenagem, hoje recebeu o seu nome. E como os jornais anunciassem o funcionamento de Orfanato em Copacabana, sob a direção de seu pastor André Jensen, aparecem logo a proposta de fusão. “[...] Não se sabe exatamente como foi que se fez a transferência do propaganda individual e coletiva, propaganda por conversação verbal e por palestra escrita, propaganda pelo folheto e pelo livro, propaganda no lar e fora dele, propaganda na loja e na oficina, propaganda a tempo e a fora de tempo, sempre e sempre a propaganda era a ênfase que marcara o ministério pastoral de Álvaro Reis. 35 Orfanato Presbiteriano para Jacarepaguá [...] Em 1829 houve um acordo com a Igreja de Copacabana que cedeu as propriedades de seu Orfanato para fortalecer o da Assembléia” (FERREIRA, 1992. p. 412-413 ). Embora de seu matrimônio não houvesse filhos, Álvaro Reis mostrou-se um verdadeiro e amoroso pai, adotou e tutelou educando 14 crianças sendo 7 órfãos de pai e mãe, de Mogi Mirim, quatro desta Capital, uma em Lavras e dois netos adotivos um deles Julinho de Oliveira, o Julinho, inteligência viva, o qual com aplausos gerais, apresentava-se em público na sociedade carioca e no exterior, como pianista de talento e futuro brilhante e promissor em sua carreira, que após a morte do avô Álvaro Reis, escreveu um artigo ao O Puritano que aqui é parcialmente citado, acha- se em sua íntegra, no anexo B. Ao meu idolatrado avô: Deixaste-me! Tu, que te empenhavas tanto para que eu tivesse um futuro brilhante! Tu, que te sacrificavas tanto para que eu trilhasse o cominho do bem e da verdade! Tu, que te esforçavas tanto para que eu recebesse uma educação condigna e aprimorada. [...] E dizia: Julio, prepara-te para seres o amparo de tua avó, porque de uma para outra hora eu posso morrer! E a sua profecia se cumpriu, infelizmente para todos, dolorosamente para todos aqueles que, sabendo-te estimar sinceramente como ministro do Santo evangelho de Cristo, sabiam também venerar-te e admirar-te como exemplar chefe da família. Obedecerei cega e indiscutivelmente o teu ultimo pedido! [...]” (OLIVEIRA, 1925, p. 3 ). Tais fatos mostram o grande coração de Álvaro Reis e do seu amor aos órfãos. Como pastor, buscava pastorear com toda dedicação, piedade e amor, a tal ponto que não se esqueceu dos órfãos, dedicando juntamente com sua esposa o pastoreio dessas crianças, das quais adotou muitas delas como seus próprios filhos. O Rev. Galdino Moreira, diretor de O Puritano, em um artigo neste jornal, chama Álvaro Reis de “bondade que anda”, referindo-se à sua piedade e amor pelas pessoas, (O PURITANO, 1921, nº 1120). 36 Álvaro Reis, em todo ciclo de seu ministério pastoral tem prestado eficiente concurso e assistência a todas as instituições evangélicas e tem sido membro das suas diretorias: Seminário Teológico Presbiteriano, Missões Nacionais, Seminário Unido, Hospital Evangélico, Associação Cristã de Moços, Orfanato, Esforço Cristão, Sociedade de Cooperação, etc. No dia 5 de agosto de 1900, sofreu a perda de sua amada mãe, dona Izabel de Almeida Reis; também no dia 9 de setembro 1915, de sua irmã dona Avelina Reis Garcia; e ainda no dia 9 de junho de 1922, de seu sogro, Jacinto Oliveira da Fonseca. (RIBEIRO, D., 1925, p. 6). Em todos esses amargurados acontecimentos, toda Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro, onde foi pastor, participou da dor de seu amado pastor, dando a ele e à sua amada família demonstrações de grande amor e companheirismo fraterno. O grande pastor, pregador do evangelho que registrou na história os feitos de seu produtivo ministério, fazendo dentre muitos discípulos para Cristo, alguns de forma especial e significativa, pois, tornaram-se como ele ministros do glorioso evangelho do Mestre Jesus. (RIBEIRO, D., 1925). Eis a relação dos seus filhos na fé que se tornaram ministros do evangelho: Revs. André Jensen, Américo Cardoso de Menezes, Abdias Nobre, Basílio Braga de Oliveira, Bernardino de Souza, Constancio Homero Omegna, Firmino Miguez, Julio Nogueira, Dr. Lisanyas de Cerqueira Leite, Manoel Alves de Brito, Octavio Jensen, Dr. Victor Coelho de Almeida e William Kerr. Álvaro Reis gozou do privilégio de conviver com esses ministros, que pela sua instrumentalidade foram alcançados pela graça de Cristo. E alguns destes ministros partiram para a glória antes do piedoso mestre Álvaro Reis. 37 O dedicado pastor pastoreou a igreja presbiteriana do Rio de Janeiro durante vinte e oito anos e, durante esse tempo à vista dos fatos que, entre os múltiplos fins desse ministério pastoral, sobreleva o de estender mais amplamente o glorioso Reino de Deus na cidade do Rio de Janeiro, nessa época, capital da República do Brasil. A mudança de Álvaro Reis para o Rio de Janeiro, à frente da grande Igreja da Capital, levou-o a sentir necessidade de um órgão de expressão. Então ele cria o jornal O Puritano, o qual dirigiu por 23 anos, em fevereiro de 1922, tornou-se órgão oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil, tendo sido nomeado, pelo Supremo Concílio da Igreja, como diretor o Rev. Galdino Moreira que no dia da comemoração dos 23 anos do jornal escreve: Não podemos terminar estas notas sem lançar aqui um voto de louvor aos irmãos que até agora vem prestando ao ‘Puritano’ o brilho de sua administração, direção e talento, que esperamos contribuem sempre ao dispor do nosso órgão oficial, especializando-se o zelo, a consagração e a tenacidade do ilustre pastor da Igreja do Rio, Rev. Álvaro Reis, pelo muito que tem feito pelo Puritano, que lhe nasceu no joelho há 23 anos passados (PURITANO, número 1144 de 16/02/1922, p. 1) O primeiro número foi editado no dia 8 de junho de 1899. O primeiro artigo desse jornal é assinado A. B. Trajano: A população do Rio de Janeiro é calculada em setecentos mil habitantes, e, pela assistência regular às diversas casas de culto, vemos que apenas duas mil pessoas ouvem regularmente a pregação do Evangelho; e, se isto se dá na Capital Federal, onde há tantos pregadores do Evangelho, o que diremos dos lugares onde não há ponto algum de pregação ou ensino evangélico?. Este estado de coisa nos leva a lançar mão de mais um meio ao nosso alcance, para fazer chegar o conhecimento da doutrina de Cristo àqueles que ainda estão privados delas. Este meio que agora empregamos é a publicação de O Puritano. (FERREIRA, 1992, p. 563). Pode-se notar a preocupação que Álvaro Reis tinha com as pessoas, seu desejo estava além do pastoreio da igreja local, pois sua visão se estendia a todas as pessoas que ainda não tinham recebido os ensinamentos da Bíblia. Sua visão é 38 que com a chegada do O Puritano, essas pessoas seriam gradativamente alcançadas pelas mensagens que nele seriam escritas e seria mais um instrumento na divulgação e propaganda do Evangelho de Cristo. Efetivamente, até onde se pode perceber o que caracterizou o ministério do Rev.Álvaro Reis desde o início ao final do seu ministério pastoral foi a propaganda, a divulgação do evangelho de Cristo, no púlpito e na imprensa, propaganda individual e coletiva, propaganda por conversação verbal e por palestra escrita, propaganda pelo folheto e pelo livro, propaganda no lar e fora dele, propaganda na loja e na oficina, propaganda a tempo e a fora de tempo, sempre e sempre a propaganda era a ênfase que marcou o seu ministério pastoral. Por causa da perseguição da igreja católica romana havia, entre os crentes, então, certo desânimo e alguns dos mais corajosos, como temiam ser apontados a dedo como, bíblias, termo que possuía significação pejorativa. Mas Álvaro Reis, com seu constante dinamismo, com seu espírito propagandista inflama todos os ânimos, aquece todas as almas, reanima a todos, fortalece os fracos, revigora as forças. Domingos Ribeiro, em um artigo no Jornal O Puritano, registra as palavras de Álvaro Reis: Irmãos, se tendes vontade, e essa vontade quer; se tendes abnegação não se desafervora; se tendes sangue, e não poupais as gotas desse sangue; se tendes fé, e essa fé não é morta; se amais a Cristo e as almas, e esse amor é verdadeiro – cumpri o vosso dever, desentranhais as vossas virtudes, pregai o evangelho ou, se não tendes o dom da palavra, auxilia-a pelos meios e recursos ao vosso alcance aos que podem fazê-lo. À arena do combate, irmãos! Irmãos, pelo amor de Cristo e da Pátria, a propaganda (RIBEIRO, D., 1925, P. 3). Domingos Ribeiro afirma que esse método foi eficaz, foi eficiente, despertava os crentes que logo erguiam suas cabeças, se levantavam dos seus lugares, eram incomodados, despertados, encorajados, corações que anseiam pela salvação das almas e, então, o evangelho era anunciado de forma poderosa. Mediante a 39 distribuição de convites, de folhetos. Muitos pontos de pregação eram inaugurados; e Álvaro Reis “se esforçava para estar presente em todos esses lugares, a multiplicar- se como que por milagre, pregando todos os dias, ora neste lugar, ora naquele, na igreja central e em toda a parte onde se lhe oferecesse um púlpito”, (RIBEIRO, D., 1925, p. 3). Surgem por influência desse extraordinário pastor os missionários leigos. Estes, ouvindo-lhe os sermões, instruem-se, e como seu instrutor e mestre tornam- se pregadores. O pastor Álvaro Reis faculta a esses leigos as colunas de seu jornal, anima- os, encoraja-os, e alguns deles vem a conquistar nome nas letras e se tornaram grandes líderes, ministros, escritores e apologistas. Com seus livros, artigos e sermões, no exercício da propagação do evangelho. Demonstrou sua visão pastoral, visando sempre à edificação e crescimento das ovelhas que o Bom Mestre lhe havia confiado, olhando para um dos principais meios de crescimento e desenvolvimento espiritual, que é sem dúvida a Escola Bíblica Dominical; remodelou-a, estabelecendo diversas classes: para homens e senhoras, para professores e missionários leigos, para de ambos os sexos para as crianças. Introduziu o jardim da infância e criou o departamento do berço. Do seu ministério de 28 anos como pastor da Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro, período de muitas conquistas e grande desenvolvimento dessa Igreja, onde está tudo registrado, em relatórios. No dia 24 de junho de 1925, morre Álvaro Reis. Houve manifestações em muitos lugares, todos os jornais do período deram a notícia de primeira mão, muitos com ênfase na primeira página. Houve até manifestação par parte de homens da 40 política na República. O Puritano por várias semanas editou artigos que chegavam de diversos lugares do país e de fora. 2.2 Álvaro Reis – Pregador Álvaro Reis foi um dos maiores pregadores, sua oratória era admirada por todos, onde Reis pregava, multidões enchiam seus templos ou salões onde se realizavam suas pregações. Sua influência na Igreja Presbiteriana foi muito grande. De uma disposição invejável, pois, foi pastor da Igreja do Rio, e cuidava de uma área muito extensa, viajava para lugares distantes, para ali pregar sempre com o mesmo entusiasmo com que pregava na Igreja do Rio. “Após dezesseis dias de ausência, onde Álvaro Reis visitou 10 lugares, pregou 23 vezes e iniciou na Igreja Presbiteriana 49 pessoas. O primeiro lugar visitado foi Sengó do Pouso Alto” (O PURITANO, 27-08-1908). Em uma visita a Belo Horizonte, Reis reuniu um número grande de pessoas, lotando as Igrejas, que esperavam ansiosamente para ouvir sua pregação, despertou também, admiração de pessoas do governo local, conforme artigo do Jornal O Puritano. Álvaro pregou três vezes na Igreja Presbiteriana, uma na Metodista e outra na Batista, em todas elas os auditórios foram magníficos; o povo se comprimia ansioso, muitos sentados; muitos de pé, e muitos outros fora nas calçadas e jardins.. No Teatro Municipal de Belo Horizonte Álvaro pregou durante duas horas. O Minas Gerais, órgão oficial do governo de Minas, denomina Álvaro Reis, o notável orador sacro; intelectual festejado em todo o País, ilustre conferencista, com a palavra clara, bela, despida de artifício, plena de sinceridade e vigorosa em lógica. (O PURITANO, 02-08-1917) Reis, com sua oratória encantou seus contemporâneos, eram unânimes em afirmar que a respeito do poder de sua oratória, sua maneira de expor o evangelho encantava e emocionava o auditório. “Freqüentemente, as sua prédicas eram o fruto de um celeste fervor, de pronta e súbita iluminação, e sempre a palavra do 41 evangelho lhe saía viva, penetrante, animada, cheia do Espírito e de fogo” (POLYANTHÉA, Arquivo Presbiteriano). Domingos Ribeiro, descreve Álvaro Reis como homem de muitas qualidades: Vasta erudição, veemente eloqüência e segura dialética, pelo brilho da frase e pelo estilo simples as vezes, pomposo, outras humorístico e irônico, máximo em controvérsia, dotes ainda mais realçados, quer pela figura insinuante, varonil e expressiva, quer pela voz sonora e correta dicção, Álvaro Reis atingiu máxima popularidade [...] exerce grande fascinação sobre os auditórios que comparecem as conferencias de propaganda. (1925, p. 6) O pastor, Álvaro Reis, quando pregava era tal a sua manifestação de fé na mensagem que expunha, era tal a sua consagração e devoção que se manifestou em seu próprio semblante, nos detalhes de sua expressão facial, de seus movimentos, e os ouvintes eram inflamados e levados a se renderem, com a mensagem proferida pelo eloqüente orador. Alto e esbelto, a cabeça erguida, a fronte vasta e em que parecia errar uma aurora de inspiração, o nariz recurvado, e ávido, os olhos a fluírem as luzes interiores, o semblante iluminado por essas estranhas claridades que aureolavam, outrora os profetas do Eterno, Álvaro Reis logo empolgava e dominava a assistência. No ardor da elocução, todas as linhas expressivas de sua fisionomia se animavam revelando sua grande alma, dando a visão universal de seu espírito, e os ouvintes insensivelmente pensavam no genial apóstolo dos gentios, Paulo, de quem Álvaro Reis continuou a ação prodigiosa e lhe reproduz os traços mais vigorosos da organização psíquica. (RIBEIRO D., 1925, p. 6). Álvaro Reis, homem de grande talento, instrumento glorioso a serviço do evangelho na explanação de sua mensagem. Quando pregava suas palavras inflamavam os corações dos que a ouviam e Deus ricamente os abençoava convertendo muitas e muitas almas e edificando a vida dos fiéis usando a instrumentalidade deste dedicado, incansável e devotado pregador do evangelho de Cristo. Cita Ferreira a respeito de Álvaro Reis: “Exerce grande fascínio sobre os auditórios, que acorrem às conferencias de propaganda” (1992, p. 259). Em uma de 42 suas conferências realizada na Igreja Presbiteriana de Jaú, como já se tornara comum, a Igreja estava lotada, seu sermão foi sobre, o mandamento de Cristo, examinai as Escrituras. “Ficaram admirados, com a oratória e, a eloqüente explanação do Evangelho. Todos comentavam sobre a grande mensagem, e o talento e o carisma do extraordinário orador, que foi chamado de Paulo do Protestantismo brasileiro”. (RIBEIRO, D., 1925, p. 5-6). Reis, pregador muito requisitado, pelas Igrejas de todo país, apesar do reconhecimento de sua capacidade de comunicação, era muito simples e popular. Na Igreja do Rio, onde foi pastor por quase vinte e oito anos, a freqüência aos cultos subia a 1500 pessoas por ocasião do natal, sexta-feira santa e outros dias comemorativos. Muitos conheceram As sete palavras de Jesus na Cruz, sermões magníficos, largamente divulgados, na íntegra, pelo Jornal do Comércio e editado em livro. Esses sermões foram pensados, escritos e pregados numa só semana, a semana santa de 1914. Este exemplo indica a capacidade e potencialidade extraordinária que ele possuía na elaboração de seus sermões, palestras, artigos, escritos em geral. Betuel E. Peixoto (1925, p. 3) em um artigo ao O Puritano diz: Seu próprio nome o designava o príncipe dos pastores – como venerando sucessor do Sr. Ashbell Green Simonton e do Rev. Antonio Trajano, o grande matemático intelectual de vastíssima cultura, homem de porte majestoso, austero, porem social, caridoso em extremo, audaz e exigente. Convivemos cerca de seis anos e não foi muito para conhecê-lo melhor, pois que os encontros se davam duas vezes por semana, na Igreja Presbiteriana à rua Silva Jardim e às vezes em sua residência. Escrevam outros o seu perfil, pois é um privilégio que não nos cabe e constatem todos, o que ele fez no Brasil, e isto, de certo falará muito mais alto, o que ele fez. Nós, porém, no recanto da saudade, registramos apenas aquilo que tantas vezes se desperdiça... pequenas memórias de um Brasileiro ilustre. Sr. Álvaro tinha um prazer imenso em efetuar um batismo. Estava sempre a falar nos “quase induzidos”. Como que temos impressa na retina aquele vulto grande, de sobrecasaca, de belas barbas brancas, quando, empunham a taça do batismo, ele proferia sempre aquelas palavras 43 sacramentares: “Assim como a água lava o corpo, assim a graça divina torna puro e santo o coração”. Ele era conservador. Álvaro não foi o intelectual, pesquisador paciente, foi homem popular, o pesquisador interessado em combater a incredulidade, de palavra fácil, e de presença empolgante. “Guilherme Kerr muitas vezes referia-se a essa personalidade, dizendo que a presença de Álvaro no púlpito era meio sermão” (FERREIRA, 1992, p. 259) Lendo artigos sobre Álvaro Reis e mesmo em seus escritos, percebe-se claramente a capacidade de improviso quando era necessário, demonstrando o talento de um erudito improvisador. Assim diz Domingos Ribeiro: Ainda hoje nos lembramos comovido, de belíssimo improviso. Faz, talvez, vinte e cinco anos, promovera a associação cristã de moços um pic-nic à ilha de Paquetá. Lemos todos admirando a extensão líquida da Guanabara, o seu bojo reboante de vozes misteriosas, as suas ondas túrgidas e velozes, torvelhinhos das cristas de alvenitentes espumam nos assaltos aos arrecifes, senão quando, ao defrontar nossa lança à ilha Villegaignon, Álvaro Reis não se conteve. Ergue-se e profere um discurso brilhantíssimo, arrebatador. Em rápida síntese, rememora, nos seus elementos dramáticos, a tragédia de 9 de fevereiro de 1558 desenrolada naquela ilha, e, depois de estigmatizar, com seu verbo candente, a conduta do almirante Nicolas Durand de Villegaignon, abominável e detestável. (1925, p.6) O relato, escrito por um membro da Igreja do Rio, um dia após a morte de Álvaro Reis, descreve uma aula dada por ele aos professores, na quarta-feira, véspera de sua morte, este foi o seu último estudo. No relato dessa aula, pode-se perceber como foi Álvaro Reis, pastor e mestre dedicado, sempre preocupado com o ensino do Evangelho, com o crescimento da Igreja, em especial com a instrução na Escola Dominical, a qual tratava com grande dedicação. Ampliou suas acomodações, Um de seus presbíteros falou sobre o crescimento da Escola 44 Dominical, “A Escola Dominical, da qual ele é o nervo, cresce constantemente” Polyanthéa, 1925, p. 29, Arquivo Presbiteriano). AGUIAR (1925, p.6), superintendente da Escola Bíblica Dominical diz: Foi na quarta-feira, três do corrente, quatro horas antes do seu falecimento, que o Rev. Álvaro fez sua última preleção, uma aula à classe bíblica da Escola Dominical. Na oração da abertura o Rev. Álvaro agradeceu a Deus o estabelecimento da Escola Dominical, pedindo-lhe que despertasse em todos os alunos presentes e ausentes o desejo de usufruírem os privilégios que as classes bíblicas oferecem aos professores da E.D. Pediu depois pelos enfermos e mencionou os nomes da senhora do Rev. Santos, do sr. Benjamim, pai de um aluno presente; de uma filhinha do sr. Breno e de uma outra do sr. Dias. Começou a lição com essa pergunta: “ os gentios sempre estiveram na Igreja?”discorreu longamente sobre este ponto. A Igreja, disse ele, sempre foi para os judeus e os gentios. Até Abraão não houve distinção. A instituição da circuncisão veio distinguir o povo de Deus. Abraão circuncidou os escravos gentios. Raabe, a gentia que usou de misericórdia com os mensageiros de Jesus, escondendo-os e Ruth, a moabita entraram na genealogia de Cristo.Chama, atenção dos os alunos para o evangelho de Lucas que da o genealogia de Cristo até Adão e para o de S. Mateus que dá de Abraão até Cristo. A igreja, portanto, disse o nosso saudoso pastor, é católica universal. Que belíssima e inspirada preleção foi este começo de sua aula [...] Este artigo consta, na íntegra, no anexo C. Sempre incansável em seus 36 anos de ministério pastoral, já enfermo, estava um tanto pálido, mas fez a exposição da lição do domingo seguinte com a clareza e entusiasmo, características que sempre marcaram seu ministério pastoral. Preocupado com o artigo que escreveu no dia 3 sobre o aniversário de O Puritano, solicitado pela sua direção, e que ainda não tinha feito a costumeira revisão. Deitou- se e dormiu. Pela madrugada, acordou com diarréia, pediu à Mariquinha, sua esposa, que chamasse Julinho, seu neto, que veio vê-lo. Tomou remédio e disse a Julinho que estava sentindo uma forte dor no peito; pediu-lhe que fizesse uma massagem. “Seu estado agravou-se. Pressentindo o fim, tentou cantar o hino: Jesus sendo meu sou muito feliz [...] só o conseguiu em parte. Morreu cantando, às 2 e trinta minutos da madrugada do dia quatro de 1925” (FERREIRA, 1992, p. 262). 45 Álvaro Reis foi um grande pastor e pregador do Evangelho, por causa de sua saúde abalada, concentrou-se no último mês de sua vida aos trabalhos da Igreja do Rio. Escreveu em sua Bíblia ao lado do texto de 2 Timóteo 4:1-5 Este é o meu testamento a quem me suceder. Um dos seus últimos sermões foi sobre o texto: Acabei a Carreira. Pelo seu amor e zelo pela Doutrina bíblica e o insaciável desejo de expô-la e defendê-la, Reis tornou-se um grande, mas sempre leal polemista. A morte de Álvaro Reis, trouxe manifestações comoventes, de toda parte do País chegavam cartas, todos os periódicos da época destacaram a morte do ilustre, pastor, manifestando sentimentos de grande perda, sofrida não só para a Igreja Presbiteriana, mas a Igreja Evangélica perdia um grande evangelista, o país perdia um grande brasileiro. O Puritano homenageou Álvaro Reis, que em 1889, criou e fundou este jornal, tornou-se periódico da denominação até 1958. Em primeira página, destacou a sua morte e, durante semanas publicou artigos, lamentando sua abrupta partida. Não paravam de chegar: colegas, amigos e até de seus opositores, reconhecidos de seu valor. Uma das páginas do Puritano presta-lhe a última homenagem: Morreu Álvaro Reis! (O PURITANO, 1925, nº 1301, p. 2): Como carvalho gigantesco desassombrado do Líbano, que após vencer impávido as mais impetuosas rajadas dos vendavais ciclonicos, cai, ao sopro de suave brisa de noites de luar, acaba de tombar no campo da luta gloriosa do Evangelho no Brasil, após formidáveis combates sempre conquistados, o grande carvalho brasileiro protestante, Rev. Álvaro Reis, tombou galhardamente, cantando o seu hino predileto, o numero 30 dos nossos salmos e hinos, esse Elias hodierno, esse Crisóstomo, formidável personalidade cristã da igreja evangélica, e do evangelismo brasileiro. Figura expressiva e impressiva do evengelismo Sul Americano. [...] Como cidadão pacato, patriota profundo [...] como tribuno sacro de coração largo, de imaginação fecundíssima, como polemista vigoroso, como pastor acatado e solícito [...] como erudito, pesquisador da Bíblia, da história e das Letras. Álvaro Reis um nome querido entre nós. Comovente também foram as manifestações de reconhecimento e de gratidão pela obra que ele realizou. Nos vinte e oito anos de seu ministério pastoral na Igreja 46 do Rio, o rol de membros, no início de seu pastorado dia 6 de maio de 1897 eram 586 membros maiores de idade 400 menores, até o dia 31 de dezembro de 1924, o número aumentou para 3090 membros maiores e 1856 membros menores. “No Rio já havia 6 Igrejas organizadas, e 16 congregações. Álvaro Reis se ocupava de estudos, pregações, ou conferencias quase todos dias da semana, nunca falava menos de 4 vezes por semana”. (FERREIRA, 1992, p. 262). Álvaro Reis era muito organizado, tudo que realizava, registrava em relatórios. O relatório da Igreja do Rio, do ano de 1912, encontra-se no anexo D. 2.3 Álvaro Reis – Polemista Percebe-se que a preocupação dos missionários, que aqui chegaram, principalmente das Missões Norte-americanas, e aqui formaram e estabeleceram Igrejas, é a conversão do povo brasileiro a Cristo, tendo a Bíblia como autoridade final e infalível. Simonton, missionário presbiteriano, demonstra essa preocupação, descrevendo os meios necessários e próprios para plantar o reino de Jesus Cristo no Brasil, destacava entre outras coisas a distribuição da Bíblia, livros e folhetos religiosos. “Desse modo, pode-se dar notícias de Jesus a muitos que não querem assistir ao culto público. [...], Deve-se trabalhar para que se faça e se propague em toda a parte uma literatura religiosa em que se possa beber a pura verdade ensinada na Bíblia”. (DIÁRIO, 1982, p. 210) A Bíblia era instrumento usado para refutação de todo ensino contrário a ela, e principalmente na controvérsia contra a Igreja Católica Romana. Os pastores e missionários estavam sempre preparados para participarem de qualquer polêmica, 47 escrita ou oral, com a condição de que as posições em confronto fossem provadas pela Bíblia. As discussões quase sempre eram com os polemistas católicos-romanos. Os pastores evangélicos enfrentavam com determinação seus oponentes, procurando provar sempre pela Bíblia suas posições, e com isso muitos deixavam o catolicismo, e eram convertidos à Reforma, conforme Ribeiro, “O número de pessoas que, assim, aderiram à Reforma é imenso e de boa qualidade. Os pregadores da Reforma, pois, explicavam e expunham textos da Bíblia, e aplicavam-nos aos ouvintes”. (1991, p. 197) Em sentido geral o púlpito evangélico é sempre uma controvérsia. O pregador desempenha o papel de polemista, ainda que seu combate não seja diretamente contra uma pessoa, mas com certeza estará fazendo apologia da fé evangélica. Ali são combatidas as doutrinas consideradas heresias, e principalmente contra o pecado. O pregador polemista desempenha função de vital importância, reproduz e refuta os argumentos da parte adversa. Em seus discursos polêmicos, Álvaro Reis, demonstra preocupação em convencer o oponente, da salvação somente em Cristo. Lendo o jornal da época, O Puritano, órgão oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil, encontram-se artigos a respeito das pregações de Álvaro Reis que indicam comentários, por exemplo, após sermão proferido por ele, ouvintes falavam entre si: “O pastor hoje tocou na minha ferida. Será que ele sabe alguma coisa do meu pecado? Quem lhe terá contado, outros querendo penetrar-lhe a intenção, diziam: Não há dúvida, ele falou diretamente comigo”. (RIBEIRO D., 1925, p. 6) E, em assim exclamando, claramente aceitavam e aplicavam a si mesmos as mensagens, tornadas tais, por eles próprios, como carapuças. Espírito lúcido, perspicaz, Álvaro Reis sempre emitiu idéias claras sobre essa grande necessidade de conduzir o homem ao conhecimento da verdade do 48 Evangelho, refutando toda e qualquer atitude contrária ao ensino da Bíblia. Sustentou acesas lutas com os mais imponentes adversários, entre os quais José de Campos Novaes e Conde Carlos de Laet, membro da Academia Brasileira de Letras. Movido, não pelo desejo de vencer somente, mas pelo de conduzir as pessoas ao conhecimento da Bíblia, e por meio desta, a Jesus o único caminho que conduz a Deus. Temperava o seu combate com demonstrações de intenso amor pelas almas de seus contraditores. Mantinha sempre o hábito de encerrar suas conferências com uma exortação, rogando as bênçãos de Deus e sua misericórdia para os seus oponentes “[...] tal foi a intenção da minha alma, fique certo. Augurando-lhe as maiores felicidades e impetrando ao Altíssimo Sua santa benção sobre o amigo” (REIS, 1916, p, 53). No final de sua refutação aos argumentos espíritas de Augusto José da Silva, sobre o Espiritismo, Reis demonstra misericórdia e apreço pelo seu amigo opositor “louvado Deus! Ele não quer a vossa condenação, mas deseja que arrependido dos pecados depositeis a vossa fé em Seu Divino Filho e em Sua Santa Palavra, para que sejais salvos da maldição dos vossos delitos” (REIS, 1916, p. 166) De modo geral, as controvérsias estavam ligadas à Igreja Católica Romana, que, através de sua liderança e de intelectuais, faziam críticas e forte oposição aos protestantes, principalmente os intelectuais, o advogado, José de Campos Novaes, que chegou a afirmar conter a Bíblia muitos mitos e lendas, “[...] asseverando-nos que não temia discutir pela imprensa, e que estava pronto a provar que a Bíblia era tirada da religião dos caldeus” (REIS, 1918, p. 9), foi publicado em importante jornal da época, Diário de Campinas. Em 1901 cruzou armas com um dos mais extremos defensores da igreja Católica Romana, o conde Carlos de Laet. Este sustentava, e Álvaro Reis negava, o culto dos santos e que a sua intercessão fosse ensino Bíblico. A Polêmica travou-se 49 pelas colunas do Correio da Manhã e do Jornal do Comércio, “respondera a Carlos de Laet, partindo da invocação de santos e da adoração de imagens, e passando por vários dogmas e práticas romanistas”. (RIBEIRO, 1991, p. 276) Teve larga repercussão em todo país, no Rio de Janeiro, então Capital da República, este assunto era o comentário do momento, em todo lugar, se falava a respeito desta discussão. A luta que fora disputada, estendeu-se por alguns meses. Afinal, nada podendo contra a exegese Bíblica de Álvaro Reis, e depois de esgotar todos os recursos de sua dialética sofista e bizantina, o Conde Carlos Laet, a pretexto de que seu adversário praticara algumas incorreções gramaticais, remeteu-se ao silêncio, abandonou o lugar onde discutiam as questões. Desse tempo, passou-se quase um ano, sem manifestação de Carlos de Laet, conforme registra Reis em seu livro Mimetismo Católico. Desde 25 de junho de 1902, até hoje, 25 de março de 1903, o sr. Dr. Carlos de Laet se recolhera em silencio, [...] quisesse se retirar da arena assim [....] mas sábia ele e eu, que o Dr. Laet já havia fugido! [...] E assim, s. s. que teve uma entrada, nesta respeitosa arena, como verdadeiro cavalheiro, fez uma vergonhosa retirada [...] muitos romanistas já me declararam as suas convicções a respeito. Creio que foi isto que exasperou o Sr. Dr. Carlos, e, por isso, fugiu xingando! (REIS, 1909, p. 357-359) Álvaro Reis, juntou os brilhantes artigos referentes a esta peleja por todos os títulos memoráveis, e em 1909, publicou o livro Mimetismo Católico, (RIBEIRO, 1991, p. 276) Em 1907 impugnou a monografia do Dr. Candido Mendes de Almeida sobre a catástrofe de Bolés, recolhida na revista do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil. Candido Mendes defende o padre José de Anchieta, acusado de ter tido participação direta na morte de Jaques Le Balleur, onde teria ensinado o carrasco no ato da execução. Reis dedicou-se para demonstrar que José de Anchieta, é o carrasco de Bolés, na execução do mártir francês, e na identificação de “Le Balleur, 50 que estava sendo confundido com o ex-frade dominicano Jean de Cointac, que foi espulso do Forte Coligni por Vilegaignom, traidor de sua Pátria, pondo-se a serviço de Men de Sá”, (REIS, 1817, p. 8), e, a propósito deste trabalho, argumentou ainda com os doutores Carlos de Laet e Capistrano de Abreu. A ambos os quais Reis respondeu. Seus artigos foram publicados no Puritano, depois reunidos em livro, em 1917, O Mártir Le Balleur. Em nota no livro, História do Brasil, Rocha Pombo diz: (1956, p. 514) Ainda ultimamente em uma longa série de artigos publicados em uma revista, o sr. Dr. Álvaro Reis, com grande pompa de erudição, deu a controvérsia proporções que parecem deslocar o assunto do terreno do histórico propriamente para o da dialética religiosa. Não se lhe pode negar a competência que resulta de um vasto estudo da matéria: só de se lamentar que o autor da monografia não pudesse ter disfarçado que é mais sectário do que historiógrafo. O Dr. Álvaro esforça-se por demonstrar (e isto refutando o Dr. Candido Mendes e outros) que José de Anchieta é o carrasco de Boles, por ter instruído o algóz no ato da execução. É preciso dizer ainda que folgamos de ver que para o Dr. Álvaro Reis, o Bolés de quem se trata não é outro senão, Jaques Le Balleur Na Imprensa diária, as conferências de Álvaro Reis eram estampadas na íntegra, nos dias imediatos, e aconteciam muitas conversões, conforme testemunho de um admirador registrado por Ferreira, “ [...] chama lhe saíam da boca e incendiavam o íntimo dos corações; e Deus ricamente o abençoava, convertendo muitas almas e edificando os fieis por instrumentalidade deste infatigável atalaia” (FERREIRA, 1992, p. 259) No ano de 1914, Reis aguardava o costumado ataque do padre Julio Maria para refutar. Nessa quaresma, porém, o orador católico deixara em paz os protestantes. Chegado o domingo de Ramos, Álvaro Reis, na ausência das conferências de Julio Maria, teve uma inspiração feliz, resolveu efetuar durante a semana santa uma série de conferências excepcionalmente edificantes e instrutivas, ocupando-se das Sete Palavras de Cristo na Cruz. 51 Durante as conferencias da quaresma de 1914, aguardava eu o costumeiro ataque do rev. Padre Dr. Julio Maria ao Catolicismo Evangélico. Surpreendido por não tê-lo feito resolvi na véspera do domingo de ramos, encetar uma série de conferencias sobre o Evangelho da Cruz, tomando por tema as últimas Sete quão sublimes Palavras proferidas por Cristo quando à Cruz pregado.Obra tal jamais imaginara fazer, assim quase de improviso (REIS, 1917, p. 5). Foram elas de grande deleite e proveito para a edificação, pois, Álvaro Reis, pastor e conferencista transportava os ouvintes a essas elevadas esferas da verdade espiritual, onde a alma é purificada, se fortifica e antegoza as delícias do céu. “Sermões magníficos[...] os quais tantos benefícios tem feito e esta fazendo às almas” (FERREIRA, 1992, p. 259), Segundo Álvaro Reis, “esse moderníssimo trabalho, deu-lhes o alcance, sem precedentes, de um esforço evangelistico verdadeiramente nacional. Selado com a conversão de algumas pessoas nesta capital” (REIS, 1917, p. 5) São muitas as obras de Álvaro Reis, e grande parte delas foram originadas por intermédio dos debates polêmicos com seus oponentes, em geral ligados à Igreja Católica Romana, mas uma coisa tinham em comum, as polêmicas eram sempre em torno da Bíblia, em geral, a respeito de sua interpretação e sua autenticidade. Dentre essas muitas polêmicas serão citadas duas: 1. Polêmica de José de Campos Novaes, sobre, as Origens Caldaicas da Bíblia. 2. Polêmica do Dr.Augusto José da Silva e de Fred Figner, sobre o Espiritismo. O propósito, neste capítulo, não é analisar essas polêmicas, mas procurar relatar brevemente como Álvaro Reis as refutou, merecerão estudo aprofundado, sim, no capítulo seguinte. Ver-se-á o que afirma o grande pastor e polemista Eduardo Carlos Pereira no prefácio do livro, As Origens Caldaicas da Bíblia, onde 52 descreveu de forma clara a situação daquele período, as oposições à Igreja Protestante, as heresias e os constantes ataques não só à Igreja, como também à Bíblia, levando os ministros das igrejas protestantes a fazerem constantes refutações contra os ataques que recebiam. A capacidade intelectual de Álvaro Reis, se destaca diante de um quadro de constantes ataques sofridos pelas Igrejas protestantes e seus ministros, considerando as diversas atividades que tinha o ilustre apologista, considerando as grandes dificuldades para se ter acesso às literaturas para pesquisas sobre o assunto. Em meio a tantas dificuldades, Álvaro Reis desenvolveu sua refutação de forma profunda e convincente, pois estava embasada em argumentos bíblicos e históricos. No prefácio de Carlos Eduardo Pereira: [...] Polemistas eméritos, nunca abrem a BÍBLIA para combatê-la com seriedade. Contentam-se com as citações isoladas e falseadas, que leram nos escritos dos bacharéis de além-mar, cujos conhecimentos se filiam, por sua vez, em transmissão hereditária, ás rebatidas chalaças de Voltaire. Desnorteados, além disso, pelo meio católico romano, estes, paladinos quixotescos da ciência moderna; [...] baralham grosseiramente os elevados ensinos do Evangelho com os absurdos e superstições de Roma. [...] Arautos de uma ciência de falso nome, apregoam eles, com a consciência de perpétuos noviços, o conflito entre duas verdades divinas, entre duas potências sociais, entre dois fados indestrutíveis, entre duas coisas que conhecem, a religião e a ciência. Sem ideal, sem modéstia, sem respeito, isto é, sem religião e sem ciência, eles esmorecem no seio de nosso povo o sentimento religioso, única base segura da moral, único incentivo permanente do bem, garantia única da estabilidade e progresso sociais. É este, em largos traços, o tipo, é esta a missão social dos diletantes bacharelados, dos Homens da ciência que temos de enfrentar em nossa propaganda religiosa. Nestas condições, vêm, As Origens Caldáicas da Bíblia prestar relevante serviço á verdade cristã e á sociedade brasileira. Obra de combate, escrita, em sua maior parte, sob o fogo do adversário, e nos intervalos de constantes viagens de evangelização. Constituem elas, não obstante, um testemunho eloquente da inteligência e incansável atividade do Rev. Álvaro Reis, que, impelido à discussão, pode, em tão curto tempo, em meio de multiplicados afazeres, lutando com a séria dificuldade de obter as obras contemporâneas sobre o assunto, congregar, o material precioso com que defende vantajosamente a verdade bíblica. [...] Este livro é um eixo do combate. Oxalá desperte ele interesse pela luta. [...] Hoje, em 1893, tem a palavra da ciência moderníssima sobre a origem do Cristianismo para o amador campineiro, a Caldeia. E agora, encerrando estas considerações, cumpre-nos felicitar nosso amigo e exprimir-lhe voto ardente para que o trabalho ora exposto concorra para despertar em nossos patrícios mais respeito pelo Livro venerado, gênese admirável da civilização moderna.” S. Paulo, 13 de julho de 1893. (PEREIRA, 1918, p. 3-7 ; REIS, 1918, p. 3-7). 53 Pereira, neste prefácio, mostra qual era a situação social e religiosa do povo brasileiro, e do comportamento natural dos ministros protestantes em fazer ecoar de seus lábios a apologia da Bíblia contra seus mais ferrenhos opositores. Enfatizando a capacidade de polemista de Álvaro Reis. É importante frisar que ele não era dotado somente da capacidade de polemista e grande orador, unia aos seus debates a piedade do grande pregador e pastor, que sempre marcou seu ministério. Domingos Ribeiro em um de seus artigos ao Jornal, O Puritano, aborda que por meio dos debates e refutações aconteciam conversões, e este sempre foi o seu principal alvo, eis o registro de um desses fatos: Conhecemos um fruto de tal discussão. É que, lendo a obra referida, converteu-se ao evangelho, o Dr. Severino Silva, que tornou-se operoso obreiro na Igreja Presbiteriana, nesta Capital, a que continua dando o melhor de seu esforço e entusiasmo cristão como um de seus presbíteros modelares (RIBEIRO, D., 1925, p. 6). Vê-se então a primeira polêmica, e a refutação de Álvaro Reis (1918): 1. Polêmica de José de Campos Novaes, sobre, As Origens Caldaicas da Bíblia. No ano de 1892, o Dr. José de Campos Novaes, escreveu e publicou uma série de artigos, no diário de Campinas, com o objetivo de demonstrar que a Bíblia fora tirada da antiga religião dos Caldeus. No mês de junho do mesmo ano, Álvaro Reis, se encontrava na fazenda do Sr. Augusto Teixeira, ocasião em que pregava o Evangelho. “Achava-se ali presente o advogado Dr. José de Campos Novaes, após o culto, entrou em discussão com Álvaro Reis, quanto à origem e autoridade da Bíblia, quando Álvaro Reis o convidou para sustentar sua teoria pela imprensa, o que é logo aceito” (REIS, 1918, p. 9). Aqui tem início uma grande e longa discussão polêmica. Campos Novaes, diz que a Bíblia e seus personagens são mitos, e usa como referência o Assiriólogo 54 inglês, François Lenormant, no qual apóia seus argumentos. Álvaro Reis procura mostrar que Lenormant, não se posiciona, pois, ora afirma serem mitos, ora tipos, ora são reais, neste caso referindo-se ao dilúvio Bíblico. Então, Álvaro diz: (REIS, 1918, p. 27) [...] Ante estas citações, Sr. Dr. José de Campos Novaes, quando deveremos crer em Françóis. Lenormant? quando ele afirma que os personagens antidiluvianos são meros tipos, cores de mitos ou mesmo mitos; ou quando assevera que são lendas, legendas, tradições, invenções, ou personificações étnicas, ou mesmo fatos reais? Para François. Lenormant, os personagens bíblicos, como Adão, Eva, Enoque, Lameque e suas filhas, etc., com os quais há alguma coisa de extraordinário, ou cujos nomes são idênticos aos dos mitos, ainda que despidos de seu caráter mitológico, por temerem os escritores sagrados abrir as suas portas ao politeísmo pagão, não obstante, são personificações de mitos” [...] Álvaro Reis refutou, mostrando a Campos Novaes que Lenormant, no qual ele se baseia a maior parte de seu discurso, na verdade não se define, conforme a citação acima. Os argumentos de Reis são à luz da arqueologia, sempre procurando mostrar que a arqueologia, veio comprovar a autenticidade da Bíblia e seus personagens e não o contrário. A arqueologia da Assíria e do Egito, e tantas outras arrancou a máscara aos especuladores incrédulos, que sob o inventário das religiões mortas e sepultadas nas ruínas do Egito e da assíria, forjaram arrojadas e gratuitas hipóteses na suposição de que podiam mentir à vontade, sem que pudesse ser contestado com documentos irrefutáveis da arqueologia comprovam que os personagens da bíblia foram reais. (REIS, 1918, p. 17) Os documentos mudos, mas eloqüentes, da arqueologia comprovam que Moisés e Abraão como os demais heróis da Bíblia, são todos históricos como César e Napoleão. Nas hipotéticas asserções do racionalismo anti- bíblico é que se encontram não só as negras jaças de mitos muito autênticos’ da falta de caráter em tais arquitetos da descrença. 55 Novaes cita Lenormant: Não é em conclusão, o que resulta da conformidade das fontes politeístas com o Gênesis, que ela seja rigorosamente histórica, porque só a Bíblia nos oferece a verdade obscurecida por toda parte, porém, muito ao contrário resulta do confronto que ela é puramente mítica e que o mito Bíblico não tem maior autoridade que as tradições de outros povos (NOVAES4, apud REIS, 1918, p. 24). A afirmativa de Lenormant de que a Bíblia oferece verdades obscurecidas, citado pelo Dr. José Campos, contradita pelo próprio autor e, em outra edição, onde o mesmo autor se contradiz quando faz afirmação: “[...] não hesita-se de proclamar que o dilúvio é Bíblico, longe de ser um mito, foi um fato histórico real” [...] (REIS, 1918, p. 27). Com essa contradição Álvaro Reis mostra ao seu oponente que o Sr. Lenormant desmentiu a ele próprio, e faz menção de diversas outras autoridades assiriólogas e Egiptólogas: Um deles é o Dr. Brugsch-Bey, acrescentou outro documento literário sobre Egiptologia, que muito obriga aos estudantes da Bíblia. No Deutsch Rundschau de maio de 1890, p. 237-254, ele publicou um artigo sobre José do Egito, no qual, com argumentos e detalhes novos, e datas, reitera a convicção da histórica exatidão do Gênesis, 37, que ele já havia sustentado na história do Egito no tempo dos Faraós (EVANGELISTA5, apud REIS 1918, p. 28) Outro é M. Nasville que em 1883, dissipou toda dúvida quanto ao local de Succot, o ponto de partida do Egito, Através de explorações científicas, tem-se os três ângulos do Êxodo: Succot, Sinai e Kadesh e isto devido aos esforços de pessoas como o Dr. Trumbull, ou de sociedades científicas como a do Fundo de Explorações no Egito. João Boyle, Artigo sobre o Pentateuco, publicado no Evangelista, 1890. Os Egiptólogos mais profundos reconhecem a perfeita concordância que há entre a Bíblia e as inscrições monumentais do Egito. “Entre eles, Lepssius, Brugsch, 4 NOVAES, José de Campos, Diário de Campinas. 5 EVANGELISTA, nº 57, ano II, José e os Monumentos do Egito. 56 Chabas, Naville, Patrie, Birch, e muitos outros dos mais eruditos, neste ramo da arqueologia, sempre consideram a Bíblia como livro histórico genuíno e verídico, que merece confiança”. (EVANGELISTA6, 1890 apud REIS, 1918, p. 28). Segundo Álvaro Reis essa tese do Dr. José de Campos Novaes, pela qual procura mostrar que as tradições Bíblicas têm suas origens na Caldéia, é falsa. Ele diz que as tradições Bíblicas merecem toda confiança porque são confirmadas pela ciência, por meio de arqueologia. Sobre essas tradições o Assiriólogo Vigouroux, mostra que antes de Moisés a tradição narrada no Gênesis, já existia em sua totalidade e em seus detalhes, e, até em seu plano. Em presença de narrações tais como a de Moisés e a da Caldéia, pergunta-se, naturalmente, de onde procederam. [...] Quem poderá independentemente mesmo da inspiração divina, e colocando-se em terreno puramente científico, negar que as tradições bíblicas são mais puras e mais aproximadas à fonte originária que as tradições caldáicas? [...] é a Bíblia que deve fornecer, em boa crítica, o critério purificador das tradições corrompidas da Mesopotâmia [...] (VIGOUROUX7, apud REIS, 1918, p.32). Parece-me que o ponto central da discussão está relacionado exatamente à autenticidade do Pentateuco. Por isso ver-se-á qual foi a crítica ou acusação feita pelo Dr. José Campos e quais os argumentos usados por Álvaro Reis em sua refutação. Campos nega a autenticidade do Pentateuco, afirmando não ter sido escrito por Moisés, e para isso usa dos seguintes argumentos: 1. Porque a análise comparativa dos diversos períodos da evolução lingüística, afirma que o Pentateuco é obra de muitas mãos, de autores, línguas e estilos, traduções, tendências, mitos e fatos históricos diversos, impossíveis de serem colecionados por uma só mão; 2. Porque no Pentateuco há passagens cujas narrações pertencem a tempos 6 EVANGELISTA, nº 57, ano II, José e os Monumentos do Egito. 7 VIGOUROUX, art. La Bible et les Decouvertes, vol. I, p. 209 e 211. 57 posteriores aos de Moisés, nada mais sendo, portanto, que uma compilação; 3. Finalmente porque os estilos Elohista e Jehovista, descobertos por Astruc comprovam esse seu modo de pensar. Dois, portanto, são os ataques contra o Pentateuco: 1º. - O Pentateuco testifica contra si mesmo; 2º. - A Filologia prova que o Pentateuco não foi escrito por Moisés. Primeiro diz esse contendor, no Deuteronômio acha-se o seguinte verso “Era, pois, Moisés de idade de cento e vinte anos quando morreu” (DEUTORONÔMIO 34:7). Ora está claro, um defunto não pode escrever, logo Moisés não podia ser autor do Pentateuco. Já encontrou, porventura, esse contendor quem afirmasse que esse versículo do Deuteronômio fosse escrito por Moisés, para trazê-lo como prova contra a autenticidade do Pentateuco? Incontestavelmente não, porque os intérpretes da Sagrada Escritura são unânimes em afirmar que não só esse versículo, mas todo capítulo 36 do Deuteronômio foi escrito por Josué. Até na Bíblia traduzida pelo Padre Antonio Pereira de Figueiredo se depara com a seguinte nota no versículo 5: - “E morreu Moisés [...]. Tudo o que nesse capítulo se diz que passou depois da morte de Moisés, o incógnito da sua sepultura, o nojo que tomou o povo, o seu elogio; tudo foi escrito e acrescentado, ou por Josué, ou por Esdras.” (FIGUEIREDO8, apud REIS, 1918, p. 66) E porque existe esse pequeno necrológio, como é comum, até em nossos dias, quando se publicam obras inéditas, pode-se porventura, contestar a autenticidade do Pentateuco? Não, necessariamente não. Logo o primeiro ataque do Sr. doutor foi incontestavelmente em vão! 8 FIGUEIREDO, Pe. Antonio Pereira, Tradução da Bíblia, vol. 1, p. 609. 58 Segundo – A outra passagem é a seguinte: - ‘E estes são os reis que reinaram em Edom antes que reinasse rei algum sobre os filhos de Israel (GÊNESIS 36:31). Ora esta passagem nada prova contra Moisés ter sido o escritor de Gênesis; primeiro porque ele, como profeta, podia por inspiração de Deus, saber que mais tarde existiriam reis entre os israelitas. Se ele pode profetizar a vinda do Messias, fazendo ciente de que Cristo havia de ser posteridade da mulher, havia de ser profeta, e como ele, libertador; se ele podia determinar com precisão, o tempo em que deveria aparecer aquele que era a expectativa das gentes, e que seria quando o cetro não estivesse nas mãos de Judá, fato que realmente se consumou visto como quando Jesus nasceu, Jerusalém estava sob o cetro de Herodes, um edomita, e a palestina estava sob o governo de César, um pagão, porque, Sr. doutor, não poderia Moisés prever, como profeta, o governo real em Israel? E o patriarca Jacó, em seu leito de morte, antes de Moisés, profetizou o governo real entre os Hebreus (DEUTERONÔMIO 18:15 e GÊNESIS 49:10). E além disso, quando Moisés escreveu essa parte da tradição, foi com o fim de dizer quais foram os primitivos reis de Edom, então no tempo de Abraão, e antes do estabelecimento dos israelitas, como nação constituída e nada mais. Vê-se, pois, que esse ataque também não feriu o alvo. Terceiro – A outra passagem, que é uma objeção levantada por Spinoza contra a autenticidade do Pentateuco, é a seguinte: São estas as palavras que Moisés disse a todo Israel na Banda Daquem do Jordão na planície do deserto, defronte do mar vermelho (DEUTERONÔMIO, 1:1). Esta passagem, é verdade, está mal traduzida, não deve ser daquém do Jordão. Esta palavra foi examinada pelo filólogo Santos Saraiva, que assim a 59 traduziu – Região Transjordânia. A palavra ‘Be Eber’, é aqui nome e não preposição. E assim como uma pessoa, que reside no Além-Tejo, não diz que esta no Aquém- Tejo, assim Moisés, estando na região chamada Transjordânica não podia chamá-la Aquém-Jordânica, pelo simples fato de estar aquém do Jordão. Além do veredito desta grande autoridade, chama-se a atenção do ilustrado contendor para o que diz Figueiredo em uma nota a este versículo: “O hebreu costuma dizer simplesmente: intransito Jordanis; e a voz trânsito, bem se vê que é relativa a ambas as bandas; e que o lugar em que se considera o Escritor Sagrado é o que deve determinar qual é”9. Logo Sr. doutor, Moisés não cometeu erro , mas foi V. Sª. que errou, e esta é a triste e incontestável verdade, ao invés de ferir a autenticidade do Pentateuco, feriu-se a si mesmo. Foi na verdade um ataque desastroso. Quarto - Veja-se, o último esforço – O Pentateuco contra si mesmo. Cita o Sr. doutor a seguinte passagem: “Ora os Cananeus ocupavam, então o país”. Diz o doutor, não foi Moisés quem escreveu isto, porque só o seu sucessor, Josué, os expeliu do país. Consultada essa passagem à luz do hebraico, disse-nos o erudito Santos Saraiva que ela simplesmente designava os Cananeus como os primitivos habitantes do país. Vê-se, pois, que o Pentateuco, depois deste tremendo assalto, permanece incólume e que, infelizmente, foi o assaltante que saiu ferido e um tanto envergonhado, por falar de coisas conhecidas a mais de cem anos, como se fossem novas, porque, as ignorava. Desejando atribuir erros a Moisés, quando o Sr. doutor é que pelas colunas do Diário de Campinas, desastradamente os cometeu. 9 Os Setenta traduziram assim “To Peran ton Jordanon, o alem do Jordão. Veja, William, Genenius. Lexicon-verbo Be Eber, p. 760. 60 O segundo assalto denomina-se – A Filologia comparada prova que o Pentateuco não foi escrito por Moisés. O Sr. doutor critica Moisés por ser o codificador dos mesmos assuntos várias vezes, na mesma obra. E assevera ainda que o Deuteronômio está cheio de leis casuísticas e utopistas. Refere-se o ilustre antagonista ao Decálogo. Confrontando-se o Decálogo do Êxodo capítulo 20, com o Decálogo em Deuteronômio, capítulo 5, nada se encontra de casuístico e utipístico. O mesmo se dá com as leis judiciais, de cujo confronto resulta, que, num outro lugar, estão mais ou menos explícitas ou ligeiramente elucidadas. O mesmo se dá, ainda, com as leis cerimoniais, mas o que não existe é essa sutileza, utopia, e casuística, a que o doutor se refere. Deuteronômio é a conclusão do Pentateuco; é a elocução do profeta, despedindo-se do seu povo e, como tal é natural que seja mais resumida, porém, explícita. O Dr. José de Campos Novaes diz que: é impossível às leis de um povo foragido, apenas saído da dura escravidão, sem agricultura, nem rebanhos, a prova é que viviam do maná; e no entanto pudessem sustentar o pessoal do Tabernáculo no Deserto, sem rebanhos para o sacrifício e muito menos ainda sem que o sacerdócio tivesse organização hierárquica do templo de Jerusalém, eles que nada de semelhante tinham organizado, mesmo durante os juízes. (REIS, 1918, p. 69). Refutando-o disse Álvaro Reis: Mas, o que tem as leis de um povo foragido com os desertos, e rebanhos, e agriculturas, e templos, e sacerdotes. Destes argumentos conclui o distinto contendor que o Pentateuco é uma compilação, do livro das guerras de Jeová, e cita na Bíblia, Números capítulo 21 versículo 14. Vê-se, o comentário do padre Antonio Pereira de Figueiredo: “No Livro das Guerras do Senhor – Santo Agostinho na sessão 42, sobre números é de parecer que este era um livro em que estes mesmos povos tinham escrito a história da nação e, em particular, a guerra de que aqui se trata”. (REIS, 1918, p. 69). 61 “Calmette inclina-se a crer que o que Moisés aqui chama de Livro das Guerras do Senhor, não era outra coisa senão as Memórias ou as Escrituras, que destas guerras se conservam nos arquivos, ou cartórios públicos dos Hebreus, como pois, foram os Livros dos Anaes dos Reis de Judá e Israel que freqüentemente são citados nos Livros dos Reis” (REIS, 1918, p. 70). Mas os doutores judeus não reconhecem aqui livro algum particular. Eles traduzem o Hebreu Sepher, por conto, relação. Por isso se diz: Na relação das guerras do Senhor, etc. FIGUEIREDO10 (apud REIS, 1918, p. 70). Além destas ponderações, é justo perguntar se um autor, por fazer uma citação, por se referir a um fato registrado em um livro, se por isso é um compilador?. Ouvindo o que diz o lexicógrafo Moraes: - “Compilação – Obra composta de extratos de diversos autores” (REIS, 1918, p. 70). Ora, porque no Pentateuco o Sr. doutor encontrou uma citação, ou antes, uma referência, poderá por isso concluir que Moisés foi um simples compilador? Pasma-se de um doutor, um jurisconsulto , vir por um jornal tão lido, dizer tamanho disparate, e vem dizer que esse é um argumento forte contra a autenticidade do Pentateuco. Outra questão levantada pelo Dr. José Campos de Novaes, contra a autenticidade do Pentateuco é a dos estilos. Dois, são porém os partidos principais da alta crítica: unitaristas e fragmentaristas. Os unitaristas lutam pela absoluta unidade de estilo do Pentateuco, estilo de Moisés; Os fragmentaristas reconhecem no Pentateuco e em cada livro diversos estilos que denominam Elohista e Jeovista, e Deuteronomista , significando diversos autores anteriores a Moisés. Descoberto pelo médico Jean Astruc, que em 1753, estudando os livros do Pentateuco, observou que, em certas narrações, Deus é chamado de Elohim e, em outras, é chamado Jehovah. Desde então se tornou um assunto muito estudado e discutido pela alta crítica. 10 FIGUEIREDO, Pe. Antonio Pereira, Tradução da Bíblia, vol. I, p. 451. 62 Entre os críticos fragmentaristas pode-se citar os seguintes: De Wette , Bleek, Stahelim, Tuch, Lengerk, Hapfield, Knobel, Bunsen, Hurtz, Delitzch, Schultz, Vaihinger, Lenormant e outros. (REIS, 1918). De todos os estilos, uns admitem dois; outros três; outros quatro, outros cinco e outros ainda mais. Alguns que admitem o mesmo número de compositores, não concordam quanto ao tempo em que foram escritos os textos criticados. Uns admitem escritores posteriores a Moisés e outros anteriores, ou também contemporâneos de Moisés. Uns julgam que tal porção é Elohista, apesar do uso do nome Jehovah e vice-versa; No capítulo vinte do Gênesis, contém o nome de Elohim cinco vezes e Jehovah duas vezes: contudo Knobel, acha que essa parte do Gênesis pertence ao autor Jehovista, e Tuch e Delitzch a consideram como própria do autor Elohista. A narrativa do Gênesis, desde o capítulo vinte e oito e versículo dez, até o capítulo trinta e três, onde ocorrem os dois nomes, Elohim e Jehovah, preponderando o nome Elohim, Tuch a considera como Elohista; Knobel, porém, considera: nessa porção somente onze versículos e meio em seções separadas, do autor Elohista; trinta e quatro versículos do escritor Jehovista, em seis fragmentos; doze passagens destacadas pertencentes ao Livro da lei; treze seções, versículos e meio versículos pertencente ao Livro das Guerras, usado pelo autor Jehovista. Tais exemplos, diz Smith, podem ser multiplicados indefinidamente e mostram a licença ilimitada destes teoristas, e, ao mesmo tempo, francamente demonstram a incerteza e a confusão geral manifestas, por toda parte, em suas especulações. (SMITH’S11 apud REIS, 1918) É admirável ver, como os grandes críticos estão em desacordo quanto à esta numerosa questão de estilos, como diferem extraordinariamente em um mesmo 11 Smith’s Bible Dictionary, Vol. III, p. 24-26, Verbo Pentateuco 63 capítulo, em um mesmo versículo e, até em meios versículos, a ponto de muito razoavelmente se duvidar da seriedade e da convicção desses sábios, cujo saber e erudição, não se pode, entretanto, contestar. Mas o que é incontestável é que a tais especulações não se pode chamar de ciência, nem dizer que elas são verdades filológicas arrancadas pelo escapelo frio da ciência. O seu verdadeiro nome é especulação e nada mais. Estes críticos chegaram a esses interessantes resultados, embora contraditórios, depois de prolongadas vigílias, depois de examinar os documentos originais, depois de maduras reflexões e demoradas investigações; mas o ilustrado contendor jamais examinou o original hebraico das Escrituras e do hebreu nada sabe, muito menos do caldeu. É justo, pois, perguntar-se: como chegou o Sr. doutor à convicção da teoria fragmentarista, sem conhecer o hebreu e o caldeu e sem ter senão um superficialismo conhecimento de Assiriologia? Será possível chegar-se à convicção dessa teoria simplesmente por ler as obras de Lenormant, Scharader e Menánt, quando se conhece a grande diversidade de opiniões entre os mestres do alto criticismo?. O contendor, neste caso, não passa de um simples aventureiro. A maior parte dos críticos do partido fragmentarista admite, no Pentateuco, dois estilos: Elohista e Jehovista. Será isto o bastante para o Pentateuco não ser autêntico?. Incontestavelmente não. Primeiro, porque os livros diferem muito entre si quanto ao seu conteúdo. O Gênesis é exclusivamente tradicional, portanto, pode ter diversidade de estilo, como os tem a História Universal de Cantu, sem por isso deixar de ser autêntica. O Êxodo é o livro que trata dos fatos sucessivos durante a saída e o intinerário dos israelitas; 64 foi escrito no deserto, e podia ser por Josué, ou por Arão, sob a direção de Moisés, variando por isso o estilo, sem deixar, entretanto, de ser autêntico. O mesmo poderia dar-se com outros livros escritos por Moisés, ou mesmo sob a direção de Moisés, sem, por isso, deixarem de ser autênticos12. Segundo, porque a distinção de estilos no Pentateuco tem por base principal o emprego das palavras Elohim e Jehovah. Incontestavelmente isso não é razão bastante para ser atribuído a diversos autores. Assim, como hoje, pode-se nos livros, referir a Jesus, denominando-O: Cristo, Emmanuel, Senhor, Salvador, Redentor, Deus, etc., sem que por isso, deixem de ser autênticos os escritos, do mesmo modo Moisés poderia, à sua discrição, empregar os nomes Elohim e Jehovah, sem que por isso, deixassem de ser autênticos os cinco livros que compõem o Pentateuco. Terceiro, uma obra pode ser compilada e ser autêntica. Moisés poderia servir- se para a composição do Gênesis de escritos antigos de Abraão, ou de Jacó, ou de qualquer outro patriarca, sem que, por isso, deixassem de serem autênticos os seus livros. Se o Pentateuco não é obra de Moisés, como explicar o fato de todos os escritores bíblicos atribuírem a ele essa obra, chamando-a de “Lei de Moisés”; como se lê em Josué: “Tão somente sê forte e mui corajoso para teres o cuidado de fazer segundo toda lei que meu servo Moisés te ordenou; [...]” e outros textos.13 12 Várias epístolas de Paulo foram escritas por seus companheiros sob sua direção ou ditado; e não é por isso que deixam de ser autênticos. Homero e Milton ditaram livros cuja autenticidade só um ato crítico poderia contestar. Moisés escreveu esses livros, provavelmente em vários períodos de sua longa vida. O Gênesis, talvez fosse escrito aos 40 anos de idade, lá em Midiam, junto de seu sogro Jetro, que lhe passaria as tradições dos antigos patriarcas. O Êxodo foi escrito no deserto, aos oitenta anos de idade, em caminho para Canaã. O de Números e Levítico, durante esse período organizador da futura nação. O livro de Deutoronômio , foi escrito no fim de sua vida, quando já contava mais de cem anos. Não deveriam, portanto, esses livros trazer o cunho de tão grande diferença na idade de seu autor. 13 Bíblia, Josué 1:7; I Reis 2:3; 30:16; 31:3; Esdras 3:2, Neemias 10:34; Daniel 9:13; Is 5:24; 63:7-19; Jeremias 15:1; 44:23; Amós 2:4; Ezequiel 22:26; Oséias 8:1; Malaquias 4:4; Mateus 19:7; 22:24; 34- 40; Marcos 10:3-12; 12:19-34; Lucas 16:29; 18:20; 20:28, 37; 24:27; J0 1:17; 3:14; 5:45-46; 6:32; 7:19, 22-23; 9:28-29; Atos 3:22; 6:11-14; 7:20, 32-37; 13:39; 15:1-5; 2 Corintios 3:13; 2 Timóteo 3:8; Hebreus 3:2; 9:19; 10:28; 11:23; 12:21; Judas 9; Apocalipse 15:3. 65 Afirmavam os fragmentaristas a suposição, a hipótese de ser o Pentateuco obra de diversos autores por causa dos supostos estilos que aí encontraram, como localizaram, por exemplo, em Homero. Sedentos de luz, leram as inscrições coneiformes de Babilônia e, então, pasmados e boquiabertos ficaram quanto à mesma questão de estilos. A respeito da questão do Gênesis caldaico, diz Vigouroux: veio destruir as conseqüências que os incrédulos pretendiam tirar dele. “A lenda babilônica nos mostra que, antes de Moisés, a tradição descrita no Gênesis existia em sua totalidade e em seus detalhes e, até, em seu plano. O poema coneiforme contem tanto a descrição Elohista dos seis dias da criação, como os traços da redação Jehovista da queda do homem, como o veremos bem cedo. Não é mais possível, pois, tirar do emprego destes dois diferentes nomes de Deus uma pretendida prova de que Moisés não os pudesse escrever, pois esta contestado que as duas narrações existiam na tradição anterior a Moisés (VIGOUROUX14 apud REIS, 1918, p. 82). Moigno 15(apud REIS, 1918) diz: As duas narrativas caldaicas da criação e do dilúvio tem uma grande importância. Elas confirmam, com o brilho da verdade, a narração de Moisés, que é o eixo da tradição primitiva. Elas são importantes, ainda, sob um outro ponto de vista. Porque Deus é chamado no Gênesis tanto Elohim, como Jehovah, os exegetas livres pensadores, alemães, principalmente apoiando-se, , além disso, sobre a forma da redação, quiseram concluir, daí, que o Gênesis incluía documentos de duas naturezas: Os documentos Elohísticos, que são os mais antigos, e os documentos Jehovísticos, que são posteriores a Moisés, e que, portanto, o legislador dos Hebreus não é o autor integral de Gênesis. Quanto tem-se que se abalar aos arestos da crítica obrigada a se desmentir de um dia para o outro! Mr. Lenormant, sábio crítico, que admite a distinção do Elohismo e do Jehovismo, escreveu isto:-“ Um só ponto me parece hoje quase estabelecido, e isto pelas mais recentes críticas, contraria a opinião que por muito tempo prevaleceu, é que o Jehovista, qualquer que seja a data precisa, é notavelmente anterior ao Elovista; que seu escrito representa em realidade o livro mais primitivo sobre as origens de Israel, sua 14 VIGOUROUX, La Bible et les decourvertes modernes, Vol. I, p. 211. 15 MOIGNO, Leo Livres Saint et La Science, p. 610 66 partida do Egito e seu itinerário no deserto Lenormant16 (apud REIS, 1918). O que está perfeitamente estabelecido é que todas as circunstâncias da narração de Moisés, da criação e do dilúvio, tanto aquelas passagens Elohistas como as circunstâncias das passagens Jehovistas estão todas consignadas nos livros coneiformes da Assíria; e como estes livros remontam a dois mil anos antes da era cristã, segue-se que estas circunstâncias eram muito bem conhecidas e narradas muito antes de Moisés. O legislador dos hebreus podia, pois, tê-las conhecido, como conhecidas eram na Assíria, e a suposição de um escritor Jehovista ter interpolado seus escritos no Gênesis, segundo Moisés, é uma fábula como somente os sábios livres pensadores podiam inventar, mas uma fábula que caiu de sua falsidade sobre a sua ciência assiriológica” Moigno17 (apud REIS, 1918). Eis aí Sr. Dr. José de Campos Novaes, como ainda uma vez mais o escapelo da ciência veio patentear a fatuidade das especulações da alta crítica contra o Pentateuco. Eis aí, como mais uma vez se confirmou o que Paulo disse a respeito da sabedoria do seu tempo e de todos os tempos: “[...] Porventura não tornou Deus louca a sabedoria do mundo?” (CORINTIOS, 1:20 ). A seguir, aborda-se a polêmica do Dr. Augusto José da Silva e de Fred Figner, a respeito do “Espiritismo”. Em 1894 e 1915, nas pessoas do Dr. Augusto José da Silva e de Fred Figner, respectivamente, defensores das doutrinas do espiritismo, entraram em confronto polêmico com Álvaro Reis, usando a própria Bíblia em textos isolados, fora do seu contexto, afirmando ser os profetas, os apóstolos e outros líderes bíblicos, autênticos médiuns espíritas da antiguidade. 16 LENORMANT, Les Origines de l’Hisrtoire p. 15 17 MOIGNO Les Livres saints et la science. p. 610 67 Em sua refutação Álvaro Reis, conclama aos adversários que nas próprias Escrituras, estará provando, de um modo incontestável, a divindade de Jesus Cristo, a falsidade das reencarnações e que o Espiritismo não é doutrina Bíblica. Esta polêmica que se estendeu por volta de dois anos, trouxe como conseqüência a formação de um livro que foi editado no ano de 1916 sob o título O Espiritismo. A Polêmica com o Dr. Augusto José da Silva, foi bastante extensa. Foi dividida em três partes, sendo que a primeira parte, onze cartas, a segunda doze cartas e a terceira onze capítulos. A refutação de Álvaro Reis contra a tese do Dr. Augusto que nega a divindade de Cristo. O pastor polemista afirma que a divindade de Cristo é a verdade fundamental do cristianismo. Negar a divindade de Cristo é tornar a Igreja Cristã uma Igreja idólatra, pois, sua fé, seu culto e seu Deus se concentram na pessoa de um homem. Se Cristo não é divino, o cristianismo nada mais é que uma enorme aberração. ”[...] os espíritas aceitam a Bíblia, em parte, tanto assim que, Allan Kardec, em seu evangelho espírita, nos diz que ‘os espíritos são invocados para explicar os evangelhos’. O evangelho espírita pode se dizer é uma coleção de passagem da Escritura, comentadas segundo o Espiritismo“. (REIS, 1916, p. 6). Limitar-se-á ao relato de parte das onze primeiras cartas. Basicamente essa primeira parte do debate se limita a quatro pontos principais: Primeiro - o que ensinaram os profetas do Velho Testamento, acerca do Messias Jesus Cristo. Segundo - o que ensinaram os apóstolos no Novo Testamento acerca de Jesus Cristo. Terceiro - o que Jesus Cristo diz de Si mesmo. 68 Quarto - o que o espiritismo afirma de Jesus Cristo. Só há uma maneira correta de chegar à verdade nesta questão de vital importância para os cristãos verdadeiros e defensores da Bíblia como única regra de fé e conduta, é um debate à luz da própria Bíblia e seu contexto, evitando assim todas as especulações, como ele mesmo afirma “sem entrarmos no caminho interminável das especulações filosóficas” (REIS, 1916, P. 6). Neste primeiro ponto, inicia sua refutação citando textos bíblicos, acompanhado de explicações. Os profetas predizem o advento do Messias. Moisés, do aparecimento d’Ele como “[...] descendente da mulher [...]” (GÊNESIS 3:15). Moisés ainda mostra as palavras de Jacó que, em seu leito de morte, prediz o advento do Messias, caracterizando esse tempo, pelo destronamento da tribo de Judá, fato que se realizou, porque, quando Jesus nasceu, Herodes um edomita, ocupava o trono da Palestina, que estava sob o governo de César, um pagão.“ (REIS, 1918, p. 7) [...] a ele obedecerão os povos [...]” (GÊNESIS 49:10). Salmos messiânicos, profetizaram e se cumpriu; Jesus é Deus, é Rei, é profeta, é sacerdote (SALMOS, 109:1-5; 2:7; 45:6-7). “[...] eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho e se chamará Emanuel” (ISAÍAS 7:14). Outros textos (ISAÍAS, 9:6 e v. 53). Diante destes textos, pode-se aprender através dos profetas do Velho Testamento que Jesus é o Messias, é desde a eternidade, é o que cumpre as visões e profecias, porque ele é Deus. No segundo – Ver-se-á se o que ensinaram os apóstolos no Novo Testamento acerca de Jesus Cristo, está de acordo com os ensinamentos dos profetas no Velho Testamento. O apóstolo João afirma que Jesus Cristo é eterno “No principio era o verbo, e o verbo estava com Deus, e o verbo era Deus [...]” (Bíblia João, 1:1-18). Ainda aqui em João lê-se “[...] o unigênito, que está no ceio do 69 Pai [...] (Bíblia. 1:18). Filho Unigênito do Pai, Se Jesus é Unigênito do Pai, logo é Deus, porque assim como gênito do homem é homem, assim o genito de Deus é Deus. Escuta-se o que diz João Batista, que para os espíritas, é Elias, o vidente, o profeta reencarnado, espírito superior e prestigiado com autoridade de um espírito enviado ao mundo em missão especial de preparar o caminho para o Messias: “ [...] Eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. É este a favor de quem eu disse: após mim vem um varão que tem a primazia, porque já existia antes de mim . Eu mesmo não o conhecia, mas, a fim de que ele fosse manifestado a Israel, vim, por isso, batizando com água. [...] vi o Espírito descer do céu como pomba e pousar sobre ele. [...] Vi e tenho afirmado que ele é o Filho de Deus” (J0 1:29-34). Aqui, João Batista, não faz afirmação sobre a divindade de Cristo, que não fosse feito anteriormente pelo profeta Daniel, João Batista diz que Jesus é o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, o profeta Daniel, profetizou que depois de setenta semanas de anos, o pecado teria o seu fim,, a iniquidade se apagaria, e a justiça eterna seria trazida e o Santo dos Santos seria Ungido. (DANIEL 9:24). Que absurdo essa afirmação do Sr. doutor espírita, dizer que João Batista é espírito encarnado de Elias. Veja-se o que o próprio João Batista diz: “ [...] És tu Elias? Ele disse: não o sou [...] (JOÃO 1:21). Disse-me o Dr. Augusto, e dizem todos os espíritas, que Jesus Cristo é um Espírito Superior, o maior e o mais aperfeiçoado que jamais pisou aqui na terra. Ora, se Jesus Cristo é um Espírito Superior devia compreender o alcance moral de Suas doutrinas e do que afirmou de Si, e portanto, devia expressar-Se em termos bastante claros para que seus discípulos não fizessem inferências ou conclusões errôneas a Seu respeito. Sabe-se também que a linguagem de Jesus é tão clara que arrebatava as multidões. Portanto as conclusões que se tira é esta: Se 70 Jesus foi espírito superior, haveria de expressar-se com maior clareza possível, os seus discípulos O compreenderam e, nesse caso, Jesus Cristo é Deus. Se, porém, Jesus não soube expressar e nem compreendeu o alcance de Suas palavras, que O fizeram divino para patriarcas, profetas e apóstolos, então, é um espírito tão inferior que nem, ao menos, soube expressar-Se ou fazer-se compreender. “E neste caso o Espiritismo falta com a verdade quando afirma que Jesus Cristo é Deus relativo”. (REIS, 1916, p. 14) Terceiro – Veja-se o que Jesus Cristo diz de Si mesmo – Jesus Cristo, com Sua benigna e poderosa Palavra, arrebatava as multidões. Ele era tão humilde quanto sublime, quando revelava as mensagens do Pai. “[...] Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma” (MATEUS 11:29). Perguntou Jesus “[...] que diz o povo ser o filho do homem [...] E eles responderam: uns dizem: João Batista; outros: Elias; e outros:Jeremias ou alguns dos profetas. Mas vós, continuou ele , quem dizeis que sou? Respondeu Simão Pedro, disse:tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. Então Jesus, lhe afirmou: Bem aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai que esta nos céus” (MATEUS,16:13-17). (REIS, 1916, p. 15). Aqui como percebe o ilustre amigo, Pedro confessa reconhecer em Jesus Cristo, o divino Messias anunciado em todo Velho Testamento. E Cristo, esse Espírito Superior, não só assentiu nessa confissão de fé, quanto a Sua pessoa, ao Seu Extraordinário caráter, mas diz que Pedro não faria e não possuiria tal crença se Deus não lhe tivesse revelado, de modo que, segundo o que afirma Jesus, Sua Divindade, Seu caráter messiânico, ser Ele Filho do Deus vivo, é uma revelação, não dos homens que o não compreenderam os seus discípulos, mas uma revelação de 71 Deus, o Supremo dos espíritos.. Outros textos (MATEUS, 10: 32, 37-41; 14:32-33; JOÃO 3:16-18; 5:21-26; 10:31-33; 14:23; 17:1-26; 20:27-28; 10:32). Quarto – Veja-se o que o espiritismo afirma de Jesus Cristo. Segundo Allan Kardec: “Filhos por toda parte esta noite glorifica-se a morte de Cristo, por toda parte se faz-se caminho errado, porque não foi sua morte que nos resgatou, foi sua vida. O sofrimento é pouca coisa, a morte nada é, algumas horas de sofrimento não são um sacrifício tão extraordinário, muitos homens o passaram, mártires de suas idéias” Evangelho Espírita. p. 7. (KARDEC18, apud REIS, 1916, p. 35) Eis a revelação do espírito de Jesus, agora atenda-se aos testemunhos dos evangelistas: - “E Jesus começou a declarar-lhes que importava que o Filho do homem padecesse muito, que fosse rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas, e fosse entregue a morte; e que ressuscitasse depois de três dias. E tudo isso lhes declarou abertamente” (MARCOS 8:31-32). Jesus, quando encarnado, falou abertamente que era necessário sofrer, morrer e ressurgir – E agora, é invocado o Seu espírito e Ele diz que a Sua morte não é nada. (REIS, 1916, p. 35). Os evangelistas, quando encarnados, e como bons espíritos, espíritos superiores, escolhidos por Cristo para o apostolado, afirmaram abertamente que Jesus lhe dissera: importava Ele padecer, sofrer, morrer; registraram que , na verdade, Jesus padeceu, sofreu, derramou o Seu sangue, morreu, foi sepultado e ressuscitou. Agora, vem estes mesmos espíritos dizer que tudo isso é ilusão, é falso, é mentira. “Os evangelistas, invocados pelo senhor Roustaing, afirmam que o corpo de Cristo era fluido, era quase material. Entretanto, estes mesmos evangelistas afirmam que Jesus mandara a Tomé que metesse a sua mão em Seu lado aberto para que se convencesse da realidade absoluta do corpo carnal de Cristo”. (REIS, 1916, P. 36). 18 KARDEC, Alan, Evangelho Espírita, p. 7. 72 Jesus afirmou que Seu sangue é derramado para remissão de pecados. João afirmou que o sangue de Jesus purifica de todo pecado. O escritor sagrado aos Hebreus disse que Jesus foi imolado uma vez só, para cancelar os pecados de muitos (MATEUS, 26:28; 1 J0 1:7; HEBREUS 9:28) Oh! doutor, quem é esse espírito de verdade que mente tão descaradamente? Quem é doutor? Quem é, senão o diabo!. Na verdade quanto mais se estuda o Espiritismo, mais se convence que ele é o último esforço diabólico contra a religião de Jesus. Na verdade o Espiritismo está em franca oposição ao Cristianismo. (REIS, 1916, p. 37). No próximo capítulo estar-se-á efetuando uma breve Análise Crítica, do texto do livro As Origens Caldaicas da Bíblia, - Autenticidade do Pentateuco, acima relatado. 73 3 ANÁLISE DISCURSIVA DA POLÊMICA DE ÁLVARO REIS 3.1 Análise – Autenticidade do Pentateuco A análise de discurso tem se constituído em uma forma de reflexão crítica à lingüística em particular, e as ciências sociais em geral. Isto porque se localiza no entremeio das cristalizações epistemológicas dessas ciências. “Como seu próprio nome indica, não trata da língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso” (ORLANDI, 2003, p. 15). A Análise do Discurso se faz na contradição da relação entre as outras disciplinas. Desse modo não se especifica claramente um lugar no reconhecimento das disciplinas. Elas não se formam entre disciplinas, mas nas suas contradições. Conforme Orlandi: Apalavra discurso etmologicamente tem a idéia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando. Na Análise do discurso, procura-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua história. (ORLANDI, 2003, p. 15). A Análise do Discurso é uma ciência que situa seu objeto, o discurso, no campo das relações entre o lingüístico e o histórico-ideológico, buscando, no interior deste campo, as determinações sociais, políticas e culturais dos processos de construção do sentido. Inicialmente a proposta de Pêcheux, o fundador da Análise do Discurso, foi tanto abrir uma fissura teórica no campo das ciências sociais, como propor uma disciplina que pudesse romper com a concepção tradicional de linguagem. 74 Pêcheux situa o quadro epistemológico da Análise do Discurso na confluência de três regiões cientificas: o materialismo histórico, a lingüística e a teoria do discurso, cabendo a uma teoria do sujeito, de base psicanalítica, atravessar e articular estas três regiões. É na contradição das relações entre essas regiões que se faz a Análise do Discurso (INDURSKY, 1997, p. 107). Segundo Indursky, análise do Discurso: É crítica primeiramente na medida em que ultrapassa os métodos próprios das disciplinas, [...]. Segundo, porque não cristaliza para si práticas metodológicas, já que permite ser afetada pelo corpus, que, na sua diversidade, acaba por exigir permanentemente deslocamentos (INDURSKY, 1997 p. 189). Nessa reflexão sobre argumentações contraditórias referente à Autoria e autenticidade do Pentateuco, chamado livro da Lei, (O Torá), Antigo Testamento da Bíblia. Encontra-se como espaço de análise, o discurso de José de Campos Novaes, advogado, e o de Álvaro Reis, pastor Presbiteriano. Em um contexto cultural, religioso, econômico e político, em plena mudança, fim do Império e a proclamação da República, todos os setores do País estavam experimentando mudanças radicais. Essas mudanças proporcionaram a possibilidade de discursos polêmicos como este que se estará analisando. Para análise dos argumentos, de negação quanto à autenticidade e Autoria do Pentateuco, referida por José de Campos Novaes em artigos publicados no Diário de Campinas, periódico da época, em 1892, e o discurso de refutação desses argumentos, feitos por Álvaro Reis, também publicados em jornal da época, 0 Puritano. Usa-se como base o texto transcrito no Capítulo anterior, parte do livro de Álvaro Reis cujo título é As Origens Caldaicas da Bíblia. Os dois argumentos para Análise são os seguintes: 75 1. O Pentateuco testifica contra si mesmo 2. A Filologia prova que o Pentateuco não foi escrito por Moisés. Nota-se que a formação discursiva, neste debate polêmico envolve uma linguagem de conceitos históricos importantes como a Arqueologia, praticada por especialistas, no intuito de provar a origem e autenticidade dos escritos Bíblicos. Para essa análise José de Campos Novaes, faz algumas leituras sobre escritos de arqueólogos importantes a respeito deste tema, e escritos da Alta Crítica 19, sua intenção era provar que o Pentateuco não tinha como autor Moisés, portanto segundo ele seus registros não poderiam ser autênticos como escritos da época em que viveu Moisés, mas de origem e autoria caldaica, contrapondo-se aos defensores da autoria Mosaica. Por outro lado, Álvaro Reis, em sua refutação, usa o mesmo tipo de argumentação com uma formação discursiva baseada também nas pesquisas arqueológicas, nos estudos realizados por arqueólogos e exegetas da Alta Crítica. Fazendo citações de especialistas usados por seu opositor, José de Campos Novaes, no qual havia baseado grande parte de seu discurso. Tentando com isso, demonstrar a fragilidade de seu opositor, principalmente no que diz respeito à compreensão da matéria em discussão, que envolve um conhecimento aprimorado das áreas de arqueologia, lingüística e exegese, áreas 19 Este termo descreve o estudo das Escrituras do ponto de vista da literatura, em contraste da “baixa crítica” que trata do texto das Escrituras e sua transmissão. A Alta Crítica tem três interesses principais: a) detectar a presença de fontes literárias que subjazem uma obra; b) detectar os tipos literários que perfazem a composição; e c) fazer suposições sobre questões de autoria e data. A fim de obter uma compreensão apropriada da natureza dos escritos bíblicos, é importante examinar o caráter das fontes. O reconhecimento de vários tipos de literatura também é importante, porque podem ser comparados com seus equivalentes seculares. Assim estatutos legais no Antigo Testamento freqüentemente tem muita coisa em comum com os de outras nações do Oriente Próximo, ao passo que as cartas do Novo Testamento podem ser melhor compreendidas por uma comparação com aquilo que se sabe a respeito da forma, estilo e linguagem das cartas seculares dos séculos I d.C. O fato de uma obra ser atribuída a um determinado autor não significa necessariamente que foi escrita por aquela pessoa. 76 estas que, segundo Álvaro Reis, Campos não dominava, limitando-se a sua argumentação à pesquisa de algumas obras, com ênfase nos escritos do assiriólogo e egiptólogo Francois Lenormant. Ao examinar o discurso dos dois contendores, percebe-se que a formação discursiva de cada um está ligada à formação ideológica, conforme diz Orlandi: A formação discursiva se define como aquilo que numa formação ideológica dada, ou seja, a partir de uma posição dada em outra conjuntura sócio- histórica dada, determina o que pode e deve ser dito, [...] O discurso se constitui em seu sentido porque aquilo que o sujeito diz e inscreve em uma formação discursiva e não outra para ter um sentido e não outro. Por ai podemos perceber que as palavras não têm um sentido nelas mesmas, elas derivam seus sentidos das formações discursivas em que se inscrevem. As formações discursivas, por sua vez, representam no discurso as formações ideológicas (ORLANDI, 2003, p. 43). Embora a argumentação discursiva de ambos seja construída a partir dos fatos históricos e culturais registrados na Bíblia, pode-se perceber que a formação ideológica de cada um diferem, principalmente do ponto da visão que cada um possui do objeto do seu discurso. Faz-se então a análise do primeiro ponto afirmado por Campos. 1. O Pentateuco testifica contra si mesmo Campos nega a autenticidade do Pentateuco, afirmando não ter sido escrito por Moisés, e para isso usa dos seguintes argumentos: a. Uma análise comparativa dos diversos períodos da evolução lingüística, afirma que o Pentateuco é obra de muitas mãos, de autores, línguas, estilos, traduções, tendências, mitos e fatos históricos diversos, impossíveis de serem colecionados por uma só mão; usa como referencia o Assiriólogo inglês, François Lenormant, no qual apóia seus argumentos. b. No Pentateuco há passagens cujas narrações pertencem a tempos posteriores aos de Moisés, nada mais sendo, portanto, que uma compilação; 77 c. Os estilos Elohista e Jehovista, descobertos por Astruc, comprovam esse seu modo de pensar. Diante de tais afirmativas, o polemista Álvaro Reis em seu discurso, faz a refutação, procurando por intermédio de uma pesquisa profunda e detalhada, partindo da leitura de arqueólogos e lingüistas especialistas no estudo das regiões e povos antigos, registrados na Bíblia e outros manuscritos do período. Procurou a ajuda do filólogo, Santos Saraiva, quanto ao estudo e interpretação da língua por meio da análise de documentos. Dentre outros na formação de Álvaro Reis encontra-se nomes como; Brugsch-Bey, M. Nasville, Trumbull, Lepssius, Brugsch, Chabas, Naville, Patrie, Birch e Vigouroux, assiriólogos e Egiptólogos, todos eruditos e autoridades na arqueologia destas regiões. João Boyle afirma que muitos arqueólogos e eruditos consideram a Bíblia um livro histórico de confiança (BOYLE20 apud REIS, 1918, p. 29). Os Egiptólogos mais profundos reconhecem a perfeita concordância que há entre a Bíblia e as inscrições monumentais do Egito. [...] e muitos outros dos mais eruditos, neste ramo da arqueologia, sempre consideram a Bíblia como livro histórico genuíno e verídico, que merece confiança Álvaro Reis, procura demonstrar, em seu discurso, estar preparado e capacitado para combater seu contraditor, inclusive se utilizando dos próprios argumentos, que contra ele fora usado, buscando refutá-los com empenho e determinação. Usou a própria obra do Assiriólogo François Lenormant, que fora usada como referência por Campos para apoiar seus argumentos, demonstrando contradição, no que afirmava em outra edição de sua obra. Isto é, uma vez afirma que na Bíblia há mitos, depois na mesma obra em nova edição diz não haver mitos. 20 BOYLE, John, O Egito e o Pentateuco, artigo publicado no jornal Evangelista 05/out./1890. 78 A afirmativa de Lenormant de que a Bíblia oferece verdades obscurecidas, citado pelo Dr. José Campos, contradita pelo próprio autor e em outra edição, onde o mesmo autor se contradiz quando faz afirmação: [...] não hesitamos de proclamar que o dilúvio é Bíblico, longe de ser um mito, foi um fato histórico real [...] ( REIS, 1918, p. 27). O que vai ficando cada vez mais claro, no discurso do polemista Álvaro Reis, é que desde o início de sua refutação, pode-se notar que a formulação discursiva veio sendo construída sobre a ideologia-histórica21.·. Ainda no seu primeiro argumento onde Campos, afirma que o Pentateuco testifica contra si mesmo. Para tentar autenticar seus argumentos, faz citações bíblicas como: Era, pois, Moisés da idade de cento e vinte anos quando morreu; Estes são os reis que reinaram em Edom antes que reinasse rei algum sobre os filhos de Israel; São estas as palavras que Moisés disse a todo Israel na Banda Daquem do Jordão na planíncie do deserto, defronte do mar vermelho (DEUTERONÔMIO 34:7; GÊNESIS 36:31; Dt 1:1) Contrapondo o seu contendor, Reis usa de ironia, referindo ao texto da morte de Moisés: Ora esta claro, um defunto não pode escrever, logo Moisés não podia ser autor do Pentateuco. Na verdade em lugar nenhum lê-se que esse texto de Deuteronômio tenha sido escrito por Moisés. Reis mostra que exegetas e interpretes da Bíblia afirmam que o autor de todo capítulo 34 de Deuteronômio foi Josué. Reis faz citação de um comentário de Deuteronômio 34:5, na Bíblia traduzida pelo Padre Antonio Pereira de Figueiredo22 (apud REIS, 1918, p. 66) E morreu Moisés [...]. Tudo o que nesse capítulo se diz que passou depois da morte de Moisés, o incógnito da sua sepultura, o nojo que tomou o povo, o seu elogio; tudo foi escrito e acrescentado, ou por Josué, ou por Esdras. 21 Ideologia-histórica – Seu discurso estava baseado sobre a autenticidade dos escritos Bíblico, como registros históricos, feitos por Moisés. Era esta a sua apologia, tanto os registros Bíblicos como seus personagens, eram reais, e não mitos e lendas. 22 FIGUEIREDO, Pe. Antônio Pereira, Bíblia Traduzida vol. 1, p. 609. 79 Sobre este texto: “Estes são os reis que reinaram em Edom antes que reinasse rei algum sobre os filhos de Israel”, usado na argumentação de Campos, a fim de negar que o livro de Gênesis tenha sido escrito por Moisés. Reis, em sua refutação, afirma que quando Moisés escreveu essa parte da tradição, foi com o fim de dizer quais foram os primitivos reis de Edom, então no tempo de Abraão, e antes do estabelecimento dos israelitas, como nação constituída. Moisés profetizou a vinda do Messias, fazendo ciente de que Cristo havia de ser posteridade da mulher (GÊNESIS 3:15), havia de ser profeta, e como ele, libertador; se ele podia determinar com precisão, o tempo em que deveria nascer Jesus, e que seria quando o reinado não estivesse nas mãos de Judá, fato que realmente se consumou, quando Jesus nasceu, Jerusalém estava sob o governo de Herodes, um edomita (Mateus 2:1, Bíblia), e a palestina estava sob o governo de César, um pagão (LUCAS 2:1). O patriarca Jacó, em seu leito de morte, antes de Moisés, profetizou o governo real entre os Hebreus (GÊNESIS 49:10). Em análise com relação a essa refutação percebe-se que Reis, demonstra possuir conhecimento da Bíblia e de sua linguagem, também um bom domínio sobre regras de interpretação de textos, como a hermenêutica bíblica. Partindo do ponto de vista ideológico, se torna mais fácil analisar e compreender sua formulação discursiva, pois sua ideologia é cristã e esta baseada na fé histórica. Este é o terceiro texto Bíblico: São estas as palavras que Moisés disse a todo Israel na Banda Daquem do Jordão na planície do deserto, defronte do mar vermelho. Ao refutar essa argumentação contra a autoria do Pentateuco, Reis corretamente afirma que este texto está mal traduzido, não deve ser daquém do Jordão”. Teve o cuidado de levar esse texto a um especialista para que a 80 examinasse a palavra, Be Eber, no hebráico.” A palavra foi examinada pelo filólogo Santos Saraiva que a traduziu por Região Transjordânia”, (REIS,1918, p. 67), que significa Dalém do Jordão, e que também poderia ser traduzida por, na região do Jordão.23 Estando na região chamada Transjordânica não podia chamá-la Aquém- Jordânica. Figueiredo em uma nota a este versículo (DEUTERONÔMIO, 1:1) diz: O hebreu costuma dizer simplesmente: intransito Jordanis; e a voz transito, bem se vê que é relativa a ambas as bandas; e que o lugar em que se considera o Escritor Sagrado é o que deve determinar qual é (FIGUEIREDO, Bíblia). Nota-se, pois, após analisar esse primeiro ponto, Álvaro Reis vai refutando os argumentos do seu contendor que insiste em sua tentativa em provar que o Pentateuco nega a si próprio. Percebe-se que no discurso proferido por Campos, por citações diversas demonstrou certa ignorância em algumas áreas necessárias para uma discussão deste tema, como exemplo pode-se citar o conhecimento bíblico e sua linguagem. A ponto de Reis (1918, p. 68) dizer: Vemos, pois, que o Pentateuco, depois deste tremendo assalto, permanece incólume e que, infelizmente, foi o assaltante que saiu ferido e um tanto envergonhado, por falar de coisas conhecidas a mais de cem anos, como se fossem novas, porque, as ignorava. Desejando atribuir erros a Moisés, quando o Sr. Doutor é que pelas colunas do Diário de Campinas, desastradamente os cometeu. 2. A Filologia comparada prova que o Pentateuco não foi escrito por Moisés. “O Sr. doutor critica Moisés por ser o codificador dos mesmos assuntos várias vezes, na mesma obra”. [...] E assevera ainda que o Deuteronômio está cheio de leis 23 A palavra significa “decaimento”, “aquele que desce”. (Josué 18:18, Deuteronômio 11:30, Ezequiel 47:18). Essas referencias dão ao vale diferentes nomes, como “planincie” e “deserto”. Seu nome moderno é El Ghor. O rio Jordão esta situado em um grande vale. O vale do Jordão é uma grande fissura (brecha que apareceu em face de uma falha geológica). Tem mais de duzentos e sessenta quilômetros. O vale do Jordão varia em largura de três a vinte e quatro quilômetros. Seu curso leva o vale até 86 metros abaixo do nível do mar. 81 casuísticas, utopistas” (REIS, 1918, p. 68) . Refere-se o ilustre antagonista ao Decálogo. Álvaro Reis, continua seu discurso combatendo seu opositor, que persiste em tentar provar que Moisés não foi o autor do Pentateuco, agora se referindo ao decálogo. Reis procura refutar os argumentos de Campos, mostrando que o decálogo completo está registrado no livro de Êxodo capítulo 20, e que o Deuteronômio capítulo 5 é uma repetição resumida do decálogo, bem como da lei como um todo, e isto é facilmente compreensível, porque Deuteronômio é a conclusão do livro do Pentateuco, é uma recapitulação resumida da lei, a Aliança original em Horebe é aqui relembrada, cujo objetivo era mostrar ao povo de Israel que havia duas áreas de obrigação, para com Deus e para com seus semelhantes. O pacto firmado em Horebe é aqui renovado com uma nova geração de israelita, que estavam prestes a entrar na Terra Prometida, pois a geração anterior havia morrido no deserto, com exceção apenas de Calebe e Josué (Deuteronômio) 24. Ao chegar o final da leitura, Deuteronômio fará o povo recordar toda a lei. Quanto ao argumento de Campos, que o Pentateuco é uma compilação 25 do livro das guerras de Jeová, citando na Bíblia no livro de Números 21:14. Pelo que se diz no livro das guerras do Senhor [...]”. Reis faz citação de uma nota de comentário sobre este texto do Padre Antonio Pereira de Figueiredo: No Livro das Guerras do Senhor, Santo Agostinho na sessão 42, sobre números é de parecer que este era um livro, no qual estes mesmos povos tinham escrito a história da nação e, em particular, a guerra de que aqui se trata 26. 24 Deuteronômio 1:35-39 “Certamente, nenhum dos homens desta maligna geração verá a boa terra que jurei dar a vossos pais; Salvo Calebe, filho de Jefoné; ele a verá, e a terra que pisou darei a ele a a seus filhos, porquanto perseverou em seguir ao Senhor. Também contra mim se indignou o Senhor por causa de vós, dizendo: Também tu lá não entrarás. Josué, filho de Num, que esta diante de ti, ele ali entrará; anima-o, porque ele fará que Israel a receba como herança. E vossos meninos de quem disseste: Por presa serão; e vossos filhos, que, hoje, nem sabem distinguir entre o bem e o mal, esses ai entrarão, e a eles darei a terra, e eles a possuirão”. 25 Compilador é o que reúne textos de vários autores, ou de procedência e natureza varia (Dicionário Aurélio ). 26 Esta é a única citação do livro das guerras do Senhor; contudo como o livro dos justos mencionado por Josué (Josué 10:13), e por Samuel (2 Samuel 1:18). Presume-se geralmente que ele seja uma coleção de cânticos populares antigos. 82 Os doutores judeus não reconhecem aqui livro algum em particular. Eles traduzem o Hebreu Sepher, por conto, relação. Por isso se diz: Na relação das guerras do Senhor (FIGUEIREDO27, apud REIS, 1918, p. 70) Em seu discurso, Reis procura mostrar a incoerência de seu opositor, acusando o Pentateuco de ser compilação, e conseqüentemente a Moisés de compilador, pelo fato de ter ele feito uma citação de uma obra, que certamente fazia parte das literaturas judaicas. O que realmente chama a atenção no discurso de Álvaro Reis é a convicção com que rebate os argumentos do opositor, demonstra em tom irônico estar admirado por ele ser um homem público e ocupar um cargo de grande destaque na sociedade, e ter a coragem de através de um jornal muito lido pelo povo como o Diário de Campinas, fazer grave acusação contra a autenticidade da Bíblia, sem argumentação convincente, para sustentar sua tese. Outra questão levantada por Campos, contra a autenticidade do Pentateuco é a dos estilos: Unitaristas que defendem a unidade do Pentateuco e o Fragmentaristas que reconhecem no Pentateuco diversos estilos que chamam de Elohista e Jehovista28, significando diversos autores antes de Moisés. Tratando aqui a questão dos fragmentaristas, que é muito estudada e discutida pela Alta Crítica, desde o século XVIII, quando o Dr. Jean Astruc, médico, em 1753, estudando o Pentateuco fez essa descoberta, que teve continuidade pelos seus sucessores. Os críticos notaram que Deus é designado por dois nomes, Elohim e Jehovah. Como era raro verem-se os dois nomes juntos, concluiu-se que cada um deles indicava um autor diferente; um deles empregaria de preferência e até exclusivamente o nome de Elohim, e o outro, empregaria de preferência e até exclusivamente o nome de Jehovah, como não se sabe o nome desses autores, foi 27 FIGUEIREDO, Pe. Antonio Pereira, Bíblia Traduzida, vol. 1, p. 451. 28 No Pentateuco, Deus é designado por dois nomes Elohim e Jeová. Em nossas Bíblias, geralmente “Elohim” é traduzido por Deus e “Jehovah” é traduzido por Senhor. 83 necessário dar nomes fictícios aos seus escritos. Foi assim que passou a chamar “Eloísta” e “Jehovista”. Parece-nos que em seu discurso polemista de refutação ao argumento do seu opositor, referente a estes dois estilos, Reis em sua pesquisa, se deparou com eruditos críticos tentando separar o Pentateuco, capítulo por capítulo, entrando em conflitos entre si, querendo cada um provar através de construções teóricas desenvolvidas por eles mesmos que sua tese é verdadeira e assim entrando em um emaranhado de confusão, pois, todos eles se diferem em algum ponto, isto porque simplesmente acharam que pelo fato de existirem dois nomes para designar Deus, a autoria não é Mosaica, dizem há outros autores. William J. Guiton diz: [...] tentar separar um do outro, capítulos por capítulo e muitas vezes, versículos por versículo, dois documentos estreitamente unidos um ao outro, foram escritos na mesma época, com o mesmo estilo, e tratando do mesmo assunto, é realmente entregar-se a uma tarefa impossível. Não é, certamente o espírito cientifico que esta a sustentar esse esforço doloroso e estéril, porquanto nenhum texto resistiria a semelhante método de dissecação. Não hesitamos em afirmar que por detrás dessa análise impossível, há a servidão dum preconceito. Quer se negar a sua unidade, apesar de bem evidente, do Pentateuco, quer-se a todo preço contestar a autoria de Moisés, quer se encontrar vários autores, ali, onde há apenas um; acima de tudo, quer se descobrir, no Pentateuco, assim como algures, contradições, conceitos opostos e até, religiões hostis (GUITTON, s/d, p. 22-23). É impressionante notar, como homens eruditos, grandes críticos estão em pleno desacordo quanto à esta questão de estilos, como diferem extraordinariamente em um mesmo capítulo, em um mesmo versículo, a ponto de muito razoavelmente se duvidar da seriedade e da convicção desses sábios, cujo saber e erudição não se pode, contestar. Entretanto, como Guitton disse acima, o que os críticos querem fazer nesta análise é simplesmente impossível, pois cada vez mais se manifestam como especuladores conforme afirma Smith: 84 Tais exemplos, diz Smith, podem ser multiplicados indefinidamente e mostram a licença ilimitada destes teoristas, e, ao mesmo tempo, francamente demonstram a incerteza e a confusão geral manifestas, por toda parte, em suas especulações. (SMITH’S29 apud REIS, 1918, p. 74). Segundo Reis, Campos defende a teoria fragmentarista e seus dois estilos, com as quais fez serias acusações ao Pentateuco, mas não demonstrou conhecimento do hebreu, nem do caldeu, nunca examinou o original hebraico da Bíblia, o que seria o mínimo necessário de conhecimento, para ter argumentação que lhe desse base para a discussão deste assunto difícil e de tão grande importância. Por isso, limitou-se a firmar seus argumentos com a leitura das obras de Lenormant Scharader e Menánt, quando se conhece a grande diversidade de opiniões entre os mestres da alta crítica. É de se imaginar que nem um dos dois polemistas acredita que esse discurso polêmico pudesse chegar tão longe e gastar tanto tempo para pesquisas e debates, a ponto de prender a atenção do povo para eles, principalmente os leitores dos jornais da época onde foram publicados os referidos artigos, e até mesmo em conferências. O que se percebe através da análise de seu discurso é que Reis vem demonstrando que está cada vez mais preparado, mesmo com todas as dificuldades da época para se conseguir e ter acesso às literaturas. Como estudioso da Bíblia, era conhecedor do hebraico bíblico, também conhecia o inglês, espanhol, pois, por algumas vezes foi representante da IPB30 (Igreja Presbiteriana do Brasil) em congressos, na América do Norte, América Latina e até no Japão, em Convenção Mundial das Escolas Dominicais. (FERREIRA, 1992, p. 261) 29 Smith’sBible Dictionary, Vol. III, p. 2426, Verbo Pentateuco 30 IPB – Igreja Presbiteriana do Brasil 85 Álvaro Reis procura e busca com persistência fazer a apologia do Pentateuco, sempre procurando demonstrar que também os fragmentaristas com seus estilos não podem contestar a autenticidade do Pentateuco. Embora reconheça que seus críticos chegaram a interessantes resultados, contudo contraditórios e confusos e sem acordo com os próprios defensores dessa teoria. Em sua argumentação discursiva, Álvaro Reis mostra que o Pentateuco foi escrito no deserto, e podia ser por Josué, sob a direção de Moisés, variando por isso o estilo, sem deixar, entretanto, de ser autêntico. Várias epístolas do apóstolo Paulo foram escritas por seus companheiros sob sua direção, ou ditado por ele; e não deixam de ser autênticos. O fato de muitos escritores bíblicos atribuírem a ele essa obra, chamando-a de “Lei de Moisés”; como por exemplo, se lê em Josué 1:7: “Tão somente sê forte e mui corajoso para teres o cuidado de fazer segundo toda lei que meu servo Moisés te ordenou “, e muitos outros textos por toda Bíblia, são mais que suficientes para comprovar sua autenticidade e autoria. As tradições Bíblicas merecem toda confiança porque são confirmadas pelas ciências, através da arqueologia. Sobre essas tradições o Assiriólogo Vigouroux, mostra que, antes de Moisés, a tradição narrada no Gênesis, já existia em sua totalidade e em seus detalhes, e, até em seu plano. Pondera Reis: [...] O poema coneiforme contem tanto a descrição Elohista dos seis dias da criação, como os traços da redação Jehovista da queda do homem. Não é mais possível, pois, tirar do emprego destes dois diferentes nomes de Deus uma pretendida prova de que Moisés não os pudesse escrever, pois está contestado que as duas narrações existiam na tradição anterior a Moisés (VIGOUROUX31 apud REIS, 1918, p. 81-82). 31 VIGOUROUX, La Bible et les decourvertes modernes, Vol. I, p. 211. 86 Dentro do que se propõe fazer, uma breve análise das questões discursivas, a respeito da negação da autenticidade e autoria do Pentateuco imposta por José de Campos de Novaes e do outro lado, Álvaro Reis com seu discurso de refutação. Análise foi realizada nos moldes da negação e em seguida da refutação. Campos procurou negar a autenticidade do Pentateuco, colocando como argumento de seu discurso as seguintes questões: Que o Pentateuco é obra de muitas mãos, de autores, línguas, e estilos; O Pentateuco é uma Compilação; Há dois estilos no Pentateuco O Elohista e o Jehovista. Por isso não poderia ser de autoria de Moisés, logo não é autêntico. No discurso de Campos, nota que embora se apresentasse com convicção em seus argumentos, em muitos momentos deixou parecer que não estava tão preparado para sustentar suas argumentações, quando lhe eram colocados os argumentos de refutação por Álvaro Reis, principalmente nas áreas referentes ao conhecimento Bíblico e a linguagem original da Bíblia. Na análise do discurso de Reis nota-se a mesma disposição, e convicção na sua formulação discursiva, que foi “determinado por suas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que as palavras são produzidas” (ORLANDI, 2003, p. 42). Álvaro Reis demonstrou não dominar certos assuntos, procurando a ajuda de especialistas: Santos Saraiva, filólogo, (REIS, 1918. p. 66), e Moraes, Lexicógrafo, (REIS, 1918, p. 70) Entretanto, na maior parte de sua refutação, demonstrou domínio, em áreas como conhecimento Bíblico, língua original bíblica, e se saiu um ótimo pesquisador, pois se preocupou em enriquecer sua argumentação embasado em muitos especialistas de áreas estudadas. 87 CONCLUSÃO Para atingir o propósito deste trabalho, desenvolveu-se uma pesquisa sobre o protestantismo no Brasil. Sua inserção e o estabelecimento da Igreja Presbiteriana no País. Verifica-se que a partir de 1810, já havia tolerância religiosa, para os estrangeiros, garantida pelo tratado de navegação firmado com os Ingleses. Depois a Constituição de 1824 estendeu a liberdade para construção de casas para cultos religiosos, porém, sem forma de Igreja. Liberdade que se consolidou com a República. Entretanto, ainda existiu por muito tempo a perseguição, felizmente apenas em pontos isolados em todo país. Foi feito uma breve pesquisa a respeito de Álvaro Reis, como pastor e pregador da Igreja Presbiteriana do Brasil, enfatizando seu pastorado na Igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro, onde ficou por 28 anos, e teve um ministério pastoral muito frutífero. No período de seu ministério pastoral a Igreja cresceu consideravelmente. “No 25ª aniversário de seu pastorado, o rol da Igreja fora elevado de 586 para 2687. No Rio já havia 6 Igrejas organizadas, e 16 congregações”. (FERREIRA, 1992, p. 262) Analisou-se sua vida como pregador da mensagem da Bíblia. E como polemista, foi um dos maiores nomes da sua época, enfrentando opositores contrários à autenticidade da Bíblia com muita convicção, sempre combatendo seus opositores com uma refutação convincente, onde procurou sustentar suas argumentações por meio de documentos da arqueologia. Realizou pesquisas, aprofundou-se mediante as obras de especialistas no ramo da arqueologia. Sendo a própria Bíblia seu principal objeto de prova, valendo-se de seu conhecimento das línguas originais da Bíblia. Analisou-se parte do seu discurso, sobre As Origens Caldaicas da Bíblia, em debate polêmico travado com o advogado, José de Moraes Novaes. Nesta análise 88 constata-se que o discurso de Álvaro Reis, cuja formação discursiva está fundamentada no pressuposto teórico da ideologia cristã. Por meio desta breve análise pôde-se constatar que Álvaro Reis foi um bom e dedicado pesquisador, buscou sempre embasar seus argumentos. Esta foi sem dúvidas uma das qualidades excepcionais que o levou a ocupar um nome de grande destaque não só no meio evangélico, como também era conhecido pelos seus opositores como um homem de grande capacidade de refutação. Concluiu-se que a formação discursiva de Álvaro Reis, demonstrou em suas argumentações ser reconhecidamente um dos maiores polemistas protestantes de seu tempo conforme diz Boanerges Ribeiro: “É claro que houve polemistas protestantes em todas as denominações e em toda a Primeira República. Mas creio que selecionar Álvaro Reis para representá-los faz justiça aos melhores deles”. (RIBEIRO, 1991, p. 276). A polêmica nesse período, era mais que apologia. Muitas obras surgiram dos debates polêmicos. Foram muitos os debates de que travou Álvaro Reis com seus oponentes. Muitos destes debates foram publicados em livros. Em 1892 Álvaro Reis publicou as Conferências do Padre Júlio Maria sobre a Segunda Vinda de Cristo, Refutações. Conferências proferida em oposição ao padre. Em 1901 e 1902 respondera a Carlos Laet, partindo da invocação de santos e adoração de imagens, o livro de Álvaro Reis saiu em 1909, Mimetismo Católico. Os artigos da polêmica com Cândido Mendes de Almeida, apoiado por Carlos de Laet e Cipriano de Abreu; Álvaro respondeu. Em 1917 seus artigos foram reunidos em livro, O Mártir Lê Balleur. Em 1894 publicara suas Cartas a um doutor espírita, em 1916 seus artigos foram reunidos em livro, O espiritismo. 89 Estas são no meu entender as principais obras, frutos de seus debates polêmicos, incluindo seus diversos sermões escritos e publicados em livros, citados nas referências deste trabalho. Depois da experiência desta pesquisa, descobriu-se um vasto campo a ser pesquisado sobre este extraordinário, pastor polimista, Álvaro Reis, pastor. Seus 36 anos de ministério pastoral, muito influenciou e contribuiu para a Igreja Presbiteriana. Foi muito desafiador, chegar ao término deste trabalho; abriu um vasto campo de pesquisa. Pois, um homem como Álvaro Reis, de tantos feitos, pela Instituição e pelo país, precisa ser melhor estudado e conhecido, no meio acadêmico. 90 REFERÊNCIAS AGUIAR, Crimilde Leite de, artigo publicado em O Puritano, 11/06/1925, p. 6. ALMEIDA, Abraão de. Lições da História. São Paulo: Editora Vida, 1993. ARAÚJO, Antonio Máspoli Gomes de. Religião Educação e Progresso. São Paulo: Editora Mackenzie, 2000. BASTIDE, Roger. Elementos de Sociologia Religiosa. São Paulo: Instituto Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião. Núcleo São Bernardo do Campo,1990. ________. Brasil Terra de Contraste. 2ª ed. São Paulo: Divisão Européia do Livro, 1973. CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos Séculos. 2ª ed. São Paulo: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1988. CALMON, Pedro. História do Brasil, Vol. I - VII. 2ª ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olimpio Editora, 1963. CEZAR, Elben M. Lenz.História da Evangelização no Brasil: (Dos Jesuítas aos Neo- Pentecostais. Viçosa-MG: Ultimato, 2000. p. 69. CONCEIÇÃO, José Manoel da. Sentença de Excomunhão e Sua Resposta. Rio de Janeiro: Tipografia Perseverança, 1867. CHOMSKY, Noam. Reflexões Sobre a Linguagem. São Paulo: Cultrix,1980. DIÁRIO DE CAMPINAS, 1982, p. 210. ESTANDARTE, Jornal, 24/03/1894. 91 ________. Jornal, 10/08/1895. FARIA, Eduardo Galasso. Fé e Compromisso. São Paulo: Associação de Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE), 2002. FERREIRA, Julio de Andrade. História da Igreja Presbiteriana do Brasil. vol.II. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1960. ________. História da Igreja Presbiteriana do Brasil. 2ª ed. Vol. I,II, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1992. FIORIM, José Luiz. Elementos de Análise do Discurso.São Paulo:Contexto, 1977. HAHN, Carl Joseph. História do Culto Protestante no Brasil. São Paulo: Associação de Seminários Teológicos Evangélicos, 1989. HACH, Osvaldo Henrique. Protestantismo e educação Brasileira. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2000. INDURSKY, F. A Fala dos Quartéis e Outras Vozes. Campinas, Editora da Unicamp, 1997. ________. E Ferreira, Maria Cristina Leandro, (Organizadores) Os Múltiplos Territórios da Análise do Discurso, Porto Alegre, Editora Sagra Luzzatto, 1ed., 1999. KIDDER, D. P.Fletcher. O Brasil e os Brasileiros. 1ª e 2ª vol. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941. KEILY, Duncan A. História Documental do Protestantismo no Brasil. São Paulo: Associação de Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE),1984. LEONARD, Émile G. O Protestantismo Brasileiro. São Paulo: Associação de Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE), 1952. 92 ________. O Protestantismo Brasileiro. São Paulo: Associação de Seminários Teológicos Evangélicos (ASTE),1963. ________. O Iluminismo num Protestantismo de Constituição Recente. São Paulo: Programa Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, 1988. LERY, Jean de. Viagem à Terra do Brasil. Rio de Janeiro: Editora Biblioteca do Exercito, 1961. MENDONÇA, Antonio Gouveia. O Celeste Porvir. São Paulo: Edições Paulinas, 1984. MENDONÇA, Antonio Gouveia; VELASQUES Filho, Prócoro. Introdução ao Protestantismo no Brasil. 2ª Ed. São Paulo. Edições Loyola, 2002. OLIVEIRA, Júlio, artigo em jornal O Puritano, 25/06/1925, p. 3. O PURITANO, 27/08/1908. ________. 02/08/1917. ________. Número 1144, 16/02/1922, p. 1. ________. Número 1301, 11/06/1925, p. 2. ORLANDII, Eni Puccinelli. Entremeio e Discurso. Interpretação. Petrópolis: Vozes, 1996. ________.Análise de Discurso. 5ª Ed. São Paulo:Pontes Editores, 2003. PEIXOTO, Betuel E., artigo publicado em O Puritano, 02/06/1925, p. 3. POLYANTHÉA, 1925, Arquivo Presbiteriano 93 POMBO, Rocha. História do Brasil. 7ª ed. Vol III. São Paulo: Edições Melhoramentos 1956. REILY, Duncan A., História Documental do Protestantismo no Brasil. São Paulo. Aste, 1984. REIS, Álvaro. Origens Caldaicas da Bíblia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Redação do Puritano, 1918. ________, Álvaro. O Espiritismo. 2ª ed. Rio de Janeiro: Redação do “Puritano”, 1916. ________, Álvaro. O Calix Eucarístico. Rio de Janeiro: Redação do Puritano, 1913. ________, Álvaro. O Mimetismo Católico. Rio de Janeiro: Oficinas do Puritano, 1909. ________, Álvaro. As Conferências do Padre Julio Maria: Refutações. Rio de Janeiro, Tipografia de G. Morais, 1908. ________. O Clamor das Pedras (Sermão). Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1959 ________, Álvaro. As Sete Palavras da Cruz (Sermão). Rio de Janeiro: Casa do Brasil, 1917. ________, Álvaro. O Tribunal de Cristo (Sermão). Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1959. ________, Álvaro. A Vitória da Fé (Sermão). Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1959. ________, Álvaro. Os Escândalos (Sermão). Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1959. RIO, João do. As Religiões no Rio. Rio de Janeiro: H. Garnier, Livreiro-Editor, 1906. 94 RODRIGUES, José Carlos. Religiões Acatólicas no Brasil (1500-1900), Rio de Janeiro, 1904. RIBEIRO, Boanerges. Protestantismo no Brasil Monárquico. São Paulo: Pioneira, 1973. ________. Protestantismo e Cultura Brasileira. São Paulo. Casa Editora Presbiteriana,1981. ________. A Igreja Presbiteriana do Brasil, Da Autonomia ao Cisma. São Paulo: O Semeador,1987. ________. Igreja Evangélica e República Brasileira (1889-1930), 1ª Ed. São Paulo: O Semeador, 1991. RIBEIRO, Domingos, Artigo publicado no O Puritano, 02/06/1925, p. 3. ________. Artigo publicado no O Puritano, 02/06/1925, p. 5. ________. Artigo publicado no O Puritano, 02/06/1925, p. 5 e 6. RIBEIRO, João. História do Brasil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1920. SCHALRWIJR, Frans Leonard. Igreja e Estado no Brasil Holandês. 2 Ed. Sociedade Religiosa. Edições Vida Nova. 1989, p. 12. SIMONTON, Ashbel Green. Diário, (1852-1867). São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1982, p. 210. SOUTHEY, Robert. História do Brasil. 3ª ed. Vol. I - VI. São Paulo: Editora Obelisco, 1965. SOUZA, Eudoro. História e Mito. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1981. 95 TARSIER, Pedro. História das Perseguições religiosas no Brasil. Vol. II. São Paulo: Cultura Moderna, 1936 Viana, Márcia Serra Ribeiro. Linguagem Como Fato Social Total. Londrina: Edições Humanidades, 2005. VIEIRA, David Gueiros. O Protestantismo, A Maçonaria e a Questão Religiosa no Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1980. 96 ANEXOS ANEXO A Pedro Tarsier faz a mais completa resenha existente das perseguições aos evangélicos no período. De 1889 a 1909, o folheto anônimo Esboço Histórico-Cronológico das perseguições realizadas contra os evangélicos desde a Proclamação da República até a presente data Rio de Janeiro, maio de 1909 alinha resumidamente as perseguições aos evangélicos: 1. N.1810 D' "O País" de 1889 - O vigário anunciou de véspera que o pastor protestante seria atacado. De fato: houve, no dia seguinte, ataque e conflito, sendo inutilizada a mobília da sala de cultos e outros objetos. O pastor fugiu com sua família. Sub-delegado de polícia estava presente e fez a intimação das autoridades que apadrinham esses atos de vandalismo. 2. Em 12 de março de 1890 - Na vila do Conde — Bahia, o rev. Z. Taylor, da Igreja Batista, foi atacado na casa particular, em que anunciava o Evangelho, por uma turba chefiada pelo padre do lugar, sendo o pregador e vários assistentes arremessados no rio adjacente. (Jornal da Bahia de 28 de março). 3. Em Guriry, nas vizinhanças de Campos, o Dr. Bagby foi atacado, em 1890, por um grupo de pessoas chefiadas pelo sr. José Rodrigues. 4. Setembro de 1890 - Em Mar de Espanha — Minas, o padre promoveu uma perseguição ao rev. F.R. de Carvalho, que teve a casa assaltada e foi vaiado diversas vezes. Os assaltantes tentaram arrombar a porta de sua casa. O delegado de polícia Major Agostinho foi o salvaguarda do perseguido, guarnecendo a casa com soldados. 5. Novembro de 1890 - Em Palmeiras, Rio de Janeiro, o rev. A. Cardoso da Fonseca foi assaltado na casa de cultos e na hora do serviço. Atiraram dinamites que felizmente não ofenderam à congregação. Depois do culto, foi ainda cercado quando se retirava para o hotel em que se hospedava. 6. 1891 - Acaba de proceder-se à organização da Igreja de S. Fidelis, Estado do Rio, quando, pelas instigações do Padre Capelão, os srs. Victorino Villela, Agostinho Villela e Gabriel Guido, à testa de uma turba de fanáticos, investiram contra o pequeno rebanho evangélico e seu pastor rev. Salomão Gisnburg. As autoridades coadjuvaram a selvageria. D. Corina Manhães recebeu uma pedrada na cabeça, caindo sem sentidos e o pastor foi levado preso, sendo detido nove dias. 7. Abril de 1892 - Em Sabará, Minas, o vigário cônego Rousin, promoveu um assalto à Conferência Distrital, ali reunida. O rev. J.L. Bruce teve a cama de dormir incendiada. Uma parte da população revoltou-se contra semelhante atentado e montou guarda aos protestantes, sendo o padre abandonado pelos seus próprios correligionários políticos, pois era o chefe de um partido forte do lugar. 8. Maio de 1892 - Em Santa Luzia do Rio das Velhas, Minas, os revds. J.L. Bruce e A.C. da Fonseca, residente então em Sabará, foram quase assassinados. Houve pedradas etc. 9. Nesse mesmo tempo, em Belo Horizonte, os. mesmos foram expulsos de um hotel do lugar, às 10 horas da noite. Recolhidos por um cidadão (Eduardo Edwards) de origem inglesa, residente na localidade, foram obrigados a fugir na manhã seguinte sob ameaça de morte, estando a casa de seu hospedeiro cercada 10. Nesta mesma data foram os revds. J.C. de Andrade e J.R. de Carvalho, residentes respectivamente em S. José dos Campos e Pindamonhangaba, perseguidos em Buquira, onde se achavam em excursão. 11. A Igreja Evangélica, em Paraíba do Norte, durante uma reunião noturna, foi apedrejada. Um dos assaltantes foi preso; mas a autoridade interveiu a seu favor e fê-lo para que continuasse a perseguição (Notícia extraída de "O Parahybano" para o "Estandarte" de 14 de janeiro de 1893). 12. O Sr. F.A. Deslandes, em S. João dei Rey, durante meses, viu-se muitas vezes cercado em sua casa e ameaçado de morte, caso insistisse em realizar o culto a Deus conforme o rito protestante. ("ESTANDARTE" de 4 e 18 de março de 1893). 13. Na cidade do Recife, ia o culto em meio, na Igreja Presbiteriana, quando passou perante ela uma procissão da Igreja do Carmo dos Capuchinhos, que arremessou-se-lhe contra, num ataque feroz, ficando as janelas e telhas quebradas ("GAZETA DO RECIFE" TRANSCRITO PELO "ESTANDARTE" de 28-3-1893). 14. Em abril de 1893 - os revds. J.E. Tavares e C.B. Mc. Farland são expulsos de Cachoeira de Campos, Minas, às 10í/2 horas da noite, sob ameaça de morte, depois de um motim promovido pelo vigário interino Padre Theodolino e no qual tomavam parte as autoridades policiais do lugar. 15. Em 2 de junho de 1893 - um núcleo avultado de desordeiros atacou a Igreja Presbiteriana da Paraíba do Norte. Uma saraivada de pedras penetrou no Templo, não havendo graves desastres a lamentar, (do "Diário da Paraíba" e do "Estandarte" de 3 de junho de 1893). 16. Na Barra do Rio Grande, Estado da Bahia, o rev. Z.C. Taylor, e os srs. Emiliano Novaes e Dionísio de Oliveira quando iam começar o culto, viram-se cercados por mais de mil pessoas capitaneadas pelo padre Júlio Maria Fiorentini. O motim e a sanha fanática chegaram ao auge, que as autoridades todas, intervindo, não puderam contê-los e pediram ao Evangelista, que desistisse dos direitos que a Constituição lhe outorgava, sob pena de por em risco a sua vida. ("Estandarte" de 8 de julho de 1893). 17. Em janeiro de 1894 - no domingo 15, foram barbaramente espancados, em Ubá, Minas, os revds. A.J. Araújo Filho e J.L. Becker, quando voltavam de uma chácara a um quilômetro da cidade, onde tinham ido pregar. Diziam ter sido eles a causa de uma grande chuva de pedras, que assolava a cidade e os campos pelos arredores. 18. Em Campo Grande, próximo à Capital Federal, três crentes evangélicos buscavam realizar uma reunião religiosa, quando surgiu um motim contra eles, sendo obrigados a retirar-se perseguidos até grande distância ("ESTANDARTE" 24-3-1894). 19. Em Cataguazes, quando um ministro metodista com sua esposa saiam de uma reunião evangélica, foram agredidos e espancados barbaramente. ("ESTANDARTE" de 30 de junho de 1894). 20. Na cidade de Campanha, Estado de Minas, realizou-se perante turba multa um soleníssimo auto de fé anunciado previamente, sendo incinerados algumas centenas de volumes das Sagradas Escrituras. ("Estandarte" de 14 de junho de 1894). 21. O sr. Manoel Pereira Lacerda, anunciava o Evangelho, numa casa particular, em Guaraiba, Estado da Paraíba do Norte, quando o próprio delegado de polícia se apresentou acompanhado por umas quinhentas pessoas, intimando-o a calar-se sob pena de morte. ("Estandarte" de 10 de agosto de 1895). 22. Em 21 de outubro de 1896, uns quatrocentos amotinados em Campos, sob o pretexto que os protestantes tinham penetrado na Matriz Católica, deram cerco ao Templo Evangélico e o apedrejaram. 23. Em, dezembro de 1896 realizou-se a perseguição em Belo Horizonte contra o rev. R.C. Dickson e dirigida pelo padre. Foi interrompida a publicação d'' 'A Capital'' acusada de protestantismo pelo mesmo padre. 24. Em fevereiro de 1897, "O País" transcreve telegramas dos revds. A.J. de Araújo Filho e J.E. Tavares sobre perseguições em S. Sebastião de Estrela, Minas. O rev. Araújo teve a casa assaltada e fugiu com sua família para uma fazenda. 25. A 5 de março de 1898 em S. Bento, Pernambuco, o sr. M. Villela, é assassinado barbaramente, em pleno meio dia, em lugar público! o réu foi preso e julgado três vezes, sendo em a última defendido pelo vigário. Saiu absolvido!... 26. A 15 de maio, A.J. Soares e vários crentes foram atacados no largo do Mosteiro de S. Francisco Xavier, pelo Dr. Agostinho Reis e outros. 27. Em Macaé, um grupo capitaneado por Francisco Soares Homem e Braz Rifola, deu um ataque à casa de oração. 28. Em 1898 a Igreja de Macaé sofreu uma terrível perseguição promovida por Frei Ignácio, perseguição que durou duas semanas, sendo gravemente ferido o distinto moço Adalberto Vieira. O Pastor recorreu ao íntegro Presidente do Estado, Sr. Alberto Torres, que mandou força com ordem terminante, afim de ser respeitada a Lei. 29. A 2 de julho de 1898, ataque à casa do rev. Charles Kingston, em Camarão, Estância. 30. Em Bela Vista, município de Niterói, o sr. Francisco do Amaral Camargo, opulento negociante, foi atacado pelo padre. (Vede "Puritano" de 22 de junho de 1899). 31. em Bonito, três mortes e vários feridos. 32. Em Nazareth, perseguição pelo padre Deusdedit. 33. Na Glória de Goyatá, em 21 de junho, perseguição na casa de Joaquim José da Costa. (Vede "Puritano" de 14 de junho de 1900. 34. Duzentas pessoas atacam uma reunião de treze pessoas em Bom Jardim. (Do "Puritano" de 2 de agosto de 1900). 35. Em 1901, em S. Vicente de Paula, o Padre Bulcão, seguido de capangas, obrigou várias famílias evangélicas a transferir suas residências para fora dos limites da sua paróquia. 36. Em abril de 1901, após umas conferências realizadas pelo ex-padre Hippolyto de Campos, em Niterói, três conhecidos clericais enragés, planejaram e levaram a efeito um ataque à Igreja Batista, sita à rua S. Lourenço. A congregação foi espalhada; muitas pessoas feridas, livros e móveis incendiados. O ataque durou horas e as famílias evangélicas viram-se depois sob a pressão da faca e do revólver. A polícia nada viu e nada fez e... por causa... A Imprensa clamou!... 37. Em Porto Real, Minas, os revds. Lino e Gammon, foram atacados, desacatados e obrigados a sair. ("Puritano" de 30 de maio de 1901, 11 de junho de 1901 e 22 de agosto de 1901). 38. No dia 25 ou 26 de agosto de 1901, um grupo de mais de 25 pessoas, à meia noite, assaltou a casa de um dos irmãos, amarrou-o á uma árvore e espancou-o horrivelmente. O caso deu-se em Ilhetas, onde, no dia 15, foi organizada uma Igreja Batista, (Pernambuco). 39. Em Caruaru, Pernambuco, setembro 20 e 26 de 1901, um grupo de homens espancou terrivelmente a José Mariz, que levou muitas cacetadas e foi alvo de um tiro, que não o alcançou quebraram candieiros etc. 40. Em 1901, rev. José Orton foi perseguido no Arrozal de Baixo, Estado do Rio de Janeiro. Escapou de ser assassinado por um grupo de malfeitores mandados pelo coronel Ribeiro. 41. Em Tiradentes (que ironia) Minas, o rev. Baldomero Garcia, com a devida licença, ia fazer uma conferência na Câmara Municipal. Um frade filipino, ali residente, porém, se opôs, açulando o povo contra o hereje, expulsando-o do arraial. (“Puritano”, de 10 de outubro de 1901). 42. Em Caruaru, Pernambuco, a 5 de novembro, quando o sr. José Antônio dos Santos ia com sua esposa e cinco filhos dirigir uma reunião na cidade de Camarão, no meio da estrada em pleno meio dia, foi assaltado por quatro capangas conhecidos, de conhecidos mandantes, e foi morto a facadas, e a esposa, por que gritou, foi espancada. Cena terrível... Houve júri. Os sicários eram conhecidos e os mandantes também. Um deles, o padre, foi ocupar a cadeira da defesa e os sicários foram absolvidos... (da "Província" n? 251). 43. Em Paty, Estado do Rio de Janeiro, faleceu uma senhora adepta da religião evangélica; o padre Leonardo não consentiu que fosse enterrada no cemitério e as autoridades não pugnaram pela justiça. ("Puritano", 5 de dezembro de 1901). 44. Na vila de Souza, Estado da Paraíba, um pregador pretendia fazer uma conferência, quando um núcleo de desordeiros, patrocinados pela autoridade, agrediu-o a pedradas, obrigando-o a retirar-se. ("Puritano", 12 de dezembro de 1901). 45. Havia muito tempo no Alto Jequitibá, Estado de Minas, que o Padre Lucas planejava a expulsão do evangelista Mathathias Gomes dos Santos. Estavam a se concluir as obras de Matriz Católica, ocasião excelente para ajuntar o povo para a expulsão do incômodo protestante. As autoridades, porém, avisadas, preveniram o desastre. À entrada da Villa, postaram guardas policiais, que dissolveram os convidados, ao passo que iam chegando, frustrando assim, o plano habilmente arquitetado, (do "Manhuassú" de 15 de abril de 1902). 46. Perseguição em S. João Marcos, no distrito de S. Sebastião do Arrozal em 30 de novembro de 1902. "Indo o rev. Orton em minha companhia, pregar ali o Evangelho, o povo que já nos esperava, capitaneado até por autoridades, reuniu-se em número de 200 pessoas armadas de cacete, e a maior parte delas embriagadas. Ao apearmo-nos em frente à casa de negócio do Sr. Leão, investiram sobre nós e teríamos sido vítimas, se não fosse ter o mesmo sr. Leão rapidamente nos introduzido dentro da casa e fechado a porta. Comunicado o fato ao governo do sr. Quintino Bocaiúva, mandou abrir inquérito sem resultado". (De uma correspondência do pastor rev. J.M.G. dos Santos). 47. Em S. João Marcos, o Pastor João M.G. dos Santos e sua esposa sofreram uma perseguição, sendo intimado pelo povo, dirigido pelo vigário e o delegado de polícia, a retirarem-se da localidade às 9 horas da noite. 48. A filhinha do alferes João Lopes de Carvalho, havia falecido em Santa Margarida, Estado do Rio de Janeiro. O padre Arnaldo Marques entendeu que o cemitério era sua propriedade e não consentiu que a criança fosse enterrada ali. As autoridades prudentes ficaram quietas. (“Puritano”, 25 de dezembro de 1902). 49. Em Canhotinho, Estado de Pernambuco, sabia-se que devia passar no trem expresso em direção a Garanhus, o rev. Lino da Costa, ex-sacerdote romano. Mais de trezentas pessoas, grande parte senhoras, foram à estação para persegui-lo! O rev. Lino prevenido pelo telégrafo, não embarcara. Mas vinha outro ministro, o rev. W. Porter. Invadiram o trem entre assobios e gritarias. Se não foram os companheiros de viagem, não se sabe o que seria do rev. Porter. As autoridades assistiram a tudo indiferentes! 50. Estavam poucas pessoas orando numa casa particular em Murityba, Bahia, quando, após uma agressão de desordeiros, um destes lançou uma bomba de dinamite na sala, que explodiu com estampido horrendo, ferindo gravemente a dois assistentes. 51. Na cidade do Recife, em frente à Igreja do Carmo, dos frades Capuchinhos, após um discurso eloqüente de frei Celestino Pedavoli, realizou-se perante a multidão, um soleníssimo auto de fé, sendo queimados 200 volumes das Sagradas Escrituras e muitos folhetos evangélicos. Este fato memorável deu-se em 12 de março de 1902. 52. Umas trinta pessoas capitaneadas pelo chefe político, deram cerco à casa de um protestante em Águas Belas, Pernambuco. E depois de dispararem tiros o intimaram a abrir a casa, ao que não obedeceu. A polícia também não apareceu. ("Puritano", de 25 de março de 1903). 53. Em Maceió, estavam os evangélicos reunidos em oração a 26 de março de 1903. Desordeiros cercaram a casa e apedrejaram-na. Uma pedra atingiu uma senhora que ficou com um olho vasado. ("Puritano", de 9 de julho de 1903). 54. Em Divino do Carangola, mora um negociante membro da Igreja Evangélica e, assaz estimado do povo do lugar. O Padre, porém, não gostava dele. Reuniu amigos para deportá-lo. O povo influente do lugar opôs resistência enérgica. E com tristeza do padre ficou o protestante. ("Puritano", 3 de setembro de 1903). 55. O Padre Rocha, em Bonfim, Bahia, de acordo com o capitão Terêncio Dourado resolveram esbulhar os protestantes daquele lugar. Em 2 de setembro de 1903, à frente da força policial atacaram a casa de oração. Quebraram vidros, e janelas; invadiram o recinto, deram tiros. Meteram todos em fuga. ("Puritano", de 24 de setembro de 1903). 56. Novo auto de fé praticou o frade, já célebre, Celestino Pedavoli, na cidade do Recife, por ocasião de uma procissão. ("O Paiz", de 23 de setembro de 1903). 57. No Caju, Capital Federal, a 20 de janeiro de 1904, foi atacada a tiros, por mais de 50 pessoas, a casa de oração. A polícia nada apurou. 58. O rev. Kennedy, em companhia de um menino em uma reunião, no Bangú, foi atacado e ferido em 7 de fevereiro de 1904. 59. Em fevereiro de 1904 o pastor Florentino da Silva, estando de serviço em Cesário Alvim, foi acometido por mais de oitocentas pessoas. Foram esbordoados vários crentes, entre outros, o octogenário Joaquim Mendonça. Os evangélicos tiveram de retirar-se com prejuizos avultados. O delegado e vários negociantes foram os mandantes. 60. Em 1904, dois frades capuchinhos, estrangeiros, alojados no convento da Penha no Recife, estabeleceram-se na cidade de Penedo, Alagoas, e desde logo começaram a insuflar o fanatismo religioso e feroz contra os protestantes, maçons etc. No dia 31, fizeram pública queima de Bíblias e, dias depois, os mesmos frades, regressando de Piassabussú, acompanhados de umas 400 pessoas, destruíram por completo a casa de cultos da Igreja Batista, emporcalharam de excremento a casa do pastor Antônio Marques, vaiaram diversos maçons conceituados, forçaram o pastor batista e outras pessoas a fugir do lugar, e ameaçaram de empastelar a "Luz"jornal maçônico, e destruir o templo maçônico da Loja "Luz de S. Francisco". Os vândalos, ao entrarem na cidade, davam vivas ao Senador Euclides Malta e a Nossa Senhora do Rosário. (Jornal de Debates, de Maceió, dessa data). 61. Em 20 de junho do mesmo ano, no lugar denominado Cortez, Pernambuco, o padre Jerônimo da Assunção, acompanhado do delegado e subdelegado do lugar, e de uma porção de capangas, entrou de chapéu na cabeça, na casa de culto batista, onde pregava o pastor Francisco Sandes, e o intimou a que saisse, bem como os demais crentes, dizendo que não permitia cultos protestantes em sua freguesia; os capangas do padre fecharam as portas da casa, e o próprio padre empurrava os crentes mais retardatários. Esse mesmo padre tinha preparado uma emboscada na qual cairiam todos os crentes, mas providencialmente falhou. Trinta e nove cavaleiros, senhores de engenhos, doutores e chefes políticos de Amaragy, tendo à frente o dito padre, armados até os dentes, esperavam os crentes em certo lugar, para matá-los. Foram cometidas diversas violências contra os crentes, entre os quais havia inofensivas viúvas. Os cultos só puderam ser restabelecidos depois que o Governo do Recife mandou para Cortez uma zelosa autoridade militar com a competente força. ("Jornal do Recife", de 10 de julho de 1904). 62. Em 20 de setembro do mesmo ano, 1904, o pastor batista, Antônio Marques, celebrava culto na casa particular do senhor Primo Feliciano da Fonseca, em Bom Jardim, Pernambuco, Soube ele, então, que a plena luz do sol, sob a direção do padre do lugar, e com assentimento, senão co-participação das autoridades, se tramava um rude e bárbaro assalto à casa. Efetivamente começaram a rodeá-la grupos de indivíduos armados e mal encarados. Como às janelas se colocassem alguns moços destemidos para impedirem o assalto, os assaltantes retiraram-se, prometendo voltar em número maior. Ao fim desse dia, avistou-se, ainda longe, um grande grupo, armado de bacamartes e com marcha forçada em direção à casa do sr. Primo Feliciano da Fonseca, onde se celebrava o culto. Imediatamente as pessoas que se achavam dentro apagaram as luzes, trancaram bem as portas e fugiram para o mato pelos fundos da casa. Aconteceu que pouco depois, veio, pelo caminho do grupo dos assaltantes um outro grupo, camaradas seus, os quais, em altas vozes, gritaram aos do primeiro grupo; estes, de embriagados que estavam, não reconheceram os seus colegas de vandalismo, e pensando que fossem os crentes evangélicos que lhes viessem atacar, dispararam-lhes uma carga cerrada com os seus bacamartes, matando três e ferindo muitos outros. Por essa causa os crentes evangélicos, com especialidade o pastor Antônio Marques, foram injustamente envolvidos num processo do qual felizmente sairam livres, passados alguns meses, por terem sido reconhecidos sem culpa. ("Jornal do Recife" e "O Oriente" desse tempo). 63. Os frades Gaudioso e Angélico foram bem sucedidos em sua missão realizada em Penedo, em fins de fevereiro de 1904. Pois conseguiram tornar o sr. Euclides Malta e as autondades policiais cúmplices na destruição e incêndio do Templo Protestante. ("Puritano", de 9 de março de 1904). 64. Faleceu em Cabo Verde, Minas, o protestante Mário Domingo. O padre proibiu o enterro no cemitério e as autoridades concordaram. ("Puritano", de 6 de abril de 1904). 65. O delegado de polícia de Jacareí, S. Paulo, julgou que devia impedir a propaganda evangélica. Postou à porta da sala de cultos uns soldados de polícia de armas embaladas, a fim de impedirem o ingresso a quem quer que fosse. (Puritano, de 21 de abril de 1904). 66. Faleceu em Cabo Verde, Minas, o protestante Mário Domingo. O padre proibiu o enterro no cemitério e as autoridades concordaram. ("Puritano", de 6 de abril de 1904). 67. Em janeiro de 1905, o evangelista Manoel Nunes Saraiva, foi assaltado por um grupo de fanáticos, chefiados pelo delegado. Prenderam-•o e fizeram-no montar num cavalo magro, levando-o entre vozerias e impropérios para a estação. 68. O rev. Manoel Alves de Brito atravessava as matas do Oeste de Minas, quando o padre da Vila do Rio Pardo enviou cerca de duzentos emissários que cercaram o ministro, ameaçando matá-lo. Tiraram-lhe os livros e roupas, que queimaram, poupando-lhe, por muito favor, a vida. ("Puritano", de 23 de março de 1905). 69. Em Porto Real, estado de Minas, os revs. Drs. Samuel Gammon e Lino da Costa, no momento que iam dar começo à reunião evangélica, viram-se cercados por uma enorme multidão armada, que os obrigou a sair a pé do arraial, acompanhando-os umas léguas, em meio de gritos, alaridos e ameaças. ("Puritano", 30 de maio e 11 de julho de 1905). 70. Um velho colportor, andava pelas ruas da cidade de Maceió oferecendo e vendendo exemplares da "Palavra de Deus". O padre não concordou com isso e açulou um núcleo de capangas que esbordoaram e expulsaram o pobre velho. ("Revista das Missões Nacionais", de 28 de dezembro de 1905). 71. Em Bela Vista, município de Tatui, no sul de S.Paulo, o sr. Francisco do Amaral Camargo, opulento negociante, iníciou a propaganda evangélica em sua casa. O padre levanta uma onda enorme e vai atacar a casa. Após longa arruaça, pela intervenção de amigos, o padre acalmou-se e retirou-se com os fiéis companheiros. 72. Na cidade de São Paulo, o rev. B. W. Ranken em 8 de outubro foi perseguido a pedradas pela Legião de São Pedro, que tirou-lhe os livros, queimando-os. O comissário, que sobreveio longe de garanti-lo, prendeu-o ("Puritano", de 11 de outubro de 1906). 73. Em Bom Jardim, Estado do Rio, um número avultado de pessoas atacaram, dias seguidos, o Templo. Tiraram livros, queimaram e deram dez tiros, a ninguém atingindo. ("Puritano", de 12 de janeiro de 1907). 74. Em fevereiro de 1908, o sr. Luiz Ovidio Firmo e seu sobrinho, foram dês- humanamente espancados no lugar chamado Frade-Alto, em Macabú, Estado do Rio, ficando estendidos na estrada como mortos. Os mandantes eram as autoridades policiais. (D' "A Lyra" de Macaé dessa data). 75. Nesse mesmo ano, em Timbaúba, Pernambuco, a célebre Liga Anti- protestante levou a efeito o incêndio do templo Batista. 76. Em setembro de 1908, o padre Miranda e uns professores do Colégio Anchieta, tentaram abafar o protestantismo em Nova Friburgo. A enérgica intervenção da polícia do Dr. Veríssimo fez obstar o tentamento. 77. Em dezembro de 1908, o sr. Theóphilo de Souza foi atacado pelos inimigos de sua fé, quando passava o riacho Orobó, Município de Bom Jardim, e foi morto a facadas. 78. Em Pirapetinga, município d'Além Paraíba, o vigário, homem de reputação duvidosa, conseguiu excitar o ânimo de pessoas irresponsáveis com o concurso do subdelegado do lugar, as quais desde o dia 21 de março começaram a hostilizar os evangélicos, perturbando as suas reuniões e tentando destruir a propriedade que a Igreja Metodista ali possui. Cerca de 15 dias estiveram os evangélicos em sobressalto até que, os Excelentíssimos senhores Presidente e Chefe de Polícia do Estado de Minas, cientificados da ineficácia das providências tomadas pelas autoridades locais, ordenaram a ida para o local, de um Delegado militar em comissão, para garantir a liberdade e propriedade dos evangélicos. 79. E, no princípio do mês de maio de 1909, o pastor evangélico, rev. Leonidas Silva, e outras pessoas, foram desacatadas quando realizavam uma conferência, em Cabo Frio, sem que as autoridades que estavam a pouca distância do local, o mais central da vetusta cidade fluminense, ao menos tomasse conhecimento do fato, ("Exp. Cristão" de 13 de maio de 1909). Além das perseguições acima enumeradas, ainda tem-se a registrar entre muitas outras que não tiveram publicidade, as seguintes contra os colportores, (empregados da Sociedade Bíblica B. e Estrangeira, na disseminação das Escrituras Sagradas): Em 1897, em Itú, Escrituras seqüestradas e queimadas. Em 1897, em Paraíba do Norte, um colportor gravemente ferido. Em 1908, em Itajaí, Escrituras seqüestradas e queimadas pelo padre Geraldo." ANEXO B Julinho Oliveira diz: (O Puritano, 1925, nº 1303, p. 3). Ao meu idolatrado avô: Deixaste-me! Tu, que te empenhavas tanto para que eu tivesse um futuro brilhante! Tu, que te sacrificavas tanto para que eu trilhasse o cominho do bem e da verdade! Tu, que te esforçavas tanto para que eu recebesse uma educação condigna e aprimorada!... Mereces bem que eu assim procedas! Nunca julgará eu que ias tão depressa partir para junto d’Aquele a quem tanto louvavas, bendizias, e glorificavas! Nuca imaginara eu que tão cedo fosses ao encontro d’Aquele, cujo evangelho bendito, tão bem ministrastes aqui na terra! Nunca pensará eu que no apogeu de sua glória aqui no mundo nos deixasses imersos de dor de profunda saudade!... Meu avô querido! A morte que tiveste, bem a mereceste!... Morreste como um justo e como um santo, no campo da luta em que tantas e tantas vezes batalhaste e venceste em prol da causa Santa do Divino Mestre. Sabe-se junto de Deus e imagina-se quão grandioso e esplendoroso foi o festim com que te receberam nos eternais! E nós! Continua a amargura sobre a terra e esforça-se para cantar uma entrada gloriosa no céu como foi a tua. E eu? Pedirei a Cristo o seu consolo e sei que ele não nos negará. Deixaste sob meus cuidados a minha querida avó a quem tanto amo e venero, dizendo-me: “Julio, prepara-te para seres o amparo de tua avó, porque de uma para outra hora eu posso morrer!” E a sua profecia se cumpriu, infelizmente para todos, dolorosamente para todos aqueles que, sabendo-te estimar sinceramente como ministro do Santo evangelho de Cristo, sabiam também venerar-te e admirar-te como exemplar chefe da família. Obedecerei cega e indiscutivelmente o teu ultimo pedido! Nunca cessarei de prantear a tua perda, mas também nunca deixarei de me alegrar sabendo-te ao lado de Deus e seus Anjos, recebendo como bem mereceste a coroa de glória que tão honrosamente ganhaste. Aceita o tributo da infinita saudade do. Julinho ANEXO C Crimilde Leite de Aguiar, superintendente da Escola Bíblica Dominical da igreja do Rio, Diz: (O Puritano, 1925, nº 1303) Foi na quarta-feira, três do corrente, quatro horas antes do seu falecimento, que o Rev. Álvaro fez sua última preleção, uma aula à classe bíblica da Escola Dominical. Na oração da abertura o Rev. Álvaro agradeceu a Deus o estabelecimento da Escola Dominical, pedindo-lhe que despertasse em todos os alunos presentes e ausentes o desejo de usufruírem os privilégios que as classes bíblicas oferecem aos professores da E.D. Pediu depois pelos enfermos e mencionou os nomes da senhora do Rev. Santos, do sr. Benjamim, pai de um aluno presente; de uma filhinha do sr. Breno e de uma outra do sr. Dias. Começou a lição com essa pergunta: “os gentios sempre estiveram na Igreja?” discorreu longamente sobre este ponto. A Igreja, disse ele, sempre foi para os judeus e os gentios. Até Abraão não houve distinção. A instituição da circuncisão veio distinguir o povo de Deus. Abraão circuncidou os escravos gentios. Raabe, a gentia que usou de misericórdia com os mensageiros de Jesus, escondendo-os e Ruth, a moabita entraram na genealogia de Cristo. Chama, atenção dos os alunos para o evangelho de Lucas que da o genealogia de Cristo até Adão e para o de S. Mateus que dá de Abraão até Cristo. A igreja, portanto, disse o nosso saudoso pastor, é católica universal. Que belíssima e inspirada preleção foi este começo de sua aula. Passando à 2a parte o Rev. Álvaro diz, em resumo, que o estado de Cornélio, o cemitério, era semelhante ao de Abraão antes de ser chamado e que suas obras eram espontâneas por amor ao bem do próximo e não egoístas para comprar a salvação? Discorre sobre os centuriões no novo testamento e chama atenção dos alunos para a necessidade que todos tinham de Cristo. Em São Mateus há a historia de dois centuriões. Um disse à Jesus: “Senhor não sou digno de que entres em minha casa?”. Outro disse: “Verdadeiramente este era o filho de Deus?”. Tratando, depois, de Pedro, mostra a classe como os mensageiros divinos vieram simultaneamente a um judeu e a um gentio resultando o encontro de Pedro com Cornélio e a descida do Espírito Santo sobre os gentios fato esse que arrancou de Pedro essas palavras: “Pré ventura pode alguém negar a água, para que não sejam batizados estes, que receberam o Espírito Santo como nós?”. A propósito da visão de Pedro diz ser muito significativa e decida três vezes daquele objeto que o apostolo olhava com tanta atenção de discorre longamente sobre o numero 3 nas escrituras. “Um plano, diz. Precisa ter pelo menos três pontos para ser traçado” “Paulo esteve três dias cego, três dias pregou em damasco, três anos esteve na Arábia. Jonas orou três dias, Cristo esteve três dias no seio da terra. O menino Samuel foi chamado três vezes, três vezes Pedro nega Cristo; três são as testemunhas na terra e três também no céu. Pedro diz: “de nenhum modo Senhor...” mas por três vezes repetiu-se a visão e a voz do céu dizia: “o que Deus purificou tu não chames imundo. “Aqui, diz o Rev. Álvaro, Pedro aprendeu que o que ele queria não era o que queria Deus”. Estava, portanto, quebrado o sectarismo de Pedro, mas desgraçadamente este maldito sectarismo ainda hoje impera entre crentes e enfraquece o espírito de união e fé tão necessários para a evangelização de nossa terra: Terminando, diz o Rev. Álvaro, oremos, Cornélio e Pedro oravam quando o Senhor se manifestou de modo muito especial para alargar os horizontes de um e mostrar o Salvador do mundo a outro. Terminou aqui essa lição belíssima que nunca mais esqueceremos. Depois da aula, o Rev. Álvaro palestrou com os alunos até quase as 22Hs. A propósito de uma pergunta feita sobre o sábado de criação, ele tem essa resposta original: “Ora, Deus cessou de trabalhar no sétimo dia da criação. Nos seis primeiros dias criou todas as cousas. O homem criado no sexto dia, portanto o que é sétimo para Deus é primeiro para o homem. As primícias do tempo da existência do homem na terra foram dadas ao Senhor no sétimo dia santificado pelo Senhor. ANEXO D Relatório da Igreja do Rio de Janeiro – Ano 1912